Editorial JC: Expectativa para a Malásia
No centro de conflitos bélicos e negociações tarifárias com outros países, o presidente norte-americano vai se encontrar com o brasileiro na Ásia
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Entre conversas de intermediação entre a Rússia e a Ucrânia, e Israel e o grupo terrorista Hamas, com a participação de líderes da Europa e do Oriente Médio, além de seu próprio palco bélico na América Latina, com a Venezuela, o presidente dos Estados Unidos deve se encontrar com o do Brasil na Malásia, no domingo, durante a cúpula de nações do Sudeste Asiático.
A conversa presencial entre Lula e Trump é cercada de expectativas positivas, depois de um flerte em Nova York, na Conferência da ONU, e de um contato remoto divulgado como produtivo. Mas os temas difíceis a serem tratados podem dificultar a evolução da química na relação pessoal para relações institucionais mais equilibradas e menos suscetíveis aos rompantes verbais de parte a parte.
A taxação dos EUA para a importação de produtos brasileiros seria o principal assunto na pauta das polêmicas entre os dois governantes, em suspense há mais tempo e com repercussões econômicas transformadas em pressões políticas e sociais nos dois países. Lula deve reiterar o pedido de anulação das sobretaxas. Trump deve sinalizar que há espaço para negociação, mas dificilmente irá desfazer o controle imposto pela força econômica.
Se o argumento da situação de Jair Bolsonaro na Justiça brasileira parece superado, dois cenários opostos aparecem no horizonte de possibilidades do imprevisível ocupante da Casa Branca. O primeiro seria a manutenção do silêncio sobre a ligação originária entre Bolsonaro e a taxação, consolidando o espaço para o diálogo sobre a redução ou retirada das tarifas. Mas o segundo, não completamente afastado, seria o retorno do argumento político, constrangendo o brasileiro e fechando a porta das negociações por algum tempo.
Um tema recente, contudo, ganha chance de dominar a agenda do encontro esperado para este domingo. A situação dos venezuelanos diante do cerco das Forças Armadas dos EUA ao governo de Nicolás Maduro tende a ser um assunto preferencial de verbalização por Lula, que não se conteve, há poucos dias, e externou o desejo de uma “doutrina latino-americana” de proteção a incursões de outros países no que se considera problema interno da soberania de cada país do continente.
O recado foi direto e não passou desapercebido por Trump, certamente. Mas a venezuelização da pauta não interessa a nenhum dos dois, embora seja provavelmente grande a tentação, pelo potencial populista de abordagens pró e contra.
Com uma comitiva em sua maioria voltada para o interesse da economia brasileira, Lula promove na Ásia um circuito de acordos comerciais para apresentar o Brasil como parceiro de um mercado em franca expansão, em um local cosmopolita, polo de formação do conhecimento, como a Malásia.
Faz todo sentido uma reunião com o presidente dos Estados Unidos nesse palco das finanças mundiais, a respeito de diferenças tarifárias e balança comercial. Se a simpatia pelo regime venezuelano falar mais alto, cresce a probabilidade de frustração com os resultados que podem vir desse encontro.