Crimes ambientais em Pernambuco caem 32% em 2024, mas ainda chegam a dois casos por dia
Relatório aponta 770 ocorrências no estado em 2024, com destaque para maus-tratos a animais, poluição e comércio ilegal de espécies

Pernambuco registrou mais de 770 crimes ambientais em 2024 - uma queda de 32% em relação a 2023, quando foram notificados 1.136 casos. Apesar da redução, os dados revelam uma média de ao menos dois crimes ambientais por dia no estado.
Os dados fazem parte do boletim “Além da Floresta: conflitos socioambientais e deserto de informações”, da Rede de Observatórios da Segurança. O relatório compila registros entre 2023 e 2024 sobre crimes ambientais, conflitos fundiários e violações contra populações e povos tradicionais.
O boletim, além de analisar os dados obtidos via Lei de Acesso à Informação (LAI) junto às Secretarias de Segurança Pública e órgãos correlatos, também apresenta casos identificados em veículos de imprensa tradicionais e independentes, redes sociais e grupos da sociedade civil. Os estados analisados foram Amazonas, Bahia, Ceará, Maranhão, Pará, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro e São Paulo.
Em Pernambuco, foram registrados 1.908 crimes tipificados na Lei dos Crimes Ambientais nos últimos dois anos. Desses, 439 envolvem crimes contra a fauna e a flora, 26 são relacionados à poluição, dois à exploração mineral, e 1.441 classificados como “outros”.
No ano de 2024, as principais ocorrências foram crueldade contra cães e gatos (159), posse e comércio ilegal de animais (51) e poluição (17). Elas aconteceram, principalmente, em residências (581), vias públicas (425) e estabelecimentos comerciais (123).
Cidades com mais casos
Recife lidera o ranking de crimes ambientais em Pernambuco, com 605 registros entre 2023 e 2024. Na sequência, aparecem Jaboatão dos Guararapes (122 casos), Paulista (72) e Olinda (54).
Pernambuco registrou médias abaixo dos outros estados analisados. Em todo o país, os dados oficiais revelam 41.203 crimes ambientais. De acordo com o levantamento, apesar do número elevado, “esses dados ainda são insuficientes para se ter garantia do diagnóstico sobre a realidade socioambiental”.
Para a Rede de Observatórios da Segurança, a falta de padronização dos dados entre as unidades federativas evidencia as dificuldades de mensurar ações de impacto socioambiental.
Além disso, o relatório aponta limitações na Lei nº 9.605, que não compreende conflitos agrários e violações sofridas por comunidades tradicionais como crimes ambientais. Apesar disso, Pernambuco se destaca no cenário nacional, junto a Pará e Piauí, como estados que entregaram a maior quantidade de informações.
A Agência Estadual do Meio Ambiente (CPRH), do Governo do Estado, informou que tem intensificado os investimentos na fiscalização e na contratação de profissionais em Pernambuco e firmado parcerias com a Secretaria de Defesa Social e outros órgãos.
Veja a nota da CPRH na íntegra:
"A Agência Estadual do Meio Ambiente (CPRH) informa que tem intensificado os investimentos e ações de fiscalização em todo o estado de Pernambuco, desde o início da atual gestão – em 2023, com o objetivo de reduzir os crimes ambientais em todas as áreas.
Nesse período, o órgão firmou um acordo de cooperação técnica com a Secretaria de Defesa Social para a transferência de R$ 17,5 milhões da Taxa de Fiscalização Ambiental (TFAPE) para investimentos na Cipoma (PMPE), Depoma (PCPE), e Corpo de Bombeiros. Os valores estão sendo utilizados em ações voltadas ao custeio do aparelhamento e operações de fiscalização ambiental.
A Agência CPRH também aderiu ao Programa Brasil M.A.I.S. – Meio Ambiente Integrado e Seguro, do Governo Federal. O programa é disponibilizado pelo Ministério da Justiça para monitoramento de crimes ambientais. Os servidores monitoram diariamente, com auxilio de imagens de satélite de alta resolução, alertas de desmatamento, incêndios e construções irregulares em Unidades de Conservação.
