IMIP oferece nova esperança para crianças com cardiopatias congênitas
Ação em parceria com o projeto global Little Heroes no Recife beneficia pequenos pacientes com tratamento para a persistência do canal arterial

As crianças com persistência do canal arterial (PCA), condição que representa de 5% a 10% das anomalias cardíacas congênitas, necessitam de tratamento o quanto antes. Entre os principais procedimentos, está o fechamento por cateterismo, no qual o médico instala um dispositivo para fechar o canal que conecta a aorta à artéria pulmonar.
Na última semana, o Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira (IMIP), em parceria com o projeto global Little Heroes, da Abbott, realizou um mutirão de cardiologia pediátrica para atender 15 crianças diagnosticadas com a persistência do canal arterial.
O que é a persistência do canal arterial?
A persistência do canal arterial (PCA), ou canal arterial patente, é a permanência de uma conexão vascular que existe normalmente durante a vida fetal. A cardiologista pediátrica Juliana Neves, especialista em intervenção em cardiopatia congênita do IMIP, explica: "O canal arterial é uma veia que todo bebê tem dentro da barriga da mãe, ela é normal intra útero".
Durante a gestação, essa conexão é essencial, pois o pulmão do feto não recebe grande volume de sangue. O canal arterial permite que o sangue oxigenado da placenta chegue ao corpo do bebê, desviando-o dos pulmões.
“Depois que o bebê nasce, essa veia tende a fechar, porque o bebê dentro da barriga não respira, o pulmão não recebe tanto sangue. Então esse canal precisa fazer a passagem do sangue do pulmão do feto para o corpo. O sangue que vem da placenta precisa ir para o corpo do bebê”, explica a médica.
Após o nascimento, esse canal perde a utilidade, uma vez que a criança pode respirar. Esse fechamento ocorre espontaneamente nas primeiras 10 a 15 horas de vida, podendo se completar em até três meses para recém-nascidos de tempo regular.
Se não fecha, passa a ser considerado uma doença. A PCA é significativamente mais comum em bebês prematuros, especialmente aqueles com peso inferior a 1.750g ao nascer.
Sintomas da persistência do canal arterial
Os sintomas da PCA variam conforme o tamanho da abertura. Um canal pequeno pode não causar sintomas. No entanto, um canal maior pode causar um desvio significativo de sangue da aorta para a artéria pulmonar.
Em prematuros com desvio significativo, a PCA pode levar à:
- insuficiência cardíaca;
- exacerbação de doença pulmonar da prematuridade;
- sangramento pulmonar;
- insuficiência renal;
- intolerância alimentar;
- e até mesmo enterocolite necrosante, doença grave caracterizada por inflamação e necrose da mucosa intestinal.
Juliana Neves detalha o impacto em bebês: "Em bebês, especialmente os prematuros, esse excesso de sangue nos pulmões pode atrapalhar o desenvolvimento, tornando o pulmão mais úmido e impedindo que o bebê saia rapidamente do ventilador".
Em crianças maiores, a persistência do canal arterial sem tratamento pode ter consequências de longo prazo. A cardiopediatra explica que o pulmão fica repleto de líquido e mais úmido, levando a problemas como dificuldade de crescimento e infecções respiratórias de repetição. Essas crianças podem apresentar limitações nas atividades físicas, como dificuldades para brincar.
Um risco adicional é a endarterite, uma infecção no vaso causada por bactérias que se alojam no canal arterial, muitas vezes relacionada a maus hábitos de higiene bucal ou outras infecções.
"Essa, sim, é uma doença grave", alerta Juliana, enfatizando que um sopro cardíaco, que indica turbulência do sangue, pode apontar para a necessidade de fechamento do canal. A longo prazo, o excesso de sangue nos pulmões pode resultar em hipertensão pulmonar, uma doença grave, mesmo que o canal permaneça despercebido até a idade adulta.
O diagnóstico da PCA é sugerido pelo exame clínico, com a ausculta de um sopro contínuo, que pode ser descrito como um "som em locomotiva". O ecocardiograma é o exame fundamental para confirmar o diagnóstico da PCA.
Tratamento
O tratamento da PCA varia conforme a idade do paciente. Para recém-nascidos a termo e crianças mais velhas, o tratamento de escolha tornou-se o fechamento por cateterismo.
"É um procedimento minimamente invasivo, que é feito com sedação na maioria das vezes, não precisa de anestesia geral", descreve Juliana Neves. Um cateter insere um dispositivo de oclusão para fechar o canal.
A grande vantagem desse método é a curta internação hospitalar. "As crianças ficam internadas de um dia para o outro. No dia seguinte todos podem ter alta, é um procedimento de internamento curto", informa a médica. Após a alta, o acompanhamento dura cerca de um ano.
“Depois de um ano, com o canal arterial fechado, essas crianças são consideradas curadas", afirma a especialista. A cirurgia tradicional, com corte nas costas, ainda é uma opção quando a anatomia do canal não é favorável ao cateterismo.
Diagnóstico precoce
A cardiopatia congênita pode ser suspeitada em qualquer fase da infância. A maioria dos diagnósticos ocorre a partir da ausculta de um sopro cardíaco por um médico.
"O sopro é o som que o sangue faz por algum defeito do coração, que permite uma formação de uma turbulência no sangue. Isso gera um barulho que nós chamamos de sopro e a partir do sopro é que se solicita o exame específico para o diagnóstico que é o ecocardiograma", explica Juliana Neves.
Além do sopro, outros sinais que os pais devem observar incluem dificuldade em ganhar peso, infecções respiratórias de repetição e cianose (coloração arroxeada nos lábios ou palma das mãos). A cardiologista orienta que, ao identificar esses sinais, os pais procurem atendimento médico.
"Os pais devem procurar o posto de saúde mais perto da sua casa. O posto de saúde, através da identificação desses sinais, solicita um encaminhamento para um ambulatório de cardiologia, e essas crianças são direcionadas para o IMIP".
Idealmente, o diagnóstico pode ocorrer ainda na gestação. É fundamental que todas as gestantes realizem um pré-natal adequado, incluindo um ultrassom morfológico que avalie o coração fetal.
Em caso de suspeita, um ecocardiograma fetal, realizado por um cardiologista fetal, é indicado. Gestantes com diabetes, histórico familiar de cardiopatia congênita ou gestações gemelares devem fazer o ecocardiograma fetal diretamente.
Mutirão no IMIP
Apesar de o tratamento percutâneo ser o padrão ouro globalmente, o SUS ainda oferece materiais desatualizados para o procedimento, como molas de oclusão que não são mais importadas para o Brasil.
Entre as crianças beneficiadas está Alice de Gomes de Moura Brito, de 11 anos. Diagnosticada com sopro desde recém-nascida, Alice esperou por quase uma década para seu procedimento.
Sua cirurgia, agendada em 2015, foi cancelada por conta de uma gripe, e seu irmão, Gabriel, acabou realizando o procedimento em seu lugar. Após anos de espera e adiamentos, Alice finalmente teve a oportunidade de corrigir a cardiopatia congênita.