Tombado pelo Governo de Pernambuco, patrimônio de Itamaracá enfrenta abandono e degradação
Engenho São João, no litoral norte do estado, conta com um casarão onde um dos abolicionistas redatores da Lei Áurea viveu

Na Ilha de Itamaracá, município do Litoral Norte de Pernambuco, a esperança da população é de que o lugar que já foi um cartão-postal no estado volte a receber atenção do poder público e de empresários locais.
Após 51 anos de funcionamento, a Penitenciária Professor Barreto Campelo, que impactou o turismo na região e a vida da população, foi desativada. Apesar da saída do equipamento, o município ainda tem a Penitenciária Agroindustrial São João, que funciona com o regime semiaberto.
Além das belezas naturais, o município também guarda a história do estado, com equipamentos como o Engenho São João. Lá, em 12 de dezembro de 1835, nasceu o Conselheiro João Alfredo Corrêa de Oliveira, que foi Ministro do Império e um dos redatores da Lei Áurea.
Apesar de ser tombado como patrimônio histórico de Pernambuco desde 1983, o casarão onde o abolicionista viveu seus primeiros dias está em ruínas. Sem uso ou conservação, o equipamento apresenta as marcas do tempo e, mais ainda, do abandono.
O imóvel, que deveria ser preservado pelo Governo de Pernambuco, não pode ser destruído ou descaracterizado por causa do tombamento. Porém, o casarão que um dia teve elementos arquitetônicos marcantes está destelhado, com rachaduras nas paredes, sem janelas e tomado pelo mato.
A placa que daria as boas-vindas aos visitantes está apagada, quebrada e enferrujada. A fachada da casa grande é quase inexistente e o piso original é revelado em alguns pedaços quebrados.





As últimas intervenções realizadas pela gestão estadual foram medidas emergenciais de contenção da degradação do bem: em 2007, a Secretaria de Administração Penitenciária e Ressocialização (Seap) realizou a obra de restauro da coberta da moita e, no ano seguinte, a estabilização das paredes da Casa Grande.
Em 2012, a Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco (Fundarpe) colaborou com a elaboração do projeto para a implantação do Centro de Referência Cultural e Ecológico do Engenho São João, contratado pelo extinto Prodetur, programa do Ministério do Turismo. O projeto ainda não saiu do papel.
Para Ricardo Cabral, 70 anos, advogado e morador de Itamaracá, o engenho representa “a história do Brasil e de Itamaracá, que estava destruída e esquecida”. Por meio de ação civil pública, pediu ao Governo do Estado a reconstrução da casa grande para que o equipamento passasse a ter uso voltado para o turismo.
“Nós estamos resgatando a história do Brasil feita em nosso município e estamos com abertura voluntária do Governo do Estado”, contou o advogado.
Em um dos documentos, Cabral, representando o município da Ilha de Itamaracá, solicita a desativação das três unidades prisionais - a Penitenciária Agro-Industrial São João, a Penitenciária Professor Barreto Campelo e o Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico -, alegando “imensuráveis prejuízos que causavam ao meio ambiente, ao turismo, ao patrimônio histórico e paisagístico e à segurança dos ilhéus e pessoas que frequentam as bucólicas praias da Ilha de Itamaracá”.
Além da Penitenciária Barreto Campelo, o Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico também já foi desativado.
Nós estamos resgatando a história do Brasil feita em nosso municípioRicardo Cabral, advogado e morador de Itamaracá
Guia turístico e nativo de Itamaracá, Júlio Fernando, de 38 anos, destacou que a desativação da penitenciária e as obras de infraestrutura no entorno, como a reconstrução da ponte de acesso à Vila Velha, da PE-001 e da PE-035, já deram bons sinais para o setor. “Estamos todos esperançosos. A especulação já é muito positiva, a gente vê empresários querendo vir pra Itamaracá”, contou.
Para ele, o próximo passo é revitalizar o Engenho São João. “Há um tempo, eu conseguia trazer gente para cá, mas não consigo mais. Muita gente fica receosa de vir por causa da penitenciária e do regime semiaberto”, relatou.
Junto a Ricardo Cabral, o guia turístico também pesquisa a história do abolicionista João Alfredo e luta pela revitalização do equipamento estadual.
O que diz o Governo de Pernambuco
Em nota, o Governo do Estado de Pernambuco esclareceu que tem promovido discussões para viabilizar o uso do prédio e iniciar a restauração com adequações direcionadas para o uso definitivo.
A gestão não apresentou nenhuma proposta para o espaço.
Veja a nota completa:
“Construído no século 17, o Engenho São João fica localizado na Ilha de Itamaracá em uma área de 34 hectares. O local se encontra sob propriedade do Estado de Pernambuco desde 1938. Em 1940 foi inaugurada a Penitenciária Agrícola de Itamaracá (PAI) que passou a utilizar as terras do engenho para as atividades agrícolas com os reeducandos do regime semi-aberto. Em 1983, a Casa Grande foi tombada pelo Governo do Estado através da Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico (Fundarpe) que posteriormente, em 2018, ampliou o polígono do tombamento para todo o engenho. Atualmente sob a gestão da Secretaria de Administração Penitenciária e Ressocialização (Seap), o Engenho São João recebeu ao longo dos últimos anos diversas colaborações da Fundarpe como medidas emergenciais de contenção da degradação do bem. Em 2007 o órgão realizou a obra de restauro da coberta da moita e, no ano seguinte, em 2008, a estabilização das paredes da Casa Grande. Em 2012, a Fundarpe colaborou com a elaboração do projeto para a implantação do Centro de Referência Cultural e Ecológico do Engenho São João, contratado pelo extinto Prodetur.
O Governo do Estado promove discussões para viabilizar o uso do prédio e então iniciar sua restauração com as devidas adequações direcionadas para o uso definitivo.”
Nós estamos resgatando a história do Brasil feita em nosso município
Ricardo Cabral, advogado e morador de Itamaracá