Roberto Pereira: Elyanna, a pianista, o piano alado e o virtuosismo
Elyanna Caldas ganhou a eternidade, certamente para chegar ao céu, cujo Deus tanto merece os encantos da divina música que emana da arte dela

A escritora e pianista Elyanna Caldas ganhou, neste final de semana, a eternidade, certamente para chegar, entre as nuvens, ao céu, cujo Deus tanto merece os encantos da divina música que emana da arte de nossa pernambucana, de belas lições aqui neste planeta, e cujo legado foi de estudos e realizações no plano dos acordes musicais.
Ela se iniciou, pela talvez traquinagem de imitar a irmã, na tenra idade dos seus 5 anos, quando começou a dedilhar canções infantis até chegar, aos 10 anos, a dar, entre colegas de lições ainda iniciais, um concerto no Teatro de Santa Isabel, vivenciando as emoções de um palco da tradição do espaço considerado o foyer da cultura pernambucana.
Nessa fase, era aluna do Instituto Ernani Braga, notadamente das irmãs Nobre de Almeida, Hilda e Nísia.
Aos 17, representou o Brasil no V Concurso Internacional Frederico Chopin, em Varsóvia, Polônia. Sua brilhante carreira internacional de concertista a levou a se apresentar em diversos países, sempre muito aplaudida e admirada por todas as plateias de diversos quadrantes do mundo.
Eleita para a Academia Pernambucana de Letras (APL), Cadeira de Número 14, na vaga aberta em julho de 2019, pelo desenlace do médico Rostand Paraíso, Elyanna foi proativa numa série de apoios e participações naquela Corte literária, sobretudo quando de recitais por ela realizados, nos domingo à tarde, com o auditório apinhado de pessoas, aberto ao público, ensejando, à gente pernambucana, o que há de melhor quando das realizações de concertos de música clássica, uma necessidade aos nossos cometimentos espirituais, sempre ansiados e desejados por nossos patrícios, sequiosos de bons domingos à tarde.
Hoje, essas tardes ficarão vazias à espera de quem possa fazer as vezes de Elyanna Caldas Silveira.
Em entrevistas às emissoras de televisão, quando do seu ingresso na APL, chegou a revelar que o seu pai não estava aprovando as viagens dela para os recitais além das fronteiras do Brasil. O desenlace precoce do seu genitor, conquanto muito sentido pela filha, foi o passaporte para as suas viagens musicais/culturais, atendendo o seu desejo interior.
Foi, viu e venceu!
Dentre suas inúmeras conquistas, especial relevo ao 1º prêmio no Concurso Magda Tagliaferro (Rio de Janeiro/1957) e à licenciatura em Música pela École Normale de Musique de Paris. Além de sua carreira de concertista, Elyanna Caldas dedicou-se incansavelmente ao ensino, tendo sido uma obstinada no exercício do magistério. Foi professora fundadora do Curso de Música da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), onde lecionou piano entre 1960 e 1986.
Na sequência, fez curso de especialização chopiniana na Polônia com a professora Marguerita Trombini-Kazuro. Em Viena, foi aluna de Bruno Seidlhofer e frequentou os Festivais de Salzburg em 1957, 1958 e 1967, referenciais somente comportados pelos grandes da arte musical.
Autora do livro Caminhos de uma Pianista, em que ela traça, com as cores da emoção, o seu trajeto de vida, desde a doce meninice até os dias de glória da pianista consagrada, sempre premiada, inclusive, partindo para Paris com bolsa de estudos de um ano.
Foi professora do Conservatório Pernambucano de Música, onde ocupou o cargo de presidente de 1987 a 1991 e de 1995 a 1999, tendo se havido, enquanto gestora, com zelo e brilhantismo à altura das expectativas daquele conservatório e do esperado pela sociedade recifense e pernambucana.
Na perspectiva de ampliar os horizontes profissionais do artista nordestino, fundou em 1983 o Movimento Arte e Cultura do Nordeste, que objetivava uma maior integração entre os diversos campos de atividade.
Entre 1983 e 1986, o movimento realizou temporada, congregando artistas de várias áreas, e estimulando a descoberta de jovens.
Também idealizou e coordenou no Recife os Festivais Schumann/Chopin (2010), Liszt/Mendelsohn (2011) e Debussy/Albeniz (2012), sob o patrocínio do Governo do Estado.
Voltou à Europa, em 1967-1968, para novos cursos de aperfeiçoamento e pedagogia pianística. Como bolsista do Governo francês, realizou, na qualidade de presidente do Conservatório Pernambucano de Música, estágio de observação nos Conservatórios Erik Satie e Gabriel Fauré de Paris entre abril e junho/1997.
Gravou cinco CDs: Simplesmente Capiba, com obras para piano do compositor, Capiba, Valsas Choros; O Charme da Valsa e do Maxixe, com obras do paulista Aurélio Gregori; Tritoni e O Piano em Pernambuco, com músicas de autores pernambucanos dos fins do século 19 e início do século 20.
Este o perfil de uma pianista que foi corpo e alma no seu mister.
Quando presidi a Fundarpe, nos longes de 1983/87, foram muitos os projetos levados a efeito pelo quadro funcional daquela entidade que não se bastou a si mesmo, abrangendo as diversas linguagens no campo da cultura, dentre tantas, a música clássica.
Prêmios, como o do Concurso Nordestino de Piano José Paulo Alimonda, os circuitos barrocos, a Sinfonia dos 2 Mundos, texto de Dom Helder Câmara, Ana Lúcia Altino Garcia no piano, orquestras sinfônicas, maestros renomados, pianistas Nelson Freire, Josefina Aguiar, Antônio Guedes Barbosa, Marco Caneca, Jussara Correa de Oliveira, avultando, entre muitos, a pianista Elyanna Caldas, uma das referências de Pernambuco para o mundo.
Elyanna, e o seu virtuosismo, tocando, com o corpo e a alma, os teclados que pareciam fazer, do instrumento, um piano alado.
*Roberto Pereira foi secretário de Educação e Cultura do Estado de Pernambuco e é membro da Academia Brasileira de Eventos e Turismo