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Tarifaço dos EUA ameaça exportações de Pernambuco e acende alerta em cadeia produtiva do Estado

Com taxação de 50% sobre produtos brasileiros a partir de 1º de agosto, setor produtivo teme perdas, desemprego e quebra de confiança no exterior

Por Adriana Guarda Publicado em 28/07/2025 às 17:08 | Atualizado em 28/07/2025 às 17:16

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A decisão dos Estados Unidos de elevar para 50% as tarifas sobre produtos importados do Brasil, a partir de 1º de agosto, acendeu um alerta vermelho em setores estratégicos da economia de Pernambuco. Embora o Estado não esteja entre os maiores exportadores para o mercado americano em volume total, os impactos da medida, chamada de tarifaço, devem atingir diretamente cadeias produtivas importantes — como a fruticultura do Vale do São Francisco, a indústria do açúcar e as operações portuárias.

O tema foi discutido por especialistas no debate desta segunda-feira (28), na Super Manhã da Rádio Jornal, sob o comando da comunicadora Natalia Ribeiro e com participação do presidente do Porto de Suape, Armando Monteiro Bisneto, do presidente do Porto do Recife, Paulo Nery, e do gerente de Política Industrial da Federação das Indústrias do Estado de Pernambuco (FIEPE), Maurício Laranjeiras.

O clima foi de preocupação, mas com apelos por diálogo e busca de alternativas diplomáticas. “A situação é preocupante. A gente sabe da instabilidade do presidente Trump, mas também sabe que ele é um homem de negócios antes de ser político”, disse o gerente da Fiepe, Maurício Laranjeiras. “Tanto a Federação quanto a CNI acreditam que a diplomacia e a negociação são o melhor caminho”, defende. 

Açúcar e frutas

O açúcar é hoje o principal produto pernambucano exportado para os Estados Unidos, com cerca de US$ 64 milhões movimentados apenas em 2024. Cerca de 20% de todo o açúcar que sai do Porto do Recife tem como destino o mercado americano. "Há um estudo de que Norte e Nordeste sofrerão algo em torno de US$ 200 milhões na próxima safra. E Pernambuco representa em torno de 30% disso”, alertou Laranjeiras.

No setor de frutas, a preocupação maior vem de Petrolina, onde a safra da manga está prestes a ser colhida. “O pessoal já está com insumos comprados, a cera especial para lavar a manga, as caixas... Imagine se essa exportação não acontecer. Isso mexe em tudo”, disse o debatedor. A janela de exportação de frutas frescas é curta e os prejuízos podem ser imediatos.

Risco de desemprego

Segundo estimativas da FIEPE, Pernambuco pode ver impactos diretos e indiretos sobre cerca de 100 mil empregos se o tarifaço for mantido. "A indústria exportadora emprega muito bem. São empregos qualificados, com preparação técnica, principalmente para atender um mercado exigente como o americano", reforçou Laranjeiras.

Além da mão de obra qualificada, há também preocupação com os trabalhadores mais vulneráveis. “Na hora que você tem lá o pessoal que corta a cana, isso também preocupa. Está em estudo no governo, por exemplo, a criação de um auxílio, como o Chapéu de Palha, para fazer esse suporte”, adiantou Paulo Nery, presidente do Porto do Recife.

Mobilização

Os debatedores destacam que a governadora Raquel Lyra tem mantido diálogo com empresários e representantes do setor produtivo. A articulação inclui reuniões com o BNB para flexibilização de crédito e estudos para pagamento de bolsas emergenciais, caso o desemprego avance. “A governadora está preocupada em mitigar os efeitos e em ouvir todos para ter uma compreensão profunda de tudo que está acontecendo”, disse Laranjeiras.

Já a Agência de Empreendedorismo de Pernambuco (AGE) estuda o lançamento de linhas de crédito para pequenos produtores, em especial os da fruticultura.

Quebra de confiança 

Um dos efeitos mais duradouros do tarifaço, apontam os especialistas, pode ser a quebra de confiança nas relações comerciais com os EUA, tradicionalmente defensores do livre-comércio. “Esse sistema foi criado pelos próprios Estados Unidos, com Reagan nos anos 1980. Hoje, vemos uma inversão de papéis: são eles que estão se fechando”, comentou Laranjeiras.

Segundo ele, os prejuízos não serão apenas para o Brasil. “Grande parte do comércio entre os dois países se dá entre empresas do mesmo grupo. Então, a tarifa vai terminar prejudicando cadeias produtivas dos dois lados, com risco de inflação nos Estados Unidos e desemprego no Brasil.”

Diversificar mercados

Diante do impasse, os debatedores defendem que o Estado busque diversificar seus mercados e ampliar rotas de exportação. “Qualquer negócio não se sustenta com poucos clientes. Precisamos buscar mercados na Europa, Ásia, África. O Porto do Recife já planeja um roadshow para apresentar suas potencialidades no exterior”, afirmou Paulo Nery.

O Porto do Recife, segundo ele, vem recebendo investimentos relevantes, como os R$ 70 milhões da Liquiporte e os R$ 100 milhões da Fertine, maior grupo de fertilizantes do País. “Estamos centralizando a movimentação de malte, cevada e aumentando a carga de bobinas de aço. O Porto está em plena atividade”, destacou.

Esperança na negociação

Apesar da preocupação, há quem aposte em uma reviravolta. “Trump se orgulha de ser um grande negociador. Talvez essa alma de negociador apareça, mesmo que não no dia 1º, mas em algum momento”, afirmou Laranjeiras. “Ele já negociou com Canadá, Japão e Europa. O Brasil também precisa ter essa postura. E espero que haja bom senso.”

SUAPE e EUA

Durante o debate, o presidente do Porto de Suape, Armando Monteiro Bisneto apresentou números, mas alertou que os dados não deveriam ser compreendidos como uma tentativa de minimizar esse sério problema.

"Um amigo meu costuma dizer que a gente não mora na macroeconomia — a gente mora na microeconomia. Ou seja, se uma empresa vai à falência, se ela demite seus funcionários, ou se um setor inteiro é prejudicado, isso gera um problema sistêmico para a economia", disse.

Hoje, em Suape, temos uma movimentação total — somando exportação e importação — de cerca de 25 milhões de toneladas por ano. Desse total, a movimentação envolvendo os Estados Unidos representa apenas 138 mil toneladas, o que equivale a aproximadamente 0,6% do total movimentado. É menos de 1%. No entanto, isso não significa que não haverá impactos para o Estado e para o Porto.

"Atualmente, 78% da movimentação de Suape é de óleo importado. O porto importa óleo e exporta uma quantidade significativa de coque proveniente da refinaria. Então, quando olhamos para Pernambuco, vemos que o Estado ainda é, majoritariamente, um estado importador. Por isso, sua exposição em termos de exportação é um pouco menor, o que ajuda a mitigar os efeitos diretos dessa taxação. Mas seguimos atentos", conclui. 

 

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