O que de fato interessa
Problemas na estrutura de hospedagem para o megaevento em Belém devem sair de pauta e dar lugar aos dilemas ambientais que nos ameaçam

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A menos de três meses para o início da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP30), em Belém, a essência do encontro tem se desvalorizado por uma questão de organização: a hospedagem das delegações e dos convidados. Seja por falta de planejamento e articulação, seja pela exploração do mercado através de preços abusivos, um evento dessa magnitude merece a antecipação de pautas mais relacionadas ao seu propósito de mobilizar as gerações presentes para cuidar do futuro da humanidade sobre a Terra, um planeta em transição climática em decorrência da ação humana. Hospedagem à parte, indo ao que interessa: o que sairá da COP brasileira?
Desde a Conferência de Estocolmo, na Suécia, em 1972, a ONU vem buscando integrar o conhecimento existente e transmitir alertas e alternativas para a civilização, a respeito do meio ambiente e suas mudanças locais e globais. Mais de meio século depois, no entanto, o esforço da perspectiva sustentável tem esbarrado na estreiteza de visão dos líderes políticos, e dos cidadãos também, que não pressionaram seus governos na escala necessária para reverter a direção do aumento da temperatura e suas consequências para a vida na Terra. A coleção de frustrações da diplomacia, no campo ambiental, pode ser resumida pela contínua febre do planeta, levando a sintomas como o derretimento das geleiras, as alterações nas correntes marítimas e a intensificação de fenômenos naturais, como furacões, temporais, nevascas e ondas de calor.
Na sexta carta endereçada à comunidade internacional, divulgada esta semana, o embaixador André Corrêa do Lago, presidente da COP30, restaura o foco que deve ser enfatizado. A redução da dependência dos combustíveis fósseis, o combate ao desmatamento e à degradação florestal até 2030, precisam ser prioridades políticas dos países. Mas nada menos que 80% dos membros do Acordo de Paris, que se dispuseram a assinar compromissos, ainda não apresentaram novas metas para reduzir as respectivas emissões nacionais de gases poluentes até 2035. Ou seja, de pouco adianta o discurso em favor da causa ambiental, se as medidas práticas em defesa de um planeta habitável não aparecem.
O atual dilema energético é tratado pelo embaixador com preocupação, quando afirma a necessidade de que sejam efetuadas “a triplicação da capacidade de energia renovável global, a duplicação da taxa média anual global de melhoria da eficiência energética e a transição para afastamento dos combustíveis fósseis nos sistemas de energia, de forma justa, ordenada e equitativa”. Vale dizer que a proposta se depara com problemas inclusive no Brasil, onde novas fronteiras à exploração de petróleo são abertas, valorizadas enquanto conquistas econômicas e de soberania nacional, resgatando o slogan quase secular: “O petróleo é nosso”.
Mais de três décadas após a ECO-92, no Rio de Janeiro, o Brasil volta a sediar importante encontro ambiental, sob grandes expectativas de posicionamentos e definições. Se conseguirmos hospedar o bom senso, a COP30 em Belém pode ser um marco histórico de comprometimento e virada.