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Nas confrarias da amizade, a tradição da convivência

Nas confrarias da amizade, a convivência constante com os amigos é essencial como ato de existência necessário para fertilizar e fortalecer a vida.

Por JONES FIGUEIRÊDO ALVES Publicado em 28/06/2025 às 0:00 | Atualizado em 28/06/2025 às 10:43

As confrarias da amizade são grupos formados por amigos que compartilham interesses, valores ou simplesmente a vontade de fortalecer laços de convivência. Essas confrarias podem ter diferentes propósitos, desde encontros sociais e culturais até iniciativas de apoio mútuo, filantropia ou networking profissional.

O termo "confraria", reflete bem sua composição latina em sua junção de "com" "frater", significando "junto ao irmão".

A vida precisa de amizades para o seu bem-estar mental, o apoio emocional, a celebração de conquistas, a importância dos vínculos, os elos essenciais. A amizade mais nobre, no conceito aristotélico, é a baseada no respeito e admiração mútua. Aristóteles (384-322 a.C.), em sua "Ética a Nicômaco" exaltou a amizade que transcende o tempo, afirmando: "Ninguém escolheria viver sem amigos".

Confrarias sempre existiram, colocando mais vida na vida, compartilhando aptidões e preferencias, interesses e aprendizados. Surgidas na Idade Média, com sua origem designativa às associações religiosas ou laicas, tiveram inicialmente finalidades espiritual e/ou assistencial.

É bastante conhecida a "Confrérie des Chevaliers du Tastevin" ("Fraternidade dos Cavaleiros da Taça de Degustação de Vinhos") uma confraria de Nuits-Saint Georges, na Borgonha (França), fundada em 1934 por Georges Faiveley e Camille Rodier, dedicada à apreciação do vinho e da gastronomia.

Nessa área de interesse despontam, com rituais de estilo e segura organização, as confrarias de Portugal, destacando-se a Confraria do Vinho do Porto; onde figura como um de seus mestres o empresário João Carlos Paes Mendonça.

Em Recife, um grupo informal acaba de comemorar seus 32 anos de convivência ininterrupta, reunindo-se todas as semanas, às quintas-feiras. Sua identidade própria não se vincula a clube de serviço do qual emanaram os seus integrantes; ganhou autonomia pelo liame fortalecido na segurança das amizades, em congraçamento permanente, afetivo e solidário. Tal como diáconos, sempre aprendizes em apoio à comunidade, o que a Igreja define como "baixo clero", empresta-se ao grupo essa denominação.

Integram a confraria (em ordem alfabética): Aldonso da Cunha Pedrosa Júnior, Cid Lobo Mendonça, Eunando Prazeres de Azevedo, Evandro Sergio Netto Magalhães Melo, Jones Figueirêdo Alves, Jorge Emanuel Cavalcanti de Lima, Jorge Lobo Mendonça, Nelson Araújo Quaiotti (o seu chanceler), Resielio Alves de Siqueira, Romildo Leite Sales, Paulo Fernando Gomes de Biase e Welligton Pereira Santos. Importa um tributo de saudade e homenagem "in memoriam" aos seus fundadores Corsino Dantas Lima, Vicente Gouveia e José Júlio Fernandes.

No Caffè Florian, em Veneza, Itália, há registros de grupos de amigos que se reúnem regularmente desde o século XVIII. O café era frequentado por figuras

como Casanova, Lord Byron e Goethe, e até hoje mantém a tradição de encontros de amizade.

Cumpre lembrar os cafés ingleses do século XVII, notadamente os de Londres, espaços de intensa atividade intelectual e social, conhecidos como "Penny Universities" ("Universidades de um centavo"). A discussão de ideias, o debate do noticiário do dia, a troca de opiniões sobre diversos temas, motivavam as reuniões.

Os historiadores anotam que os antigos cafés eram centros vibrantes de troca de ideias, onde pensadores, comerciantes e inovadores se reuniam para debater conceitos que moldariam a sociedade e a política da época. Esses berços de ideias revolucionárias fomentaram o surgimento de importantes movimentos sociais, além de obras que deixariam suas marcas nos séculos seguintes.

Algumas das universidades mais antigas possuem clubes e sociedades que remontam à Idade Média, como os clubes de debates e fraternidades de Oxford e Cambridge. Ali, o "The Oxford and Cambridge Dining Clubs" e o "Bullingdon Club", ambos do século XVIII, são dois dos mais conhecidos.

Ordens e irmandades iniciadas na Idade Média, como as ordens maçônicas e confrarias religiosas, ainda existem e mantêm laços de amizade entre seus membros. As confrarias canónicas tiveram uma grande difusão em Portugal, designadamente as do Santíssimo e as da Doutrina Cristã.

Dentre as confrarias mais antigas, situam-se: (i) o "The Royal Society Club" (1743), iniciado pelos cientistas ligados à "Royal Society", cujos membros reúnem-se para discussões informais, (ii) o "The Eton Society" ("Pop"), fundado no tradicional Eton College (1811), uma sociedade exclusiva, depois tornada clube social, muito frequentado por seus ex-alunos; (iii) o "The Garrick Club, de Londres (1831), clube criado por atores, escritores e intelectuais da época vitoriana, que continua ativo, reunindo amigos de longa data; (iv) a dos veteranos da Batalha de Gettysburg, na Guerra de Secessão (1863), cuja tradição continua com seus descendentes.

Exemplo importante de confraria, próximo de nós, tem sido o Sistema LIDE, grupo de líderes empresariais, surgido no país em 2003, presidido em Pernambuco por Drayton Nejaim. Um grupo de "networking" e de influência empresarial, que busca estimular o empreendedorismo, boas práticas de gestão e responsabilidade social.

Para além dos clubes de serviços ou de grupos informais, vale dizer que nas confrarias da amizade, a convivência constante com os amigos é essencial como ato de existência necessário para fertilizar e fortalecer a vida. Amizade exige constância no aprendizado recíproco. Bem afirmou Marcus Tullius Cícero:

somente entre os bons pode haver amizade.

Jones Figueirêdo Alves, desembargador Emérito do TJPE. Advogado e parecerista.

 

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