EUA desafiam a China
Em nova investida através do tarifaço, Donald Trump reconhece o peso global da economia chinesa e renova o protecionismo norte-americano

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A globalização volta a ser posta em xeque pelo país que mais se beneficiou dela, como fiador e principal vendedor. Os Estados Unidos retomam práticas protecionistas que negam o ideário liberal, ampliando o tarifaço que sacode o comércio global para a maior potência oriental, a China. O embate entre as duas potências mundiais não é desejável para o resto do mundo, mas o erguimento de muros tarifários pode abrir o mercado, nos dois países, para outras nações, como o Brasil. Mas antes que os efeitos se tornem visíveis, as negociações impõem grande expectativa nos mercados e na linha de frente da diplomacia mundial, não apenas chinesa e norte-americana.
O anúncio de Donald Trump de que irá cobrar tarifa extra de 100% aos produtos chineses para importação pelos EUA, claro, pode ser parte da estratégia de negociação. De acordo com o divulgado, a sobretaxa estará valendo a partir de 1º de novembro, podendo entrar em vigor antes, caso os chineses resolvam reagir até lá, sem aguardar. Com algumas semanas de prazo, nada é impossível na já conhecida trajetória da comunicação sinuosa, de idas e vindas, do presidente Trump, que escolheu uma reação dura à decisão chinesa de limitar a venda de elementos relacionados às terras raras, minerais essenciais para tecnologias de ponta, incluindo a fabricação de chips para celulares. Para o presidente dos EUA, a atitude da China é “extremamente agressiva e hostil ao mundo”.
O magnata da Casa Branca confunde propositalmente, em seu discurso, o interesse do planeta com os de seu país – ou de seu governo, pois mesmo entre os norte-americanos suas palavras e ações cada vez formam menos consenso. A China deve retribuir com retaliações, numa escalada de consequências imprevisíveis para o mercado internacional, pela dimensão dos dois países. O escancarado desafio comercial de Washington após o lance restritivo de Pequim fecha a porta do diálogo, ao invés de buscar uma solução resultante da conversa e de concessões mútuas.
A guerra que une chineses e norte-americanos num duelo protecionista não deve prosperar, imagina-se, porque a dependência é alta, sobretudo para a tecnologia de ponta nos Estados Unidos, que utilizam as terras raras da China. E os chineses teriam reveses e atrasos em Inteligência Artificial, por exemplo. Quase nenhum cenário é promissor para os dois países, ou para o mundo, com a corda de embargos esticada. O peso da economia chinesa ganha realce, em especial na área de tecnologia da comunicação. Bem como o peso desestabilizador de um presidente da República impulsivo, que prefere a reação pública imediata à assimilação da informação e seus possíveis desdobramentos.
Até que haja clima para conversa com Xi Jinping, Trump não deve recuar. Nos próximos dias e semanas, a repetição do golpe do tarifaço, desta feita contra os produtos chineses, irá perturbar o mercado financeiro, forjando prejuízos e lucros milionários, quiçá bilionários. Seja qual for a arrumação conquistada, os estragos dificilmente serão contidos.