Remédio caro e amargo
Elevação da taxa básica de juros pelo Banco Central reflete o temor da volta da inflação, e da ameaça do descontrole fiscal à governabilidade

Com um governo federal que gasta mais do que arrecada e deve deixar uma dívida pública 12% maior para o próximo mandato – de renovação ou mudança no leme do Planalto – os brasileiros experimentam uma conjuntura econômica de descontrole fiscal que ameaça a governabilidade já em 2026 ou 2027, combinado com uma das maiores taxas de juros do mundo. O Banco Central, que regula a Selic, a taxa básica, demonstra preocupação em relação à inflação. Nessa perspectiva, a contenção de gastos privados através dos juros altos não é seguida pelo governo Lula, que segue dando mau exemplo, apesar dos esforços retóricos do ministro Fernando Haddad e da ministra Simone Tebet para convencer o mercado de que a saúde fiscal é prioridade.
Pela sétima vez seguida, o BC elevou a Selic, agora para 15% ao ano, mais que o triplo do que se pratica nos Estados Unidos, por exemplo, e o maior percentual no Brasil desde 2006, ou seja, em quase 20 anos. O nível da taxa de juros indica a prescrição de remédio amargo e caro para a população, cuja necessidade é justificada, via de regra, pelo risco inflacionário. O controle dos juros aparece como alternativa para segurar o consumo, ou seja, os gastos – mesmo que os três poderes da República não pareçam estar nem um pouco interessados em restringir as despesas em nome do equilíbrio das contas públicas. Executivo, Legislativo e Judiciário não limitam seus gastos, e até aumentam o que gastam, como se não precisassem prestar contas a ninguém – e não precisam, pois na prática não pagam a conta pela irresponsabilidade fiscal.
Os juros também podem ser vistos como medida preventiva. Nesse caso, os cenários de incerteza costumam recomendar cautela, e no Brasil nada há de mais certo que a incerteza, quando se combina o horizonte político com a economia. Se as relações do governo Lula com o Congresso estimulam o descontrole, ao invés de rumar para a estabilização, e a campanha eleitoral para o ano que vem está nas telas antes de ser oficializada e chegar às ruas de vez, o Banco Central ainda precisa olhar para a conjuntura global, antes de retirar pontos percentuais da Selic. Diante da bagunça orçamentária e fiscal interna, e das tensões que se acumulam do lado de fora, inclusive a escalada da guerra no Oriente Médio, a preferência foi uma dose a mais do remédio amargo, ao invés de reduzir a dose.
Os juros altíssimos agora podem ser uma estratégia para baixar, até o final do ano, sem que a redução implique em grandes perdas na política preventiva. Até porque o período pré-eleitoral que se avizinha deve vir junto com pressões pela queda nos juros. O remédio é caro para a população, pois reprime o consumo e a geração de empregos, além de fazer do crédito uma opção penosa. O mais amargo é ver as instituições provocando o mal, sem fazer nada para a saúde financeira coletiva.