Editorial | Notícia

Um povo segue em fuga

Saída maciça para o Brasil e outros países latino-americanos mostra o sofrimento da população acuada e insatisfeita com a ditadura de Nicolás Maduro

Por JC Publicado em 28/06/2025 às 0:00

Há mais de uma década, um povo sul-americano busca abrigo em outros países, fugindo da pobreza, da censura, da falta de direitos e oportunidades. Enquanto a ditadura de Nicolás Maduro não abre mão do poder da força para reprimir a oposição e impedir a volta da democracia, a Venezuela segue expulsando gente para os países vizinhos. Gente que sofre com a saída de sua terra de origem, mas que não aguenta mais viver como vive. A diáspora é tamanha que, no ano passado, o presidente do Chile, Gabriel Boric, apresentou a proposta de que as nações do continente estipulassem uma cota de quantos venezuelanos poderiam receber por ano, temendo a repetição de ondas migratórias sem a preparação dos países. O país já recebeu mais de meio milhão de migrantes venezuelanos.
De acordo com o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), quase 8 milhões de pessoas emigrou da Venezuela na última década, das quais 6,5 milhões escolheram como destino outros lugares da América Latina e o Caribe. Para a Colômbia, foram cerca de 3 milhões, e para o Peru, 1,5 milhão. Pesquisas internas apontaram, no ano passado, que mais 5 milhões estariam dispostas e deixar o país em breve, por causa da permanência da crise e da insistência de um regime que forja resultados eleitorais para não largar o poder – mantendo as péssimas condições de vida para a população.
Dados do IBGE indicam que o número oficial de venezuelanos no Brasil saltou de menos de 3 mil, em 2010, para mais de 270 mil, em 2022. Com isso, tornaram-se o maior número de estrangeiros em solo brasileiro, superando os migrantes de Portugal, que tiveram uma redução, no mesmo período, de 137 mil para 104 mil. Ao todo, cerca de 1 milhão de estrangeiros vive no Brasil, segundo o Censo do IBGE. E dessa população, uma porção acima de um quarto provém da Venezuela, com demandas por trabalho, dignidade e liberdade que não encontram em seu país. Mas entidades internacionais como a Organização Internacional para as Migrações (OIM) estima que no Brasil haja um contingente acima de meio milhão de migrantes venezuelanos.
O negacionismo político das dificuldades do povo na Venezuela une o governo autoritário de Maduro e simpatizantes da esquerda latino-americana, também no Brasil. Como se houvesse razão para minimizar os excessos da arbitrariedade por afinidades políticas e conveniências ideológicas. Tal negacionismo não ajuda aos venezuelanos, com as estatísticas de fuga em massa do país demonstram. Assumir a realidade, cobrar do governo Maduro a responsabilidade que lhe cabe no restauro da democracia e na legitimação dos oponentes, seria o melhor a fazer. Tanto para reduzir o fluxo migratório causado pelo sofrimento dos venezuelanos, quanto para conferir estabilidade política e perspectiva econômica para todo o continente. Se tudo continuar como está, o descontrole da migração pode aumentar, à proporção do desespero na Venezuela.

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