SISTEMA PRISIONAL | Notícia

Carta revela esquema de venda de 'imóveis' por até R$ 80 mil no Presídio de Igarassu

Transferido para presídio federal, Lyferson Barbosa da Silva escreveu mensagem ao irmão para que vendesse espaços que estavam sob o domínio dele

Por Raphael Guerra Publicado em 09/04/2025 às 9:39 | Atualizado em 09/04/2025 às 9:41

Novas provas descobertas pela Polícia Federal confirmam o tamanho do abandono do Estado e o forte poder que detentos exerciam no Presídio de Igarassu, localizado no Grande Recife. Espaços da unidade prisional, chamados por muitos de "imóveis", eram comercializados por altos valores em dinheiro - sob a conivência de agentes públicos. 

Denúncias de venda de celas são antigas no sistema prisional de Pernambuco. Mas agora a Polícia Federal teve acesso a uma prova material do esquema: uma carta escrita pelo presidiário Lyferson Barbosa da Silva, que cumpre pena na Penitenciária Federal de Campo Grande, no Mato Grosso do Sul. 

No texto endereçado ao irmão, Lyferson pede que sejam vendidos os três "imóveis" que estavam sob o domínio dele no Presídio de Igarassu, por valores entre R$ 60 mil e R$ 80 mil. Uma das suítes, consideradas de luxo, tinha uma TV de 80 polegadas, segundo investigadores ouvidos pela coluna Segurança

O presidiário foi transferido da unidade pernambucana para uma federal no ano passado, após a descoberta do envolvimento dele no esquema de corrupção em Igarassu.

Com acesso a celulares e Iphone, Lyferson enviava mensagens de WhatsApp ao então diretor, Charles Belarmino de Queiroz, e a outros policiais penais solicitando a entrada de drogas, bebidas, comidas e garotas de programas, além de autorizações para festas. Em troca, realizava transferências em dinheiro via Pix e comprava comidas para os agentes públicos. 

O esquema de corrupção foi descoberto justamente a partir da apreensão de um celular com o presidiário, que exercia uma forte liderança no pavilhão onde cumpria pena.

Preso por participação no assassinato do médico médico Artur Eugênio de Azevedo, de 35 anos - crime ocorrido em 12 de maio de 2014, em Jaboatão dos Guararapes -, Lyferson também é líder de uma organização criminosa especializada no tráfico de drogas e com forte atuação no município de Rio Formoso, no Litoral Sul de Pernambuco.

A investigação da Polícia Federal identificou ainda que havia um laboratório para fabricação de drogas onde deveria ser um espaço cultural no Presídio de Igarassu. Os entorpecentes eram vendidos na unidade e também em outras cidades do Estado. 

REPRODUÇÃO
Espaço cultural do Presídio de Igarassu era usado para fabricação de drogas - REPRODUÇÃO

Lyferson chegou a ordenar, em 2023, ataques à sede do Detran, a escolas e até hospital no Estado. Segundo a investigação, ele estaria insatisfeito com decisões da Secretaria de Defesa Social e queria provocar a desordem para que a cúpula fosse substituída.

Um diálogo identificou a ordem dada por ele a um comparsa para os ataques a repartições públicas, além de "incendiar veículos e assassinar pessoas inocentes".

OPERAÇÃO LA CATEDRAL

Na primeira fase da Operação La Catedral, que apura o esquema de corrução no Presídio de Igarassu, a Polícia Federal prendeu o ex-diretor Charles e outros sete policiais penais. Já nessa terça-feira (8), o alvo foi André de Araújo Albuquerque, ex-secretário executivo da Administração Penitenciária e Ressocialização de Pernambuco. 

Segundo a investigação, o ex-gestor recebia participação nos lucros obtidos por meio do esquema ilegal no presídio. Ele foi preso na residência onde mora, no bairro do Prado, na Zona Oeste do Recife. No local, foram apreendidos arma funcional, celulares e uma caminhonete Amarok.

Mensagens encontradas em celulares de policiais penais presos na primeira fase da operação, em 25 de fevereiro, apontaram que os servidores fraudavam documentações para antecipar a progressão de pena para presos. A quantidade de beneficiados ilegalmente ainda está sendo apurada.

André e Charles foram exonerados dos cargos em dezembro do ano passado, em meio ao avanço das investigações da Polícia Federal. Na hierarquia, André era considerado o braço direito de Paulo Paes, titular da Secretaria de Administração Penitenciária e Ressocialização (Seap). 

Em nota enviada pela assessoria, a Seap declarou que "não compactua com quaisquer atos ilícitos dentro do sistema prisional de Pernambuco, nem com desvios de conduta por parte de seus servidores".

As investigações da PF continuam, com a possibilidade de novas fases da operação para prender mais envolvidos no esquema criminoso.