Editorial | Notícia

Entre o medo e o ódio

Devem ser feitos esforços concentrados nos próximos dias para dissuadir os líderes entusiastas da guerra da continuação do uso de armas

Por JC Publicado em 23/06/2025 às 0:00

Uma das mais evidentes contradições do ímpeto belicista é a defesa da paz como consequência da destruição e das mortes efetuadas pela guerra. Assim tem sido nas investidas de Israel contra os palestinos em Gaza, sob a justificativa de extermínio do grupo terrorista Hamas, bem como contra os iranianos. E a entrada dos Estados Unidos como parceiro ativo contra o Irã apenas reforçou ao máximo essa contradição, percebida nos discursos de Benjamin Netanyahu e de Donald Trump, logo após o acionamento da alta tecnologia norte-americana de destruição – as aeronaves que escapam dos radares levando bombas de 14 toneladas – com o objetivo de dar fim ao programa de enriquecimento de urânio do Irã, que levaria à produção de armas nucleares.
Em semblantes de euforia incontida, Netanyahu e Trump falaram ao mundo com exultação, para comunicar o que havia sido feito. O primeiro-ministro israelense deu uma definição que de certa maneira explica o que vem fazendo no cargo. Para ele, o uso da força é a garantia da paz. Os termos e expressões faciais transmitiam as palavras de um líder orgulhoso de sua vitória pessoal, traduzida pela companhia do presidente dos EUA junto aos propósitos de Israel. Por sua vez, Trump repetiu o tom supremacista, exaltando com ufania o poder de fogo de seus armamentos, ameaçando os líderes iranianos – e por tabela, qualquer um que considere inimigo: se não quiserem a paz, o que os aguarda é a tragédia.
O ocupante da Casa Branca vai se tornando um problema cada vez maior para seu país e o mundo. Suas declarações oscilam entre o blefe e o delírio, como quando afirmou que teria o prazo de duas semanas até decidir se atenderia ao chamado de Israel, ou que terminaria o conflito na Ucrânia em poucos dias. Se parecia que a incursão nas instalações nucleares do Irã foi ação pontual – embora caríssima e de consequências graves – Donald Trump não se conteve, e já declarou que a mudança de regime e a deposição dos líderes iranianos não estão fora de cogitação. Tudo que Netanyahu gostaria de ouvir do presidente da maior potência militar do planeta.
Enquanto as partes envolvidas calculam a estratégia de revides retóricos e em atos de guerra ou violência localizada, o mundo espera que a diplomacia global entre em sintonia por um apelo à paz no Oriente Médio. Embora a Organização das Nações Unidas (ONU) não atravesse um período que suscite grandes expectativas, cabe aos embaixadores e especialistas em relações internacionais a missão de dissuadir os senhores da guerra do ódio que retroalimentam. A instabilidade vislumbrada pelo ataque inédito às bases de pesquisa no Irã talvez ainda possa ser contida, não pelo temor de novas ofensivas, mas pela ponderação de que a escalada será um atalho para tempos difíceis, inclusive para israelenses e norte-americanos.
A paz não é gerada pelo medo – o que se gera com medo é mais ódio.

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