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A sustentação oral e o direito: convencer não pressupõe pompa e erudição

Faça o melhor uso possível da previsão legal, controle o tempo e sensibilize o interlocutor para a importância do advogado.........

Por Gustavo Henrique de Brito Alves Freire Publicado em 29/11/2025 às 0:00 | Atualizado em 29/11/2025 às 16:53

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"Se você quer construir um navio, não chame as pessoas para juntar madeira ou atribua-lhes tarefas e trabalho, mas sim ensine-as a desejar a infinita imensidão do oceano" (Antoine de Saint-Exupéry).

O que poderia existir em comum entre figuras como Mandela, Oprah, Obama, o falecido Papa Francisco, Malala Yousafzai, o recém-eleito Prefeito de Nova Iorque Mamdani, entre outras? Todos são exímios oradores.

Falar em público, porém, não é um talento que se adquire com coaches ou pagando cursos caros. Pressupõe querer manejar o que é, afinal, uma arte. Não bastam simplesmente as caras e bocas, nem a memória para citações, algumas, inclusive, em latim ou em outras línguas, as vivas, que não a conterrânea.

Os maiores oradores não apenas são eloquentes. Sabem compreender em profundidade o contexto no qual inseridos, qual o perfil da audiência e que impacto as suas palavras podem produzir. Oratória não é só técnica. Nos exemplos acima referidos, encontram-se autores de manifestações que não foram improvisações, mas explanações estrategicamente construídas, lapidadas, até ensaiadas para causar uma determinada impressão.

Por isso é essencial que o orador saiba exatamente a mensagem que necessita transmitir; adaptar sua linguagem ao público e às circunstâncias; comunicar com verdade e sinceridade; ser claro na exposição e perceber que convencer não é dar um mergulho duplo salto carpado no dicionário para dele pinçar os termos mais rebuscados, o que acaba soando como arrogância e não como sapiência.

Cito dois paradigmas. Luther King com seu discurso "I have a dream" por uma sociedade justa, igualitária e unida nos EUA; e Winston Churchill perante o Parlamento britânico no convulsionado ambiente da Segunda Guerra, com seu discurso "We shall fight on the beaches", ocasião em que soube como ninguém comunicar coragem em um cenário de profunda incerteza.

São por isso, não à toa, listadas como principais ferramentas dos grandes oradores de todos os tempos: (1) a clareza de propósito (saber precisamente por que está falando); (2) uma narrativa forte (organizar as ideias com começo, meio e fim); (3) uma presença autêntica (ocupar o espaço com naturalidade); (4) domínio técnico (usar voz, ritmo, pausas e gestos com intenção); e (5) conexão emocional (fazer o público sentir e não apenas ouvir). Não se trata, assim, de uma fórmula milagrosa, vendida no comércio, mas de um conjunto de qualidades que a perseverança pode propiciar.

No plano da ciência jurídica, a sustentação oral não é capítulo burocrático. É a oportunidade que o advogado possui, em nome do cliente, o cidadão, de apresentar seus argumentos olho no olho, buscando persuadir os julgadores, desde a pessoa do relator, que, como regra, traz à sessão seu voto pronto. Uma sustentação oral bem-feita pode virar o jogo do caso, seja alterando a percepção

do relator, seja motivando pedido de vista por um vogal, seja calçando uma divergência na própria sessão.

Sustentar oralmente é prerrogativa do advogado (Lei 8.906/1994, artigo 7º, inciso IX), mas de pouco ou nada adianta se for vencida ou suplantada pelo nervosismo e pela dificuldade de concatenar e verbalizar o raciocínio. Segundo o professor José Rogério Cruz e Tucci, em felicíssimo artigo para a revista eletrônica

Consultor Jurídico publicado em 20/02/2018, rememorando Chiovenda, o maior erro do advogado ao sustentar oralmente, é abusar da paciência dos julgadores, repetindo da tribuna teses já contidas em memoriais escritos que distribuiu nas vésperas.

Daí porque o receituário a ser seguido envolve, em doses bem medidas, os ingredientes da síntese e da objetividade. Uma sustentação oral presencial, síncrona, eficaz, e não por vídeo, nem por Inteligência Artificial, mas também a conquista da oratória apta a atrair pela clareza e a capturar a atenção pela simplicidade, sem ser enfadonha.

Vai agora a dica final: faça o melhor uso possível da previsão legal, controle o tempo e sensibilize o interlocutor para a importância do advogado quando a argumentar da tribuna, fora da frieza do roteiro escrito, densificando, com isso, verdadeiramente, o artigo 133 da Constituição Cidadã.

Gustavo Henrique de Brito Alves Freire, advogado

 

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