Além disso, para reforçar o quadro técnico e operacional, a CPRH realizou a contratação de 98 profissionais, por meio de seleção simplificada, para todas as áreas de atuação do órgão. Também foi realizada a renovação da frota de veículo, com a aquisição de 30 carros - 22 caminhonetes com tração 4x4 e 8 sedãs compactos.
O governo de Pernambuco, por meio da Agência Estadual de Meio Ambiente (CPRH), vai continuar investindo e trabalhando para reduzir todos os indicadores de crimes contra o meio ambiente."
Violência contra indígenas e populações tradicionais
O boletim da Rede de Observatórios da Segurança também apresenta dados sobre os crimes contra indígenas nos conflitos socioambientais.
Em Pernambuco, quase 60% desses crimes foram praticados contra mulheres. No ano de 2024, o principal crime cometido contra a população indígena foi o estelionato/fraude, seguido de ameaça, ameaça por violência doméstica, roubo a transeunte e ilícitos penais.
Além disso, estima-se que 1 a cada 4 indígenas foi vitimado no Recife. Ao todo, foram 222 pessoas só em 2024 na capital pernambucana.
Para o coordenador da Comissão Pastoral da Terra - Nordeste 2 (CPT NE2), Geovani Leão, iniciativas como a produção de relatórios são muito importantes para aumentar a visibilidade de casos de crimes e conflitos socioambientais.
Ele explica, ainda, que os dados são subnotificados porque muitas pessoas afetadas pela violência ambiental não têm acesso à internet ou a informações de como denunciar. "É muito difícil e desafiador fazer coletas deste tipo de crime", pontua.
Geovani Leão também ressalta a importância de coletar dados sobre crimes socioambientais cometidos tanto contra comunidades indígenas e quilombolas quando contra os posseiros.
"Essa metodologia de coleta de informações é diferente da metodologia da CPT faz. As informações que a CPT coleta vêm diretamente das comunidades acompanhadas por seus agentes que acompanham de perto as comunidades e movimentos sociais e organizações que estão no campo", esclarece.
Dados nacionais
A Rede de Observatórios da Segurança reuniu dados relacionados a crimes ambientais em nove estados do Brasil, como maus-tratos a animais, desmatamento irregular, poluição de nascentes, entre outros, e crimes e conflitos com um componente socioambiental, incluindo ameaça a quilombolas, danos ao patrimônio de populações tradicionais e omissão de agentes do Estado.
De acordo com o boletim, os números ainda não refletem o impacto de ações legais e oficiais, como abertura de estradas, construção de hidrelétricas, desmatamento para pecuária e agronegócios, além da mineração legalizada.
Também não há padronização e informações sobre violências sofridas por povos tradicionais ou periféricos resultados de crimes ambientais.
“A Rede de Observatórios se posiciona como uma iniciativa estratégica em resposta às ausências das estatísticas oficiais. Não é possível não termos ainda, nessas alturas do campeonato de destruição ambiental no Brasil, estatísticas oficiais rigorosas sobre vitimização das populações tradicionais, como quilombolas, comunidades indígenas, ribeirinhas e outras”, destaca a cientista social Silvia Ramos, coordenadora da Rede de Observatórios.
Integram a Rede de Observatórios da Segurança o grupo de pesquisa ILHARGAS, do Amazonas; a Iniciativa Negra Por Uma Nova Política de Drogas, da Bahia; o Laboratório de Estudos da Violência (LEV), do Ceará; a Rede de Estudos Periféricos (REP), do Maranhão; o Grupo de Pesquisa Mãe Crioula, do Pará; o Gabinete de Assessoria Jurídica às Organizações Populares (Gajop), de Pernambuco; o Núcleo de Pesquisas sobre Crianças, Adolescentes e Jovens (NUPEC), do Piauí; e o Núcleo de Estudos da Violência (NEV/USP), de São Paulo.