Desigualdades regionais no desenvolvimento brasileiro
O Brasil testemunhou a perda de relevância das políticas explicitas ao longo deste século, associada à crescente fragilização de de financiamento.

Recife hospedou na semana passada seminário patrocinado pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (IBRE/FGV. O objetivo era repensar o desenvolvimento do Nordeste olhando para a frente à luz da teoria econômica e das mudanças ocorridas nos últimos 69 anos desde a publicação do histórico documento do Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste (GTDN), inspirado e liderado por Celso Furtado. Este documento lançou as bases para a criação da SUDENE e motivou a elaboração dos diversos planos de desenvolvimento aplicados à Região sobretudo nos anos 60, 70 e 80 do século passado. O Nordeste avançou, mas as desigualdades ainda persistem com a participação da região no PIB nacional e na população brasileira ainda em 13,8% e 27,8%, respectivamente, a segunda quase o dobro da primeira. O Nordeste de hoje é mais prospero do que há décadas atras. Contudo, precisa ser mais célere na sua trajetória de desenvolvimento.
Nos anos 50, Simon Kusnet, Prêmio Nobel de Economia de 1971, elaborou a hipótese de que as desigualdades de renda (pessoais, regionais) se elevam nos ciclos iniciais do crescimento econômico para depois declinarem nos seus estágios mais avançados. O debate centrou-se na questão de se as desigualdades diminuiriam exclusivamente em consequência da operação das forças de mercado ou se a intervenção do Estado via políticas públicas seria estratégica para reduzi-las. A história tem demonstrado que a presença do Estado, tanto nas economias avançadas quanta nas em desenvolvimento, é importante para reduzir as diferenças nas suas trajetórias de expansão econômica e social. Um país pode crescer com as desigualdades aumentando, como no caso dos Estados Unidos.
Não há dúvidas de que as forças de mercado, apesar de sujeitas às variações cíclicas típicas do capitalismo, produzem avanços econômicos. A questão é que a redução das desigualdades exige que o crescimento dos países ou regiões menos desenvolvidas seja mais rápido do que aquele observado nas mais prósperas, ou seja, as mais pobres têm que crescer em média, mais celeremente do que as mais ricas. Não há lei de mercado que assegure que isso vá acontecer sem que o Estado atue por meio de políticas públicas e seus instrumentos para reduzir as distâncias entre as trajetórias de expansão econômica dessas economias. Desigualdade é um conceito relativo às diferenças. Numa corrida, quem parte atrás, para terminar entre as primeiras posições, tem que correr mais rápido. As políticas públicas tem que levar em conta esse fato. Numa sociedade desigual, o princípio fundamental da política pública é o da igualdade de oportunidades e, este conceito, se aplica ao caso das desigualdades espaciais de desenvolvimento.
Na década dos setenta escrevi, organizei e editei um livro sobre Desigualdades Regionais no Desenvolvimento Brasileiro, um estudo contratado pelo IPEA. Neste livro elaborou-se o conceito de políticas regionais explicitas e implícitas As explicitas são aquelas cujo objetivo é promover um território especificamente determinado como o Nordeste. As implícitas seriam a regionalização das politicas nacionais como a de neoindustrialização (NIB, por exemplo). As duas são necessárias.
O Brasil testemunhou a perda de relevância das políticas explicitas ao longo deste século, associada à crescente fragilização de seus instrumentos de financiamento, apesar do protagonismo dos Fundos Constitucionais (no Nordeste, o FNE, operado pelo Banco do Nordeste.
O conceito de política implícita requer o princípio da igualdade de oportunidades. A cada região é dada a oportunidade de participar e de colher os frutos advindos das políticas nacionais. As políticas implícitas teriam dois propósitos. O primeiro é rever as politicas nacionais que têm rebatimentos regionais negativos, corrigindo=as, se possível. A segunda é formular politicas nacionais; setoriais, de crédito, etc., de forma a levar em consideração, na sua aplicação, as diferenças espaciais de desenvolvimento, ou seja, regionalizando-as para atender as especificidades de cada região, complementando as políticas explicitas.
No caso da Nova Indústria Brasil-NIB,, uma política nacional, identifica-se uma diretriz na categoria de Ambiente de Negócios que se destina a desenvolver um Sistema Nacional de Territorialização do Desenvolvimento Industrial
Essa diretriz não se constitui, ainda, em uma regionalização da NIB. A diretriz recomenda apenas monitoramento de impactos e não em desenvolver instrumentos para assegurar os rebatimentos regionais da NIB. Ainda não se identifica na nova política industrial os instrumentos necessários para regionalizá-la. A demanda, portanto, deve ser pela formulação de uma NIB regionalizada com a adequação dos seus instrumentos para alcançar os seus objetivos últimos e assegurar que seus princípios basilares, como a inclusão socioeconômica, se estendam também à dimensão regional, pela redução das iniquidades territoriais.
Jorge Jatobá, Doutor em Economia, Professor Titular da UFPE, Ex-Secretário da Fazenda de Pernambuco, Presidente do Conselho de Honra do LIDE-PE, Sócio da CEPLAN- Consultoria Econômica e Planejamento.