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As revelações de João Wanderley, um mestre da nossa cardiologia

A Coluna João Alberto terá entrevistas semanais com personalidades de destaque da sociedade pernambucana todas as segundas-feiras

Por João Alberto Publicado em 28/07/2025 às 1:00

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João Fernando Cavalcanti Wanderley ou João Wanderley, como é conhecido, é um dos maiores nomes da cardiologia pernambucana, tendo entre seus pacientes muitos nomes de destaque no estado. Ele se formou pela Faculdade de Medicina da UFPE em 1994. Além de extremamente competente, é conhecido pela cordialidade e o carinho com que atende aos que vão ao seu consultório. Integra a equipe do Instituto do Coração do Hospital Português e atua também na coordenação da clínica médica do Memorial Star. É filho do cardiologista Frederico Wanderley e neto do pediatra Fernando Wanderley, que foi presidente do Náutico. É casado com a anestesista Lúcia Wanderley e tem dois filhos: Fernando e Isabela.

A cardiologia intervencionista tem evoluído muito?

As intervenções via cateter (cateterismo) evoluíram muito desde a sua criação no início do século 20, quando tinham apenas propósitos diagnósticos. No final da década de 70 foi realizada a primeira angioplastia coronária. Desde então houve um avanço fantástico, e, hoje, os procedimentos de desobstrução das coronárias estão cada vez mais rápidos, mais seguros, eficientes e com resultados duradouros, graças à evolução tecnológica dos cateteres, dos stents e do treinamento médico. Além disso, algumas doenças estruturais do coração, sejam elas congênitas ou adquiridas, antes apenas tratadas com cirurgia, atualmente podem ser reparadas com intervenções por cateter.

O que é doença cardiovascular?

É um termo que abrange condições que afetam o coração e os vasos sanguíneos. Está associada, na maior parte dos casos, à doença aterosclerótica, tendo como principais consequências o infarto do miocárdio, o acidente vascular cerebral, a obstrução de artérias periféricas e a insuficiência cardíaca .

Porque optou pela medicina?

A medicina já é uma tradição na nossa família, iniciada com meu avô Fernando. Sempre tive interesse pela ciência médica e imaginava como poderia utilizá-la em benefício das pessoas. Acompanhar meu pai desde pequeno em sua rotina como médico foi muito importante nessa escolha.

Escolha da cardiologia

Atuo como clínico geral e tenho a cardiologia como especialidade. Novamente tive grande influência do meu pai, Fred Wanderley, também cardiologista. Ainda como estudante, estagiei no Instituto do Coração de Pernambuco  sob a chefia de Dr. Carlos Moraes, onde trabalho até hoje, o que certamente consolidou minha escolha.

Quais as principais doenças cardiovasculares?

Angina do peito, infarto agudo do miocárdio, hipertensão arterial sistêmica, acidente vascular cerebral, insuficiência cardíaca, doenças da aorta, arritmias cardíacas, febre reumática, doenças valvares, doenças congênitas e hipertensão arterial pulmonar.

Trabalhou num hospital público e privado. Diferenças?

Trabalhei no Hospital Barão de Lucena. A principal diferença entre o público e o privado é o acesso a recursos para diagnóstico e tratamento, escassos nos estabelecimentos públicos.

Opinião sobre morte assistida?

Acho inaceitável. A definição de morte assistida, também conhecida como suicídio assistido, é aquela em que o paciente recebe assistência médica para acabar com a própria vida, indo de encontro a todos os preceitos médicos, além de ser um ato ilegal e criminoso, no nosso país. Não deve ser confundida com paliação, um tipo de assistência médica que visa melhorar a qualidade de vida de pacientes com doenças graves.

O atendimento rápido no caso de um infarto é importante?

No caso de um infarto do miocárdio, é crucial. Quanto mais rápido for o atendimento médico, maiores serão as chances de uma recuperação sem sequelas.

Quais os sintomas de um infarto?

São dor no peito, geralmente associada à sensação de aperto ou queimação, que pode irradiar para os braços, pescoço, mandíbula e costas. Pode vir acompanhado de intenso mal-estar, náusea e sudorese intensa. Em mulheres, idosos e diabéticos, os sintomas podem ser menos específicos, como mal-estar gástrico ou apenas falta de ar.

Chama-se infarto ou enfarto?

As duas formas estão corretas segundo a língua portuguesa, porém "infarto" é o termo utilizado na prática médica. Alguns infartos podem se apresentar com queimação no peito e eructações (arrotos), de maneira similar aos quadros de azia causados por refluxo gastroesofágico. Já infarto fulminante leva à morte quase que imediata, com pouca chance de o paciente receber socorro. Geralmente está associado a arritmias cardíacas graves.

Problemas coronários são hereditários?

Sim, a doença coronariana tem um componente hereditário importante. Os pacientes que têm parentes próximos com doença coronariana precoce estão mais propensos a desenvolvê-la. Mas os fatores adquiridos como tabagismo, diabetes, hipertensão, obesidade, sedentarismo também são fatores de risco para a doença. A atividade física praticada de maneira regular é muito importante, pois auxilia no controle do peso, pressão arterial, glicose, colesterol, reduzindo o risco de infarto, AVC e outras doenças degenerativas.

