Literária | Notícia

A carta de Carrero ao mundo

Romancista consagrado e formador de escritores, Raimundo Carrero lança novela na Academia Pernambucana de Letras nesta segunda-feira

Por Fábio Lucas Publicado em 20/09/2025 às 22:43 | Atualizado em 20/09/2025 às 22:50

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Redigido em nove meses, publicado em pouco menos de 80 páginas pela Record, a novela que compõe o novo livro de Raimundo Carrero, “A vida é traição” ganha novo evento de lançamento nesta segunda, no Recife. A Academia Pernambucana de Letras (APL) recebe o imortal e sua obra, para conversa com a escritora e professora Conceição Rodrigues e sessão de autógrafos, a partir das 3 da tarde.
Mestre formador de vários escritores e escritoras que passaram por suas oficinas literárias – como Cecita Rodrigues – Carrero considera esta sua “carta ao mundo”. Para Cristhiano Aguiar, no texto da orelha, a obra oferece uma poesia “espinhosa, desafiadora e recompensadora” com “olhar de ave faminta” na história de Solano, o protagonista que, na infância, deseja a morte da mãe, e quando a mãe morre, é abatido pela culpa.
O título é inspirado por Ariano Suassuna, lembrado em trecho de “O santo e a porca” na epígrafe: “A vida é traição. Uma traição contínua. Traição nossa a Deus e aos seres que mais amamos. Traição dos acontecimentos a nós, dentro do absurdo de nossa condição, pois, de um ponto de vista meramente humano, a morte, por exemplo, não só não tem sentido, como retira toda e qualquer possibilidade de sentido à vida”. E também por Manuel Bandeira, do “Momento num café”, quando se lê: “Este sabia que a vida é uma agitação feroz e sem finalidade/ Que a vida é traição”.
O grande escritor não trai sua vocação. E segue colhendo leitores que se lançam à vida literária com seus livros, palavras, voos famintos e espinhos nas mãos.

 

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O olhar de Germana Accioly em crônicas - Divulgação


A esperança não recebe visitas

Reunindo crônicas escritas nos últimos quatro anos, a jornalista Germana Accioly lança “A esperança não recebe visitas” no próximo dia 14 de novembro, na Casa Estação da Luz, em Olinda. A apresentação é de Luiz Henrique Gurgel, e o texto da orelha vem assinada por Eury Donavio. A obra, publicada pela Mirada, já pode ser adquirida na pré-venda, através do site www.selomirada.com.br.


Clarice na livraria

A escritora Clarice Freire é a convidada especial do Clube do Livro Tô Lendo Brasil, neste domingo, 21. Os participantes leram e vão conversar com a autora sobre sua obra “Para não acabar tão cedo”, publicada pela Record. A partir das 10h da manhã, na Livraria do Jardim, no Recife.


Tolkien na sala de aula

A escritora, tradutora e arte-educadora Rosana Rios conversa sobre a obra de J. R. R. Tolkien, autor de best-sellers como “O senhor dos anéis” e “O Hobbit”, como ferramenta em sala de aula, nesta segunda, 22, em atividade online. O acesso é pelo Youtube da HarperCollins, a partir das 18h30.


Ateliê EnvelheCER

Um mergulho na criatividade através da poesia e da escrita, é o que propõe a escritora, psicóloga e arteterapeuta Raiza Figuerêdo, na oficina para mulheres com 60 anos de idade ou mais, que acontece nesta quarta, 24, no Recife, a partir das 7 da noite. Informações e inscrições no Instagram @raizafigueredo.psi.

 

Carolina Chediak
A romancista Julia Barandier - Carolina Chediak


Consigo inventar tudo

Segundo romance de Julia Barandier, “Consigo inventar tudo” terá noite de lançamento nesta quarta, 24, em São Paulo. Publicado pela Diadorim, com texto da orelha assinado por Paulo Henriques Britto, a obra apresenta uma “ficção sofisticada, escrita em várias camadas”, segundo ele. Os autógrafos serão na Livraria da Tarde, a partir das 19h.

 

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José Fernando dos Santos estará na Livraria do Jardim - Divulgação


Lar abrigado

Será na Livraria do Jardim, no Recife, o lançamento de “Lar abrigado – Reforma Psiquiátrica e família entre mulheres com transtornos mentais”, de José Fernando dos Santos. O livro resulta de pesquisa feita no Hospital da Tamarineira, com o objetivo de “compreender os impactos da reforma psiquiátrica no Brasil e o papel da família e das políticas públicas nesse processo”. Na quarta, 24, a partir das 7 da noite.


