Alguns poetas de São José do Egito (1)
A cidade sertaneja, hoje consagrada como o recanto poético do mundo, foi emancipada, somente, no ano de 1909 ...........................

Ninguém tem dúvidas de que São José do Egito, cidade encravada nas cabeceiras do Rio Pajeú, no alto sertão de Pernambuco, de há muito tornou-se um celeiro da poesia popular brasileira, particularmente no tocante aos seus cantadores de viola de ontem e de hoje, poetas repentistas que com amparo na viola representam a mais sublime de todas as culturas populares, vates que assopram versos improvisados que encantam a alma e a sofreguidão de um povo marcado pela seca que costuma assolar suas raízes, gente sofrida que encontra nos versos dos seus cantadores uma das fontes da vida e da esperança em melhores dias.
A cidade sertaneja, hoje consagrada como o recanto poético do mundo, foi emancipada, somente, no ano de 1909, recebendo inicialmente o nome de São José das Queimadas, depois São José da Ingazeira e, finalmente, em homenagem ao seu padroeiro, passou a ser denominada de São José do Egito, que no dizer de Neném Patriota "quem não é poeta é louco e quem é louco faz poesia".
Não é possível, neste espaço, mencionar todos os poetas e poetizas do seu presente e do passado, mas alguns deles merecem ser lembrados e enaltecidos, porque fizeram e fazem parte da história de um lugar em que Deus abençoou e jorrou as suas mãos em homenagem à sabedoria poética que sempre brotou naquele pedaço do sertão, onde o dom da poesia amanhece e enoitece às margens do Rio Pajeú.
Antônio Marinho do Nascimento (1887/1940), o príncipe dos cantadores, o Faraó da Poesia, versejando sobre o passado, disse:
Quem jamais esquecerá
Quem deixará de dar fé
Tudo que foi e não é
Tudo que houve e não há
Tudo que esteve não tá
Tudo que deu-se não dá-se
Por mais que na vida cace
É sempre um ente infeliz
Quando queixoso se diz
Ah se o passado voltasse
João Campos Filho (1911/1998), um humilde agricultor, quando a torre da igreja de São José veio abaixo (1977), proclamou:
Foi a dois do mês de maio
Às sete horas do dia
Que a torre deu um desmaio
Quando o seu corpo caía
Mas isso tudo passou
O povo se conformou
Resta a saudade no peito
Agora é o povo agir
Que se Jesus consentir
Faz outra do mesmo jeito
João Batista de Siqueira, Cancão (1912/1982), Oficial de Justiça, um fenômeno da poesia popular, exaltando dois coqueiros que plantara no seu sítio, devassados pela chuva, versejou:
Em certos dias marcados
Choveu torrencialmente
E foram os dois abraçados
Por poderosa corrente
Um rodava outro pendia
A água se remexia
Numa fúria de dragão
O mais fraco já vencido
Num arrojo desmedido
Caiu sem ter salvação
Lourival Batista Patriota, o Louro do Pajeú, o rei dos trocadilhos, tratando da vida do idoso, improvisou:
O homem na mocidade
Com duas pernas se arruma
Mas depois que fica velho
Em tudo se desapruma
De duas passa pra três
E as três não valem nenhuma
Na próxima semana tem mais.
Adeildo Nunes, juiz de Direito aposentado, doutor e mestre em Direito de Execução Penal, professor da pós-graduação em Ciências Criminais do Instituto dos Magistrados do Nordeste, membro efetivo do Instituto Brasileiro de Execução Penal (IBEP), autor de livros jurídicos e de poesias