Municípios de PE correm risco de perder milhões em verbas da cultura; entenda
Cidades que não executarem o mínimo de 60% dos recursos da Política Nacional Aldir Blanc (PNAB) podem ficar de fora do próximo ciclo de repasses

Quarenta e quatro municípios de Pernambuco ainda não executaram o mínimo de 60% dos recursos da Política Nacional Aldir Blanc (PNAB), que vem destinando verbas do Fundo Nacional da Cultura, anualmente, a estados e municípios. Caso não alcancem esse percentual até o dia 30 de junho, essas cidades podem ficar de fora do próximo ciclo de repasses.
O prazo foi estabelecido em uma portaria publicada em março deste ano pelo Ministério da Cultura, com o objetivo de pressionar os municípios a utilizarem os recursos de forma efetiva, seja por meio de editais, prêmios ou outras formas de incentivo cultural.
O problema é que, até a última atualização do Painel da PNAB, no início deste mês, cerca de 26 municípios sequer começaram a utilizar os recursos financeiros. Entre eles, estão cidades com relevância econômica ou reconhecida tradição cultural, como Paulista, Paudalho, Ipojuca, Floresta, Bonito, São Lourenço da Mata e Goiana.
Se forem excluídos dos próximos ciclos, os prejuízos podem ser altos. Paulista, por exemplo, corre o risco de perder quase R$ 7 milhões ao longo dos anos. Já Ipojuca, São Lourenço e Goiana podem deixar de receber cerca de R$ 2 milhões cada - recursos que poderiam fortalecer o trabalho de artistas e espaços culturais locais.
Nazaré da Mata, por sua vez, informou que "devolveu a verba integralmente após o não uso da gestão anterior passada, mas que estará apta a receber o próximo ciclo".
Municípios abaixo dos 60%
Outros 18 municípios ainda não atingiram a marca dos 60%. Entre eles estão Olinda (2,37%), Serra Talhada (27,11%), Vitória de Santo Antão (40,78%), Carpina (53,83%), Jaboatão dos Guararapes (58,76%) e Taquaritinga do Norte (59,10%). As duas últimas, no entanto, podem já ter superado esse índice, considerando que os dados disponíveis são de início de junho.
Chama atenção o caso de Olinda, que utilizou menos de 3% dos recursos, mesmo estando na Região Metropolitana do Recife e sendo um polo cultural importante, com destaque para o Carnaval.
Os dados são do painel da Política Nacional Aldir Blanc de Fomento à Cultura.
Entenda a PNAB
Instituída pela Lei nº 14.399, de 8 de julho de 2022, a Política Nacional Aldir Blanc tem como objetivo fomentar a cultura em todo o território nacional, apoiando estados, o Distrito Federal e municípios durante cinco anos, com início em 2023.
Durante a pandemia, as Leis Aldir Blanc 1 e 2 e a Lei Paulo Gustavo mostraram que era possível estruturar um sistema federativo de financiamento à cultura, mesmo em caráter emergencial. A partir dessa experiência, surgiu a PNAB, agora com caráter permanente.
A União repassará anualmente, até 2027, R$ 3 bilhões em parcela única aos entes federativos. Esses recursos podem ser utilizados para:
- fomento, produção e difusão de obras artísticas e culturais;
- realização de projetos como exposições, festivais, festas populares, feiras e espetáculos;
- concessão de prêmios via seleções públicas;
- manutenção de cursos de formação e capacitação de agentes culturais;
- estudos, pesquisas e curadorias nas diversas áreas culturais, entre outras iniciativas.
Falta de estrutura nas gestões
Embora represente um novo momento para o setor cultural, a PNAB também escancara a falta de estrutura das administrações municipais para lidar com os recursos — especialmente no que diz respeito à agilidade exigida para a execução das verbas.
Em alguns municípios, os problemas já eram visíveis desde a Lei Paulo Gustavo. Goiana, por exemplo, executou apenas 43% dos recursos dessa lei e enviou a documentação para o novo ciclo da PNAB apenas nos últimos momentos do prazo, que termina em 12 de junho.
"O primeiro ciclo não foi executado, e o município sofre com a ausência de profissionais capacitados - tanto tecnicamente quanto juridicamente - para fazer as políticas públicas avançarem", afirma, sob reserva, uma fonte de Goiana. Ela relata ainda um problema recorrente em outros municípios:
"Há desinteresse por parte da própria comunidade artística, porque o município está engessado em uma política de balcão voltada apenas para festas. Quase todo o fundo municipal de cultura foi usado para pagar bandas e artistas desses eventos, enquanto os recursos para políticas culturais mais amplas seguem parados. Tudo é justificado com o argumento de que as festas estão no calendário oficial da cidade", destaca.
