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Eleições na Argentina são teste de fogo para o governo de Javier Milei

O futuro das reformas ultraliberais depende da capacidade do presidente de reverter a desaprovação recorde e garantir governabilidade no Congresso

Por JC Publicado em 25/10/2025 às 19:56

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A Argentina realiza neste domingo (26) eleições legislativas cruciais que se configuram como um referendo sobre as profundas políticas de austeridade do presidente ultraliberal Javier Milei. O resultado destas eleições de meio de mandato definirá o rumo da governabilidade e a capacidade do Executivo de avançar com sua agenda de reformas econômicas.

Estarão em disputa metade das 254 cadeiras da Câmara dos Deputados (127 assentos) e um terço do Senado (24 cadeiras). Para o partido de Milei, A Liberdade Avança, que atualmente possui apenas 37 deputados e seis senadores, esta é uma oportunidade vital para ampliar sua base e mitigar a fragilidade legislativa que tem restringido a aprovação de reformas ambiciosas.

O Cenário de Desgaste Político

As eleições ocorrem em meio a um cenário político e econômico turbulento e de queda consistente na imagem de Milei desde o início de 2025. Pesquisa recente da AtlasIntel, divulgada na véspera do pleito, aponta que 55,7% dos argentinos desaprovam a gestão do presidente, enquanto apenas 39,9% a aprovam. Esta diferença de quase 15 pontos percentuais representa a maior já registrada pela série histórica do instituto.

O descontentamento é reflexo direto dos efeitos das políticas de austeridade, apesar de as medidas de “terapia de choque” terem reduzido a inflação e gerado um superávit fiscal, animando investidores. No entanto, os argentinos parecem “cansados do custo do ajuste fiscal”. A frustração econômica é generalizada: 68% dos entrevistados afirmam que o país vai mal sob a gestão Milei, e 70% dizem que o mercado de trabalho piorou.

Somado às preocupações com o desemprego (33,2%) e a inflação (30,8%), a corrupção é apontada como o principal problema (50,8%). Denúncias e escândalos envolvendo integrantes do círculo mais próximo do presidente, incluindo sua irmã e principal assessora, Karina Milei, abalaram a confiança do eleitorado, minando o discurso anticorrupção que foi central na campanha. O índice de aprovação de Milei caiu para menos de 40%, o nível mais baixo ao longo de seu governo.

Consequências de um Bom Resultado

Um resultado expressivo para A Liberdade Avança é definido por analistas políticos como a conquista de mais de 35% dos votos, sendo que aproximar-se dos 40% seria classificado como “uma eleição muito boa”. Tais marcos seriam um sinal positivo de apoio crescente, superando os 30% obtidos por Milei no primeiro turno presidencial de 2023.

Em caso de sucesso eleitoral, as consequências seriam as seguintes:

  1. Avanço Reformista: Aumentaria substancialmente a presença do partido de Milei em ambas as Casas Legislativas. Isso permitiria ao presidente continuar suas reformas econômicas, como as anunciadas reformas trabalhistas e novos cortes de impostos nacionais.
  2. Segurança de Veto: Investidores e o próprio governo estarão atentos para saber se Milei conseguirá votos suficientes para impedir que a oposição derrube seus vetos presidenciais. O partido de Milei precisará de cerca de um terço dos votos em ambas as casas para bloquear futuras derrubadas de vetos. Uma vitória expressiva fortalecerá sua posição para tal.
  3. Alianças e Governabilidade: Um bom desempenho incentivaria o apoio de possíveis aliados, como o partido centrista PRO, liderado pelo ex-presidente Mauricio Macri. A consolidação dessas alianças é fundamental para alcançar o terço dos votos necessário no Congresso.
  4. Apoio Internacional: O apoio adicional dos Estados Unidos, incluindo a promessa de ajuda de US$ 20 bilhões em swap cambial e linhas de crédito, depende do sucesso do partido de Milei nas eleições de meio de mandato, conforme sinalizado pelo presidente dos EUA, Donald Trump.

Consequências de um Mau Resultado

Embora o partido deva aumentar seu número de cadeiras, um resultado aquém das expectativas (abaixo da meta de 35% ou próximo à atual base) teria implicações negativas, principalmente no Congresso e no mercado financeiro:

  1. Paralisação da Agenda: Sem um aumento substancial de cadeiras ou o apoio firme de aliados, a oposição – liderada pelo movimento peronista, que detém a maior minoria – continuará a ter poder de fogo para derrubar vetos presidenciais. Nos últimos dois meses, o Congresso já derrubou vetos de Milei que envolviam aumento de financiamento para universidades públicas, assistência médica pediátrica e pessoas com deficiência.
  2. Risco para 2027: O desempenho eleitoral é visto como um indicador de longo prazo. O diretor para as Américas da consultoria Horizon Engage, Marcelo Garcia, alertou que “Se 2025 indicar que Milei está em declínio, os investidores começarão a se preparar para uma opção mais de centro ou centro-esquerda para 2027”.
  3. Instabilidade de Alianças: O apoio de aliados, como o PRO, depende do desempenho do partido de Milei na eleição. Um mau resultado enfraqueceria o presidente e tornaria seus aliados menos dispostos a arcar com os custos políticos de apoiar medidas de austeridade em um contexto de desaprovação popular.

Em suma, as eleições de 26 de outubro representam a hora da verdade para Javier Milei: o voto dos argentinos definirá se o presidente terá as ferramentas legislativas mínimas para dar continuidade à sua "reconstrução da Argentina" ou se enfrentará um Congresso cada vez mais hostil e capaz de minar sua agenda econômica.

(Com agências)

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