Como você quer se imunizar: com vacina ou com a doença?
Você pode decidir: voltar às técnicas rudimentares da Idade Média, ou usar as modernas e bem testadas vacinas antivirais............,

Nas últimas semanas vivemos um retorno do coronavírus, com novas variantes (e a requentada polêmica da vacina). Preparem-se, provavelmente daqui para frente será assim. Mais uma virose sazonal (que volta em certa época do ano), tal qual a Influenza. Felizmente, na grande maioria dos casos atuais, a doença tem manifestações leves. Será que essas variantes se tornaram menos agressivas? É provável. Os vírus, inteligentes, aprendem que matar seu grande hospedeiro - o ser humano - nada contribui para sua sobrevivência. Ou teria sido a famosa "imunidade de rebanho" (a imunização pela contaminação em massa)? Sim, isso teve parte no processo.
Mas, no meio do caminho, levando muita gente boa. O que nos reporta à idade média. Quando os orientais expunham seus filhos aos doentes com varíola - a grave doença da época. Depois partiram para inocular, de forma rudimentar, pus das pústulas em pessoas sadias. No início do século 18, quando a Inglaterra vivia um surto de varíola, a aristocrata Lady Mary Montagu retornou da Turquia com o conhecimento dessa prática e inoculou, eficazmente, sua filha de 3 anos. Um dos médicos, que acompanhou o caso, se entusiasmou e passou a usar a técnica. Na época, até a princesa de Gales permitiu que inoculassem seus filhos. Mas outros ciumentos profissionais fizeram campanha contra, rotularam Lady Mary de "ignorante" e o procedimento parou por aí.
Até que, no final do século 18, Edward Jenner, um médico inglês, observou que ordenhadoras de vacas infectadas com varíola bovina - vírus mais brando - não desenvolviam a grave varíola humana. Então, em 1796 inoculou James Phipps, de 8 anos - mães tinham coragem, não é? - com pus da pústula de uma ordenhadora. Ocorreram reação no local da inoculação e alguns dias de mal-estar, mas a criança se recuperou. Ao fim de meses, Phipps foi exposto ao material de paciente com varíola humana - haja coragem!! - e permaneceu sadio. Assim, Dr. Jenner e Phipps foram protagonistas da primeira bem sucedida vacina (nome que se origina do latim vaccinus, relacionado a vaca).
A eles devemos a erradicação da temível varíola em 1980. Depois vieram os famosos experimentos de Louis Pasteur e Pierre Émile Roux que alavancaram a terapia vacinal. Até que apareceu a COVID-19! Com ela a ridícula batalha política - desde quando política e ciência médica coabitam no mesmo espaço? - sobre vacinas e tratamentos. Tudo agravado pela veloz disseminação nas redes sociais. Onde coexistem o que há de melhor e de pior no ser humano! Para minha perplexidade, com participação ativa de profissionais de saúde, entre eles alguns médicos! No meio do tiroteio, as modernas vacinas de mRNA.
O RNA mensageiro humano, ou mRNA, foi descoberto no início dos anos 1960. Logo os pesquisadores enxergaram que ele poderia entregar mensagens desejáveis às células. E desde então cuidadosas pesquisas vêm sendo feitas para ultrapassar dificuldades e viabilizar seu uso em vacinas. Tanto para agentes infecciosos como para células cancerígenas. Com a chegada da nanotecnologia e a criação de nanopartículas lipídicas (cujos detalhes técnicos fogem ao escopo desse texto), finalmente vacinas eficientes de mRNA foram desenvolvidas.
Desde 1989 elas vêm sendo testadas, em animais e humanos, com segurança similar ou superior às vacinas virais clássicas (não-RNA). Fazendo exceção os portadores de doença autoimune, que podem ter piora de sintomas. As vantagens das vacinas de mRNA sobre as tradicionais são a facilidade de design, velocidade, menor custo de produção, a indução de imunidade celular e humoral e a falta de interação com o DNA genômico.
Faltando dizer que vacinas são feitas para induzir reação (reatogenicidade), sem o que não criam anticorpos. E não são "redomas", portanto não impedem que você contraia o vírus. Mas induzem suas defesas a eliminarem o agressor bem mais rapidamente, consequentemente com menos complicações da infecção.
Portanto, meu leitor, você pode decidir: voltar às técnicas rudimentares da Idade Média, ou usar as modernas e bem testadas vacinas antivirais.
Murilo Guimarães, médico pneumologista