Médicos e redes sociais: congresso de endocrinopediatria inova ao mostrar que comunicação digital também integra o cuidado
Profissionais discutem ética e estratégias para transformar informação científica em conteúdo acessível nas redes, sem abrir mão das normas do CFM
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Em um cenário em que a presença digital tornou-se parte essencial da prática médica, o debate sobre ética, linguagem e responsabilidade nas redes sociais começa a ocupar lugar de destaque nos congressos científicos.
O 16º Congresso Brasileiro Pediátrico de Endocrinologia e Metabologia (Cobrapem), que terminou neste sábado (15), no Recife, dedicou momentos de discussão sobre o papel das redes sociais e da inteligência artificial na rotina do médico.
As mídias despontaram não como instrumento de autopromoção, mas como ferramenta de educação em saúde e de diálogo responsável com a sociedade, em conformidade com as normas do Conselho Federal de Medicina (CFM).
O tema da comunicação médica nas redes sociais desperta cada vez mais interesse e também preocupação. O CFM tem reforçado que a exposição profissional deve obedecer a princípios éticos, evitar sensacionalismo e sempre basear-se em evidências científicas.
Ao incluir essa pauta em na programação, o Cobrapem sinaliza uma mudança de paradigma: a comunicação passou a ser reconhecida como mais uma competência médica, desde que exercida com responsabilidade e propósito educativo.
Mais do que conquistar seguidores, trata-se de aproximar a ciência da vida real, com clareza, empatia e ética.
Médico como criador de conteúdo
Com quatro horas de duração, a mesa-redonda 'Redes sociais: estratégias para a conectividade e o crescimento profissional' trouxe debates que incluíram o papel do médico como criador de conteúdo, formas de se posicionar nas redes sociais com eficiência e ética e inteligência artificial a favor do médico criador.
O desafio de transformar conteúdos técnicos em vídeos envolventes e éticos foi o destaque da aula do médico André Manoel. Ao mostrar como o especialista deve fugir do formato tradicional de aulas expositivas e vídeos estáticos, o palestrante apresentou estratégias práticas para que médicos comuniquem ciência de forma acessível, sem abrir mão da credibilidade.
"A rede social é sobre o outro", destacou André Manoel, ao reforçar que a produção de conteúdo médico deve priorizar a entrega de valor e a educação do público, e não apenas a visibilidade profissional.
A armadilha do vídeo monótono
Segundo o palestrante, muitos profissionais ainda caem na armadilha dos vídeos monótonos: fundo branco, postura neutra e tom de voz uniforme. Esse tipo de conteúdo, apesar de tecnicamente correto, não desperta atenção, especialmente entre as novas gerações, mais acostumadas a estímulos rápidos e formatos dinâmicos.
O segredo, de acordo com André Manoel, está em autenticidade, constância e identificação com o público. Lidar com redes sociais, segundo o médico, é como lidar com uma doença crônica: há períodos de entusiasmo e fases de desânimo.
O importante é manter o compromisso com a comunicação científica e com a consistência do conteúdo, mesmo quando os resultados demoram a aparecer.
"Não é sobre ser famoso; é sobre ser útil", salientou André Manoel.
Definir um formato favorito
O primeiro passo para uma presença digital sustentável é escolher um formato de vídeo preferido. Isso cria identidade, otimiza o processo de gravação e ajuda na constância das publicações.
André Manoel apresentou uma "escala de ousadia" para orientar os médicos na escolha do formato ideal:
- Menos ousados: análise de artigos científicos comentados de forma acessível, com o estudo visível ao fundo.
- Ousadia média: apresentação de casos clínicos reais, com linguagem adaptada ao público leigo, ou histórias de pacientes que transmitam emoção e empatia.
- Formatos de impacto rápido: vídeos curtos, com trilha sonora popular e textos fortes na tela. Apesar do apelo mais direto, exigem cuidado redobrado para manter a coerência ética e científica.
- Mais ousados e trabalhosos: roteiros com takes encadeados e vlogs do dia a dia médico, desde que tragam algum aprendizado.
"Mesmo quando o vídeo é pessoal, ele precisa entregar valor ao público", reforçou o médico.
Ângulos, iluminação e ambientação
A estética visual também foi abordada como parte do processo de comunicação. Para evitar a sensação de rigidez, André Manoel sugeriu variar ângulos e iluminação.
Em vez de gravar sempre de frente, vale testar planos superiores, laterais ou diagonais. Uma técnica prática é usar a chamada "regra do canto da parede", que consiste em posicionar-se em um canto do ambiente (e não diante de uma parede chapada) para criar sensação de profundidade.
A iluminação deve ser indireta e lateral, a fim de evitar reflexos em óculos e sombras duras. Pequenos ajustes, segundo o palestrante, podem transformar completamente a qualidade de um vídeo e a percepção de profissionalismo.
TikTok pode ter conteúdo educativo de qualidade
O médico também chamou atenção para a oportunidade que o TikTok representa para profissionais de saúde. A plataforma, que já rivaliza com o Google como fonte de busca, tem atraído públicos de todas as idades, inclusive pacientes acima de 60 anos.
"Hoje, muitos pacientes chegam ao consultório porque viram um vídeo curto e educativo no TikTok", observou André Manoel. Isso demonstra que o conteúdo de saúde tem alcançado novos públicos e que o papel do médico comunicador vai muito além do marketing pessoal.