Conheça Lénablou, coreógrafa caribenha que traz a dança Gwoka para Pernambuco
Da Ilha de Guadalupe, artista especialista na dança do Gwoka faz residência de pesquisa cultural em iniciativa da Oficina Francisco Brennand

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Em todo o continente americano, o colonialismo deixou heranças marcadas pela violência das economias açucareiras. Mas, ao mesmo tempo, gerou expressões culturais que se tornaram formas de resistência, inteligência coletiva, invenção e preservação de identidades.
Um exemplo é o Gwoka, manifestação originada na Ilha de Guadalupe, no Caribe, construída em torno de sete tambores. A música convoca ao improviso e sustenta uma dança de oscilação constante, de um corpo "que balança, mas não cai".
Para os pernambucano, a lembrança do frevo surge quase de imediato com essa descrição. Em tempo: tanto o Gwoka quanto o frevo são reconhecidos pela UNESCO como Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade.
É nesse espírito de encontro que a artista guadalupense Lénablou desembarca em Pernambuco em setembro, para realizar a residência de pesquisa e intercâmbio cultural "Entre os Mares eu Dancei".
A iniciativa integra a Temporada Brasil-França, organizada pela Oficina Francisco Brennand em parceria com o Artchipel – Scène Nationale de la Guadeloupe e a Cie Trilogie Lénablou.
Som de resistência
"O Gwoka nasceu num momento de escravidão, enquanto se cortava a cana-de-açúcar. É uma expressão que, mesmo na miséria e no suor, encontra o lugar da solidariedade e da comunidade", explicou a artista, em visita à redação do JC.
Na ilha de Guadalupe, a dança do Gwoka acontece ao longo de todo o ano, exceto na Quaresma. Curiosamente, também se faz presente em velórios, “para honrar tanto a morte quanto todos os aspectos da vida”, conta Lénablou. Para ela, “o Gwoka e o povo, sobretudo o povo negro, são uma coisa só”.
A dinâmica da dança se estrutura em roda: um dançarino ocupa o centro e pode ser substituído por outro, que o toca levemente, garantindo a fluidez da experiência coletiva.
Pontes com o Brasil
Em sua passagem pelo país, Lénablou busca aproximações entre as culturas afro-diaspóricas. “Espero encontrar o máximo possível da cultura afro-diaspórica no Brasil para comparar com a minha”, sintetiza.
O frevo, que até então conheceu apenas por vídeos, é uma das tradições que mais despertam sua curiosidade. “Nas danças afro-brasileiras, que podem ser comparadas ao Gwoka, é sobretudo a parte inferior do corpo que se movimenta: quadris, pernas, às vezes os calcanhares. Não sei se isso também se dá no frevo, mas observo que, no Brasil, o corpo dança balançando.”
Neste sábado (20) e domingo (21), a artista realiza uma atividade conjunta com Maria Paula Costa Rêgo (Grupo Grial de Dança/PE) no Paço do Frevo, no Recife Antigo. No domingo, participa também de uma conversa com o público, mediada por tradução consecutiva.
Trajetória e criação
Com mais de 35 anos de carreira, Lénablou dirige o Centro Coreográfico de Pesquisa Caribenha La Fabrik e a Cie Trilogie Lénablou. É também a criadora da Techni’ka, método de ensino e criação que parte das tradições do Gwoka para propor uma abordagem contemporânea da dança.
“Não precisei buscar nada fora, como na dança europeia. Tudo já estava ali, bastava utilizar essa base para criar. Transformei esse quadro em um trabalho para a cena, para o palco”, explica.
O La Fabrik funciona como laboratório de dança, espaço de transmissão de saberes e centro de pesquisa do Caribe francófono, recebendo artistas de diversas origens.
O percurso no Brasil
No próximo sábado (27), os resultados da residência serão apresentados ao público em uma sessão especial no Cineteatro Deborah Brennand, na Várzea. A programação terá continuidade em outubro, com a presença da Cie Trilogie Lénablou, em apresentações nos dias 16 e 18.
A artista iniciou sua temporada brasileira com uma performance na abertura da 36ª Bienal de São Paulo. Sua agenda segue até novembro, passando pela Bienal Sesc de Dança de Campinas (SP), a Bienal Internacional de Dança do Ceará, em Fortaleza; o Junta – Festival Internacional de Dança, em Teresina (PI); e o Festival de Dança de Itacaré, na Bahia.
Essa travessia coreográfica entre palcos brasileiros reforça a relevância de sua obra no cenário contemporâneo da dança. “Sou uma artista coreográfica com formação atípica e filosofia singular, que busca lançar luz sobre a estética caribenha. É natural que pesquisa e criação estejam sempre unidas na minha abordagem”, conclui Lénablou.
Confira a programação:
- 20 e 21/9 das 10h às 13h – Imersão “Balança, mas não cai: conexão Caribe-Pernambuco”, com Lénablou e Maria Paula Costa Rêgo – Oficina para estudantes e profissionais da dança, com inscrições gratuitas disponíveis no perfil @oficinafranciscobrennand no Instagram;
- 21/9, às 16h – Conversa “Desvendando Lénablou”, parte do ciclo “Desvendando Mestres e Mestras” – Aberta ao público, com inscrições gratuitas disponíveis no perfil @pacodofrevo no Instagram;
- 27/9, das 14h às 16h – Conferência com Lénablou “Entre os mares eu dancei – Guadalupe (FR) – Pernambuco (BR)”, no Cineteatro Deborah Brennand, Oficina Francisco Brennand – Inscrições gratuitas disponíveis no perfil @oficinafranciscobrennand no Instagram;
- 16/10, das 14h às 16h30 – Masterclass com a Cie Trilogie Lénablou na Oficina Francisco Brennand – Oficina para o público em geral, inscrições gratuitas em outubro.
- 18/10 – Espetáculo “Le Sacre du Sucre”, pelo 28º Festival Internacional de Dança do Recife, em parceria com a Prefeitura do Recife.