Festa capixaba

A Festa Literária Internacional Capixaba (Flinc) acontece de 10 a 12 de outubro no Parque Cultural Casa do Governador, em Vitória, no Espírito Santo. O evento é realizado pela Letra Preta – Escrita e Imaginações, e pelo Ministério da Cultura através da Lei Rouanet. Saiba mais no Instagram @flinc.oficial.


Chamada Litteralux

A editora Litteralux abre chamada de originais na terça, 23, e recebe os textos até 3 de novembro. Os livros selecionados em romance, crônica, poesia e conto serão programados para publicação no primeiro semestre de 2026. O resultado sobre os aprovados sai no início de dezembro. Outras informações no Instagram @editoralitteralux.


A vergonha de publicar

Em “A era das cartas”, publicado pela Editora UFMG com tradução de Laura Taddei Brandini, Antoine Compagnon diz: “Não há escritor digno desse nome sem um pouco de bobagem, suficientemente para vencer a discrição, para encarar a vergonha ligada ao fato de publicar”.

 

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Silviano Santiago escreveu "Uma literatura nos trópicos" - Divulgação
 

 

A estética garbancera

Artigo por Wellington de Melo, escritor, professor e editor.

No México do século XIX, chamavam-se garbanceras as mestiças que, ao vestirem-se à moda europeia, imaginavam conquistar distinção. Ao contrário, tornavam-se alvo de riso. Diego Rivera eternizou essa figura em sua Catrina: elegante, mas deslocada, símbolo daquilo que nunca chega a ser aceito por inteiro.
Essa imagem serve para iluminar nossa situação estética contemporânea. Não é só a crítica literária que opera com critérios estrangeiros; nós mesmos — leitores, professores, escritores — já sentimos segundo uma sensibilidade moldada por regras alheias. Quando julgamos se Torto arado ou uma narrativa popular “é ou não literatura”, aplicamos os cânones de Aristóteles, de modelos europeus, como se estivessem no DNA de todo texto bom. Nossa estética já vem colonizada: nós desejamos, sentimos e avaliamos com uma régua que não nos foi originalmente desenhada.
O termo “garbancera” não nasce em Rivera, mas no universo satírico dos impressos populares de José Guadalupe Posada e da oficina de Antonio Vanegas Arroyo, por volta de 1912–1913. “Calavera garbancera” nomeava, de modo pejorativo e marcadamente classista e misógino, mulheres de origem indígena que, empoadas e “à francesa”, negariam suas raízes para aparentar europeização. É essa figura que mais tarde Rivera rebatiza como Catrina em Sueño de una tarde dominical en la Alameda Central, deslocando-a do alvo de escárnio para ícone nacional — um caso exemplar de ressignificação: do riso contra as “garbanceras” à alegoria ampla da morte e da identidade mexicana.
É justamente esse dilema que Silviano Santiago, em "Uma literatura nos trópicos", chama de “entre-lugar”: a posição paradoxal da cultura latino-americana, que cria no atrito, no empréstimo, no deslocamento. Não somos apenas repetidores de moldes europeus, nem tampouco inteiramente autônomos. Nossa sensibilidade se forjou nesse espaço ambíguo, e é por isso que tantas vezes nos vemos julgando com categorias que não nasceram de nós, mas que já se entranharam em nosso sentir.
Dito isso, o fato de eu, enquanto leitor, autor e crítico, pessoalmente não apreciar o resultado de "Torto arado", de Itamar Vieira Júnior, não invalida o livro. Talvez fale mais de minha própria sensibilidade atravessada, ainda eurocêntrica, ainda muito presa a certos critérios de verossimilhança e forma, do que de qualquer defeito intrínseco da obra. Reconhecer esse viés é parte do trabalho de descolonizar o olhar: aprender a suspender a régua alheia para ouvir outras poéticas em seus próprios termos.
A metáfora da garbancera, portanto, não denuncia apenas a crítica que insiste em categorias estrangeiras, mas a nós mesmos, que seguimos desejando vestir a roupa do outro. Enquanto não ousarmos criar nossas próprias medidas — estéticas, sensíveis, conceituais —, continuaremos a rir ou a chorar com a régua de outrem. E talvez sejamos nós, como as garbanceras de Rivera, a caricatura mais fiel da nossa própria incapacidade de assumir uma pele própria.

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