A guerra das sanções
Em entrevista à Rádio Jornal, Everardo Maciel afirmou que o momento atual é "extremamente delicado, imprevisível, desconhecido" e recomendou cautela

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Em um cenário nebuloso que envolve as indefinições da geopolítica e da economia global no século 21, a aplicabilidade da legislação de um país em outro país aparece como questão muito além da soberania. Por estarem no limbo de uma zona entre fronteiras, numa época marcada pela fragilidade dos organismos multinacionais – como a Organização das Nações Unidas (ONU) e a Organização Mundial do Comércio (OMC) – tais indefinições geram estresse institucional que pode levar a crises diplomáticas de horizontes imprevisíveis.
A polêmica sanção da Lei Magnitsky dos Estados Unidos ao ministro Alexandre de Moraes – e eventualmente a qualquer brasileiro – foi explicada pelo ex-secretário da Receita Federal, Everardo Maciel, em entrevista à Rádio Jornal. A lei se aplica no território norte-americano, e não em solo brasileiro. Mas empresas de qualquer nacionalidade que se relacionarem com indivíduos sancionados pela lei, podem ser igualmente alvos de sanções, de acordo com Maciel.
Criada no governo de Barack Obama, a Magnitsky se dirigia originalmente ao combate a criminosos que afrontassem os direitos humanos. Para o novo governo de Donald Trump, ao trazer sua abrangência para um membro do Supremo Tribunal Federal no Brasil, o suposto cerceamento da liberdade de expressão é motivo bastante para sua aplicação, o que contraria o entendimento de juristas até mesmo nos Estados Unidos.
A situação se torna mais complexa no momento que uma sanção de origem estrangeira ameaça afetar o sistema financeiro no Brasil, a partir de declarações do próprio Alexandre de Moraes e do ministro Flávio Dino, segundo o qual as leis de outros países não possuem efeito automático aqui, e necessitam de validação antes de serem aplicadas. Os bancos em atuação no Brasil não podem aplicar a Magnitsky aqui dentro, mas podem ser alvo de sanções e penalizações nos Estados Unidos se não o fizerem. A instabilidade domina os mercados, em razão da pressão política que passa a compor os alicerces da estabilidade da economia em escala transnacional.
De acordo com a análise de Everardo Maciel, se um banco brasileiro com filiais e operações em dólar nos Estados Unidos, for sancionado pelo governo norte-americano, terá apenas duas opções: cumprir a sanção ou retirar seus negócios do país de Donald Trump. A escolha envolve graves consequências, e a incerteza dominante assusta o que pode vir depois, como efeito-dominó em todo o sistema financeiro. As sanções econômicas, incluindo as tarifas, são uma nova forma de guerra, por outros meios, segundo o ex-secretário da Receita. Por isso, qualificou o momento atual como “extremamente delicado, imprevisível, desconhecido”, em conjuntura que exige “muito profissionalismo, cautela e prudência”.
Ao se apresentar como duelo de narrativas, a guerra econômica impõe o surgimento de atores propensos ao desafio da formação de consensos em um mundo avesso ao diálogo – a não ser que a demonstração de diálogo se mostre estratégica para o alcance de objetivos não declarados, como talvez seja o caso dos encontros de cúpula sobre a Rússia e a Ucrânia, que curiosamente devolvem ao Kremlin uma posição de protagonismo não somente na política, mas na economia mundial.