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Colégio Semear funciona de forma irregular há quatro anos; saiba como evitar problemas ao matricular os filhos

Irregularidades se arrastam há anos entre notificações, lentidão na fiscalização e incerteza sobre a trajetória escolar dos alunos

Por JC Publicado em 01/12/2025 às 14:25

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Em plena temporada de matrículas, quando milhares de famílias correm para garantir vagas na rede privada, a história do Colégio Semear, em Jaboatão dos Guararapes, acende um alerta essencial: verificar se a escola está credenciada pela Secretaria Estadual de Educação (SEE/PE) não é apenas um detalhe burocrático — é garantia de proteção jurídica para a trajetória escolar das crianças.

O Semear funciona irregularmente há pelo menos quatro anos, oferecendo turmas do 1º ao 5º ano do ensino fundamental sem credenciamento desde 2021, segundo o Ministério Público e decisões da 3ª Vara Cível de Jaboatão e do Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE). Mesmo assim, a escola continuou matriculando estudantes e ampliando turmas, mesmo sob notificações e inspeções técnicas.

Só em maio de 2025, quatro anos depois do início das atividades, o colégio protocolou seu primeiro pedido formal de credenciamento na Secretaria. O processo, porém, está parado por falta de documentação obrigatória.

Matrículas continuaram sendo oferecidas

A Justiça determinou que a escola pare de aceitar novas matrículas, regularize a situação ou transfira os estudantes para unidades credenciadas. Na decisão, o juiz deixou claro que protocolo de pedido de credenciamento não é autorização para funcionar, rejeitando a tese da direção de que a solicitação, por si só, bastaria para legitimar o colégio.

Apesar disso, pais relatam que o Semear segue apresentando turmas e oferecendo vagas normalmente — ignorando tanto a determinação judicial quanto a ausência de portaria da SEE. Na prática, novas famílias continuam sendo expostas ao mesmo risco enfrentado por quem já estava matriculado.

Há ainda um componente mais delicado. A situação do Colégio Dom Hélder Câmara, que emitia documentos escolares para alunos da Semear — embora eles não estudassem lá de fato. A SEE confirmou que a documentação dos estudantes era emitida pelo Dom Hélder, que “mantinha vínculo com a Escola Semear”. O problema é que o Dom Hélder fechou e “o responsável foi notificado para formalizar a extinção da escola e entregar o acervo acadêmico, o que ainda não foi realizado”.

Isso significa que crianças da Semear têm sua trajetória escolar associada a uma escola encerrada, que não entregou seu acervo à SEE — deixando alunos e famílias em um limbo documental.

Falta de documentos e orientações ignoradas

A Secretaria de Educação afirmou, em nota encaminhada ao JC, que tomou ciência da oferta irregular em outubro de 2022 e passou a adotar medidas. Há trechos importantes que ajudam a entender a gravidade:

“Desde 14 de fevereiro de 2022, a instituição vinha sendo notificada […] tendo sido, inclusive, orientada a proceder com a transferência dos estudantes”, diz o texto. “Foram constatadas pendências relativas ao Alvará de Funcionamento e inconsistências na documentação do corpo docente e dos funcionários administrativos”, continua. E complementa: “Diante da ausência de colaboração da escola para sanar as pendências, a Gerência de Normatização encaminhou denúncia ao Ministério Público.”

Mesmo assim, o pedido formal de credenciamento — etapa obrigatória para operar — só chegou à SEE em maio de 2025. E, segundo a nota mais recente (novembro):

A secretaria diz ainda que “A tramitação não pôde avançar porque a instituição ainda não apresentou a Certidão de Regularidade Fiscal Municipal, documento obrigatório […].”

Ou seja, enquanto a escola reclama de “resistência burocrática” do Estado, a SEE aponta pendências essenciais, como falta de alvará, documentação docente irregular e ausência de certidão fiscal.

A versão da escola

No processo, a direção da Escola Semear apresenta outra versão para o cenário. A instituição afirma que o problema do não credenciamento não seria por “negligência da escola”, mas por “resistência da Secretaria de Educação em aceitar o pedido”.

Segundo o agravo de instrumento apresentado ao Tribunal de Justiça, a escola alega que, ao tentar protocolar a documentação, a SEE “não recebia a documentação” ou apontava pendências que travavam o processo, impedindo a formalização do credenciamento.

A direção também argumenta que medidas como a suspensão de matrículas e a possibilidade de fechamento provocariam “dano irreparável aos alunos e profissionais”, pedindo que a Justiça revertesse a decisão. O TJPE, porém, negou o pedido e reafirmou que o funcionamento sem portaria é irregular.

Demora na resposta

Embora a Semear tenha operado sem credenciamento desde 2021 (ou 2020, segundo audiência registrada pelo MP), o Estado só adotou medidas efetivas anos depois. A SEE afirma que só teve ciência formal da irregularidade em outubro de 2022. 

Mesmo após inspeções em 2022 e nova visita técnica em 2023, a escola continuou funcionando plenamente até que o Ministério Público acionou a Justiça em 2025, obrigando o Estado a agir com mais firmeza.

O resultado dessa demora é direto, com três a quatro anos letivos completos cursados com risco de invalidação, e a situação documental dos estudantes depende de acervos que nem sequer estão disponíveis.

Atenção antes de matricular seu filho

Conferir se a escola tem portaria de credenciamento publicada pela SEE; solicitar cópia do documento; verificar alvará de funcionamento e regularidade fiscal; observar se a instituição informa claramente seu status regulatório.

Em caso de dúvida, a SEE mantém a Ouvidoria: 0800 286 8668.

O que está em jogo

O caso do Colégio Semear revela uma combinação preocupante: uma escola que operou irregularmente por anos e um Estado que demorou a agir. E o problema não é isolado. Em 2020, a própria Secretaria de Educação identificou ao menos 40 escolas particulares com funcionamento irregular na Região Metropolitana do Recife, um dado que expõe fragilidades históricas na fiscalização e na transparência das instituições privadas de ensino.

No centro dessa disputa, estão crianças que podem perder anos de estudo e pais que confiaram em uma instituição que não tinha autorização para existir. 

Enquanto o processo segue no MP e no Judiciário, permanece a pergunta que angustia as famílias. Quem vai garantir agora a trajetória escolar dos alunos que estudaram por quatro anos em uma escola sem credenciamento — e que ainda hoje continua oferecendo matrículas?

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