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Papai e mamãe, quem tem medo da Inteligência Artificial?

Como ajudar seu filho a usar a IA de forma emocionalmente segura. Jaime Ribeiro ensina neste artigo boas estratégias para introduzir a IA

Por Jaime Ribeiro Publicado em 06/09/2025 às 9:04

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Outro dia, uma mãe de aluno de uma grande escola de Recife me confidenciou: “Tenho medo de deixar minha filha usar inteligência artificial. Ela pode ficar preguiçosa, pode deixar de aprender, pode até começar a confiar mais na IA do que em mim.”

Esse medo é legítimo. E não é exclusivo dela.

Pais de todas as partes carregam a mesma angústia. Afinal, é assustador imaginar uma máquina ocupando o espaço de conselheira, professora e, em alguns casos, até de amiga íntima. A geração que hoje está crescendo já conversa com assistentes digitais como quem fala com um colega de classe. O receio é que, nesse diálogo, os pais se tornem coadjuvantes.

Mas aqui está o ponto central: a IA não vai desaparecer. Ela será cada vez mais presente, mais sofisticada e mais integrada à rotina de crianças e adolescentes. A questão não é impedir o contato, mas escolher como ele vai acontecer.

No passado, pais temiam a televisão. Antes dela, foi o rádio. Cada nova tecnologia desperta pavor porque escapa ao controle. Mas a história mostra que o perigo maior não é o avanço tecnológico em si, mas a ausência de orientação no seu uso. A televisão não destruiu gerações inteiras porque havia famílias que mediavam, que explicavam, que davam contexto. Com a IA, será a mesma coisa.

De muleta a trampolim: Reorientando a IA no aprendizado escolar

Imagine uma criança diante de um dever de casa de história. Sozinha, ela pode digitar a pergunta no chat da IA e copiar a resposta sem refletir. Mas acompanhada por um pai ou uma mãe, a cena muda: “Vamos perguntar juntos? Vamos comparar com o que está no livro? O que você acha dessa resposta? Faz sentido?” Nesse simples diálogo, a IA deixa de ser muleta para se tornar trampolim. Não rouba aprendizagem, amplia.

Pais têm medo da preguiça. Mas preguiça não é produto exclusivo da IA. O que define se uma criança vai usar ou não a inteligência artificial de forma preguiçosa é o tipo de orientação que recebe. A IA pode ser um atalho, mas também pode ser academia intelectual. Tudo depende da forma como se apresenta a ferramenta.

Há também o medo da substituição emocional. “E se meu filho confiar mais na IA do que em mim?” Essa é uma pergunta dolorosa. Já vimos casos em que crianças, em busca de acolhimento, desabafam com sistemas artificiais sobre solidão, tristeza e até sobre o desejo de morrer. Em pelo menos um episódio documentado, isso terminou em tragédia. É um alerta que não pode ser ignorado.

Mas o erro seria culpar apenas a tecnologia. A IA preenche espaços vazios. Quando a criança não encontra no adulto o porto seguro da escuta, procura na máquina. Não porque confia mais nela, mas porque ali não encontra julgamento. É aqui que os pais precisam refletir: não basta proibir a IA, é preciso construir um vínculo de confiança que seja mais forte do que qualquer algoritmo.

Ser mentor no uso da inteligência artificial exige duas atitudes simples e poderosas. Primeiro, estar presente. Não delegar a tecnologia como babá digital. Usar junto, comentar, questionar, explorar. Segundo, ser porto seguro emocional. Escutar de verdade, sem ridicularizar dúvidas ou medos, mostrando que a casa é um espaço de diálogo aberto.

Mentoria Ativa: As práticas essenciais para pais na era da IA

E, enquanto não existem controles parentais robustos para IA, sugiro algumas práticas que podem ser adotadas imediatamente:

  • Use junto. Explore perguntas com seu filho e analisem juntos as respostas.
  • Ensine a perguntar bem. A qualidade da pergunta define a qualidade da resposta.
  • Conecte com a escola. Dialogue com professores sobre como a IA pode apoiar os estudos.
  • Valorize a autoria. Incentive que seu filho personalize e reescreva conteúdos gerados.
  • Fale sobre limites. Explique que a IA erra e pode inventar informações.
  • Fortaleça a escuta em casa. Seja um espaço de confiança, sem julgamentos.
  • Dê o exemplo. Use a IA de forma crítica na frente dos filhos.

Esses pequenos gestos transformam o que parecia ameaça em oportunidade. A IA pode ser um trampolim para criatividade, senso crítico e novos aprendizados, desde que os pais não se ausentem.

No fim das contas, a IA é como um rio caudaloso. Pode inundar e destruir, mas também pode regar e fortalecer. Depende das margens que os adultos ajudam a construir. O medo dos pais é legítimo, mas não pode ser paralisante. Ao contrário, pode ser motor de uma nova postura: assumir o papel de mentores, orientadores e influenciadores primários da vida digital dos filhos.

Se não fizermos isso, corremos o risco de terceirizar a formação de uma geração para algoritmos indiferentes. Se fizermos, transformaremos a IA de ameaça em oportunidade.

E talvez, daqui a alguns anos, quando nossos filhos olharem para trás, não se lembrem do que a inteligência artificial respondeu. Mas vão se lembrar de quem esteve ao lado deles para interpretar as respostas.

Sobre o JC Educação

No próximo dia 11 de setembro, Jaime Ribeiro estará no evento JC Educação - Saúde Mental da Escola: Um Desafio Coletivo, onde vai tratar desses e de outros temas para a comunidade escolar do Recife.

O encontro vai ocorrer no auditório do Sistema Jornal do Commercio de Comunicação, no bairro de Santo Amaro, área central do Recife.

O evento será apresentado por Mirella Araújo, titular da coluna Enem e Educação do JC. Além de Jaime, também estarão presentes:

  • Rossandro Klinjey - Psicólogo, palestrante e consultor em Educação e Desenvolvimento Humano.
  • Gilson Monteiro - Secretário de Educação de Pernambuco.
  • Cecília Cruz - Secretária de Educação do Recife.

*Jaime Ribeiro, executivo da área de educação, escritor, palestrante e CEO da Educa

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