O que diz o Ministério da Cultura
Durante visita ao Sistema Jornal do Commercio de Comunicação (SJCC), no Recife, nesta segunda-feira (9), a ministra Margareth Menezes afirmou que o Ministério da Cultura "está trabalhando para que todos consigam executar a verba".
"O MinC conta com diretrizes de assistência técnica para os municípios, por meio de comitês e agentes que podem auxiliar até mesmo as cidades menores. É fundamental que cada município se estruture e saiba acessar os recursos. (...) Contamos com a parceria do Sesc para capacitar os gestores a elaborar editais e realizar cobranças", afirmou.
Governo do Estado
O Governo do Estado também pode contribuir nesse processo. A Secretaria de Cultura de Pernambuco, por meio do Núcleo de Apoio aos Municípios, informou que “tem atuado de forma contínua para apoiar as gestões municipais na implementação da PNAB”.
"Desde o lançamento da política, promovemos uma série de ações como oficinas formativas e plantões tira-dúvidas, com o objetivo de esclarecer aspectos técnicos e operacionais. Nosso compromisso é garantir que os municípios estejam preparados para executar a PNAB de forma eficiente e sensível às suas realidades. A escuta ativa e o suporte técnico têm sido fundamentais nesse processo, reafirmando o papel do Governo do Estado no fortalecimento da cultura em todos os territórios de Pernambuco."
Municípios que executaram menos de 60% dos recursos do ciclo 1 da PNAB:
- Olinda – 2,37% de R$ 2.346.696,24
- Mirandiba – 2,46% de R$ 127.997,20
- Vicência – 5,00% de R$ 226.585,62
- Catende – 15,95% de R$ 269.670,74
- Canhotinho – 17,01% de R$ 205.724,79
- Vertente do Lério – 22,21% de R$ 71.243,15
- Serra Talhada – 27,11% de R$ 677.385,35
- Lajedo – 25,78% de R$ 313.482,16
- Terezinha – 43,63% de R$ 65.077,92
- Custódia – 45,14% de R$ 302.372,96
- Vitória de Santo Antão – 40,78% de R$ 951.130,98
- Itaíba – 48,03% de R$ 263.700,83
- Cumaru – 48,63% de R$ 138.345,32
- Carpina – 53,83% de R$ 592.188,06
- Lagoa dos Gatos – 56,23% de R$ 127.448,52
- Jaboatão dos Guararapes – 58,76% de R$ 4.086.464,55
- Taquaritinga do Norte – 59,10% de R$ 208.125,97
Municípios que ainda não iniciaram a execução do ciclo 1 da PNAB:
- Paulista – 0,00% de R$ 2.300.451,72
- São Lourenço da Mata – 0,00% de R$ 798.453,16
- Ipojuca – 0,00% de R$ 716.937,17
- Goiana – 0,00% de R$ 593.622,33
- Paudalho – 0,00% de R$ 432.000,52
- Barreiros – 0,00% de R$ 325.546,36
- Bonito – 0,00% de R$ 301.057,32
- Glória do Goitá – 0,00% de R$ 244.214,02
- Nazaré da Mata – 0,00% de R$ 251.889,58
- Floresta – 0,00% de R$ 248.916,12
- Água Preta – 0,00% de R$ 236.071,75
- Macaparana – 0,00% de R$ 203.069,91
- Lagoa Grande – 0,00% de R$ 204.302,95
- Manari – 0,00% de R$ 193.501,31
- Parnamirim – 0,00% de R$ 163.111,78
- Camocim de São Félix – 0,00% de R$ 156.073,39
- Iati – 0,00% de R$ 154.574,87
- Riacho das Almas – 0,00% de R$ 175.046,94
- Jupi – 0,00% de R$ 134.858,58
- Maraial – 0,00% de R$ 90.752,94
- Santa Cruz da Baixa Verde – 0,00% de R$ 103.779,55
- Barra de Guabiraba – 0,00% de R$ 116.770,00
- Inajá – 0,00% de R$ 213.217,44
- Palmeirina – 0,00% de R$ 68.133,99
- Ibirajuba – 0,00% de R$ 68.777,06
- Granito – 0,00% de R$ 67.756,41
* Valores foram atualizados entre o final de maio e começo de junho.