Ex-diretor do Presídio de Igarassu, preso em operação, já era citado em outro inquérito da Polícia Federal
Nome de Charles Belarmino apareceu em diálogo entre detentos, por WhatsApp. Fica claro que um deles tinha contato direto e influência com ex-gestor

Indícios de esquema de corrupção envolvendo Charles Belarmino de Queiroz, ex-diretor do Presídio de Igarassu preso em fevereiro deste ano na operação La Catedral, chegaram ao conhecimento da Polícia Federal ainda no início de 2023.
A coluna Segurança teve acesso a um processo de mais de 2,3 mil páginas que detalha a investigação de uma organização criminosa especializada no tráfico de drogas com forte atuação no município de Rio Formoso, na Mata Sul de Pernambuco.
No documento, há diálogos de presidiários obtidos por meio de quebra de sigilo telefônico autorizada pela Justiça. Em uma das conversas, via WhatsApp, um detento da Penitenciária Agroindustrial São João (PAISJ), em Itamaracá, pede ao preso Márcio Gomes da Silva que interceda pela transferência dele para o Presídio de Igarassu e cita o então diretor Charles Belarmino.
Márcio é descrito pela Polícia Federal como um dos líderes da organização investigada à época e importante fornecedor de drogas para várias localidades do Recife. A investigação identificou que ele tinha contato direto com Charles e gozava de privilégios como cela privativa com televisão, sistema de som, videogame, celular, alimentação e bebidas.
A Polícia Federal descreveu que ele tinha cantina e que havia a droga skank em um freezer sob a responsabilidade dele - indicando a venda de entorpecentes no presídio.
Ainda no diálogo, o detento que pediu a transferência relatou que possuía uma cantina na PAISJ e que alugava por R$ 500 mensais, mas que o dinheiro seria pouco. "Só que 500 reais não dá para se manter por mês não, tá entendendo, meu parceiro?". Por isso, pede para ser levado para outra unidade prisional.
"Qualquer coisa eu fico aí na sua cantina aí, trabalhando pra você aí, lhe ajudando aí, tá ligado?", disse o preso para Márcio. "Fala com o seu Charles aí, pra ver se dá força a mim aí, pra eu me transferir para aí", afirmou, em outro trecho de áudio transcrito pelos investigadores.
No processo, a Polícia Federal citou que Márcio tinha o número de Charles gravado na agenda pessoal e que alguns arquivos de mídia também já haviam sido enviados entre eles, via WhatsApp.
Conforme revelado pela coluna, na semana passada, o ex-diretor escolhia quais detentos deveriam ocupar as funções de chaveiros e os que seriam responsáveis pelas cantinas no presídio. Um deles foi identificado como Edgleisson Carlos Alves dos Santos, o "Pula", descrito no inquérito como um arrecadador de dinheiro com vendas de celas e celulares e com o tráfico de drogas.
TRANSFERÊNCIAS PASSAVAM PELAS MÃOS DO EX-SECRETÁRIO, APONTA INVESTIGAÇÃO
A investigação que resultou na operação La Catedral pontuou que Charles recebia pedidos para transferência de presos e que conseguia autorizações junto ao ex-secretário executivo de Administração Penitenciária e Ressocialização, André de Araújo Albuquerque, preso no último dia 8 de abril na segunda fase da operação.
A investigação aponta que André "autorizava a transferência de presos lucrativos para o esquema de corrupção para o Presídio de Igarassu". Ele foi filmado, em 6 de setembro de 2024, guardando maços de dinheiro em uma sacola na sala da diretoria da unidade prisional. O vídeo teria sido gravado por Charles, que também estava no ambiente e chega a entregar parte da quantia ao superior.
Charles exerceu o cargo de diretor do Presídio de Igarassu de 1º de abril de 2016 até dezembro de 2024, quando foi exonerado em meio ao avanço da investigação da Polícia Federal. André perdeu o segundo maior cargo do sistema prisional pernambucano no mesmo dia. Desde o governo Paulo Câmara, ele ocupava posições de chefia.
As defesas dos suspeitos não foram encontradas para comentar as investigações.
Em nota, a Secretaria Estadual de Administração Penitenciária e Ressocialização declarou que "não compactua com quaisquer atos ilícitos dentro do sistema prisional de Pernambuco, nem com desvios de conduta por parte de seus servidores".