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O STF, a defesa democrática e a carapuça de assassino da trama detetivesca

"Aqueles que não conhecem a história estão fadados a repeti-la". É disso do que se trata. Conhecer os fatos para entender .........

Por Gustavo Henrique de Brito Alves Freire Publicado em 01/07/2025 às 0:00 | Atualizado em 01/07/2025 às 13:51

Dia desses, na imprensa do Sudeste (Estadão), nomes de expressão da advocacia escreveram artigos contra e a favor à/da pretensa suspeição do Ministro Alexandre de Moraes, do STF, para julgar a ação penal que apura os eventos do 8/1/2023, suspeição que poderia, claro, contaminar a credibilidade da Corte em maior análise. Trata-se de debate que, inclusive nos meios jurídicos, ainda se insiste em fazer.

De um lado, Luíza Oliver tece duras críticas ao Tribunal e lhe imputa a condição de agente contributivo da erosão da democracia, já que estaria a absorver, indevidamente, os papeis de vítima e julgador, solapando o devido processo legal; de outro lado, Lênio Streck e Antônio Carlos de Almeida Castro (Kakay) refutando tais críticas e acentuando que o Supremo, regra geral, vem agindo dentro das regras do jogo.

Quem observa a história com alguma neutralidade entende que o STF não é o assassino da trama. Entende, ainda, que foi, sobretudo, depois de anular ilegalidades processuais e contra o direito de defesa praticadas no âmbito da Operação Lava Jato, que a Corte passou a levar tantas pedradas. Nada é aleatório.

Só para que se tenha uma ideia, entre out/2021 e out/2022, 95% das respostas às postagens do Supremo publicadas no Twitter (atual X) contiveram discursos de ódio à Corte. O dado consta do ensaio "Far-right discourse in Brazil — Shameless language as a common practice?", assinado por Ana Larissa Oliveira, Timea Drinóczi e Monique Miranda, todas da UFMG, publicado no "Journal of Language and Politics".

No trabalho, foi levantado que, dos 38.881 tuítes direcionados à conta oficial do STF que continham hashtags, 94,9% das respostas eram de "linguagem impolida e indecorosa", sendo apenas 5,1% neutras ou positivas às decisões da Corte. As mensagens consignavam, além de palavras agressivas, a manipulação de fatos e apelos emocionais, sendo uma das motivações para isso a tentativa de evasão da culpa em processos judiciais. O pico de mensagens agressivas coincidiu com o chamado "Inquérito das Fake News" (Inq. nº 4.781).

Ao tentar colocar na berlinda a credibilidade do Supremo, visa-se interditar o debate real e impedir a crítica informada, os quais são fundamentais à cidadania. Infelizmente, esse viés de raciocínio encontra apelo em setores da sociedade e serve para distrair de discussões importantes. É estimulado um autofágico "nós contra eles", com a construção de um "inimigo comum", contra o qual a maioria fictícia deve buscar líderes dispostos ao enfrentamento (e às favas o sistema de freios e contrapesos). Não é estratégia nova, mas dispõe, hoje, dos polpudos recursos das plataformas digitais, a garantirem propagação viral.

No julgamento das ações penais do 8/1, a 1ª Turma do STF, colegiado natural em face de regra modificativa de competência introduzida em 2023 (Emenda regimental 59), vem fazendo estritamente aquilo que lhe cabe na dosimetria, somando as penas de diferentes crimes cometidos em concurso (criminalidade multitudinária). Por igual, os réus sabem do que são acusados e em que contexto. As denúncias, por sua vez, são passíveis de prova em sentido contrário, mas não foram rejeitadas como ineptas, nem a gravidade dos eventos é negada. Não está a ocorrer nenhum Tribunal de Nuremberg.

O Inq. nº 4.781 se traduz como medida de democracia defensiva (conceito nascido na Europa do pós-Segunda Guerra), não ação orquestrada ou corporativista da Corte Suprema. A excepcionalidade do seu surgimento no mundo jurídico não permite atuação que privilegie a forma sobre o conteúdo. Logo, não se pode aceitar o minimalismo interpretativo favorável a um governo autoritário; nem a deferência em relação aos atos perpetrados pelos agressores; nem a inércia em resposta a atos direcionados contra a Carta Magna.

Como afirmou George Santayana: "Aqueles que não conhecem a história estão fadados a repeti-la". É disso do que se trata. Conhecer os fatos para entender o que nos trouxe até aqui e como avançarmos. É tempo de desvilanizar o STF, que, de fato, nem sempre acerta, mas que, no tema democracia, tem sido uma força da Natureza na salvaguarda da Constituição Cidadã.

Gustavo Henrique de Brito Alves Freire, advogado

 

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