O que é um marcapasso?

É um pequeno dispositivo eletrônico implantado no tórax para controlar os batimentos cardíacos. Ele é indicado quando o coração está batendo muito devagar ou de forma irregular. O aparelho emite impulsos elétricos que ajudam a manter o ritmo adequado do coração, garantindo que o sangue seja bombeado de forma eficiente para o corpo.

A cardiologia tem tido avanços importantes?

A cardiologia tem avançado de forma significativa nas últimas décadas, com destaque para áreas como a cardiologia intervencionista, cirurgia cardíaca e o transplante cardíaco. Mas, sem dúvida, a maior evolução ocorreu na cardiologia preventiva, com o controle da hipertensão, obesidade e diabetes, além do diagnóstico precoce e tratamento da insuficiência cardíaca. Esses avanços têm causado um grande impacto na saúde da população.

Sheila Wanderley/Divulgação
Ele explica que os exames preventivos devem ser feitos anualmente para adultos considerados saudáveis, mas para pacientes com comorbidades o tempo pode ser menor - Sheila Wanderley/Divulgação

Já existem cirurgias cardíacas com robô?

Existem há mais de 15 anos cirurgias cardiovasculares realizadas com o auxílio de robôs, que permitem incisões menores e maior precisão. No entanto, essa técnica ainda não se popularizou devido ao alto custo, à complexidade logística e à ausência de benefícios comprovadamente superiores em larga escala.

Quem adoece mais: homens ou mulheres?

Estatisticamente, os homens adoecem mais e mais cedo por doenças cardíacas. No entanto, após a menopausa, o risco nas mulheres aumenta e se aproxima do observado nos homens.

É importante a participação em congressos médicos?

Participar de congressos é fundamental para o médico se manter atualizado com as novas evidências científicas, avanços tecnológicos e diretrizes clínicas. Além disso, é uma oportunidade única de troca de experiências pessoais com colegas especialistas, que não se adquire nos livros e nas revistas médicas.

A fé ajuda na cura?

Eu diria que sim. O conceito de fé é amplo, e de fato um estado mental positivo propicia uma série de reações imunológicas e humorais que podem favorecer o processo de cura.

Como é o pós-operatório de uma cirurgia cardíaca?

Requer, nos primeiros dois dias, internação em unidade de terapia intensiva (UTI) e, em seguida, em torno de quatro dias em leito de enfermaria. Durante esse período, os principais cuidados envolvem controle da dor, prevenção de arritmias, prevenção de trombose e cuidados com a cicatriz operatória. O paciente geralmente retoma a alimentação e a deambulação, que é a capacidade do paciente de andar ou se movimentar de um lugar para outro, seja de forma independente ou com assistência de forma precoce. Após a alta hospitalar, recomenda-se um período de repouso relativo, com retorno gradual às atividades regulares de acordo com a evolução clínica, que é individual.

O estresse pode causar problemas no coração?

Sim. O estresse crônico pode contribuir para o aumento da pressão arterial, alterações nos batimentos cardíacos, inflamação e liberação de hormônios como o cortisol e a adrenalina, que sobrecarregam o sistema cardiovascular. Além disso, situações de estresse agudo com grandes liberações de catecolaminas podem desencadear: infarto agudo do miocárdio, crises hipertensivas, arritmias cardíacas e dilatação aguda do coração, a síndrome do coração partido.

O exame preventivo deve ser feito de quanto em quanto tempo?

A periodicidade dos exames varia conforme idade, histórico familiar e presença de fatores de risco. De forma geral, adultos sem sintomas e com baixo risco cardiovascular devem passar por avaliação anual. Já pacientes com hipertensão, diabetes, colesterol alto ou histórico familiar de doenças cardíacas podem precisar de acompanhamento mais frequente.

Por que a obesidade é um fator perigoso?

A obesidade está diretamente relacionada ao aumento do risco de hipertensão, diabetes, colesterol alto, síndrome metabólica e inflamação crônica — todos fatores que favorecem o desenvolvimento de doenças cardiovasculares. Além disso, nos grandes obesos ocorre a sobrecarga do coração, podendo levar à insuficiência cardíaca a longo prazo.

O que é a experiência com coração de porco?

É uma tentativa experimental de implante em humanos de corações de porco geneticamente modificados. Apesar de representar um avanço científico, ainda enfrenta grandes desafios, como rejeições imunológicas, infecções e baixa sobrevida dos pacientes. Até o momento, não é uma alternativa viável na prática clínica.

RAIO X

  • Time: Náutico.
  • Livro: “The Greatest Show on Earth” ( A Grande História da Evolução), de Richard Dawkins.
  • Filme: Trilogia “O Poderoso Chefão.”
  • Comida: Frutos do mar.
  • Restaurante: “Bargaço”.
  • Cantores: Frank Sinatra e Luiz Gonzaga.
  • Hobby: Futebol, tênis, velejar e viajar.
  • Lugares bonitos: Coroa do Avião, Muro Alto, Fernando de Noronha e Santorini.

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