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Brasil tem geração de energia em excesso, mas benefícios não chegam para o consumidor que sofre até com bandeira vermelha

Para consultor em energia, oferta de subsídios gerou disputa de espaço no setor elétrico que exigiu bilhões em investimentos que acabou no consumidor

Por Fernando Castilho Publicado em 01/09/2025 às 8:00

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Em julho de 2025 a capacidade instalada no Brasil correspondeu a 215 GW, sendo 16% de geração eólica e 28% de geração solar, num total de 44% dessas duas fontes.

É um número importante considerando que a carga média anual estimada (2025): 83,2 GW médios representa o consumo efetivo de energia elétrica ao longo do tempo.

Até porque a carga máxima registrada em dias de pico, no Sistema Interligado Nacional (SIN) pode ultrapassar 100 GW de demanda instantânea.

Mas a robustez dos números revelam um problema. Os produtores de energia renovável enfrentam cada vez mais problemas para despachar a energia que estão produzindo e que são capazes de produzir porque o sistema que se viu não tem condições de absorver tanta energia.

Esse não despacho de energia tem um nome Curtailment que é a redução ou o corte da produção quando a geração excede a capacidade de consumo ou transmissão do sistema. Na prática, um enorme desperdício de energia limpa.

 

No dia 10 de agosto o Curtailment foi aplicado quando Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) precisou tomar uma decisão drástica. Desligar toda a geração eólica e solar centralizada despachada pelo ONS precisou ser desligada para manter o equilíbrio do sistema em 60Hz.

E essa atitude vem provocando intensos debates no setor que cresceu ancorado em subsídios que agora se revelaram excessivos.

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Reive Barros, diretor da Acropólis Energia e coordenador do evento, - Divulgação

O professor Reive Barros, ex-presidente da EPE consultor de várias empresas além de ser o coordenador técnico da Conferência Ibero-Brasileira de Energia (CONIBEN) , um seminário internacional que reúne em Lisboa anualmente especialistas do Brasil, Portugal e Espanha, avalia que vivemos uma espécie de guerra de subsídios.

Segundo ele, o crescente nível de subsídios incentivou a instalação, principalmente a GD, e principalmente a carga reduzida levaram o operador do sistema para controlar o sistema e fazer os cortes de geração das fontes com despacho centralizado.

Reive Barros esclarece: Não existe falta de geração, e sim a falta de carga, o que se observa é uma guerra de subsídios que levaram a uma sobre oferta de energia e consequentemente, a necessidade de corte de geração.

Em outras palavras. No Brasil existe uma sobre oferta de energia, com um crescimento exponencial da MMGD (residencial, comercial, rural) da ordem de 42,1 GW instalados. MMGD é a sigla usada no setor elétrico para Micro e Minigeração Distribuída (MMGD).

Os alertas do consultor são objeto de preocupação do ONS que reconhece que ele representa um avanço importante para a diversificação e sustentabilidade da matriz elétrica brasileira.

Mas que impõe novos desafios para a operação diária, sobretudo relacionados à previsibilidade e à disponibilidade total dessas fontes ao longo do dia.

Reive Barros lembra que a expansão dos subsídios ocorreu a partir de 2010, com a participação nos leilões de energia que passaram a incluir fontes alternativas, como a eólica, com condições especiais. Isso impulsionou fortemente o setor. Mas isso acabou reverberando para o consumidor regulado (que tem sua energia fornecida por uma distribuidora) que acabou pagando esse subsídio através da Conta de Desenvolvimento Energético-

Criada em 2002, a CDE passou a incorporar também subsídios para fontes renováveis. Em 2013, com a Lei nº 12.783, seus objetivos foram ampliados, incluindo amortizações financeiras e modicidade tarifária.

Mas segundo o coordenador técnico do Coniben que este ano será realizado nos dias 27 e 28 de novembro, no período de 2020–2024, os subsídios cresceram exponencialmente, com descontos na conexão de usinas eólicas e solares.

Em 2024, os incentivos às renováveis representaram cerca de R$48 bilhões. Foi o coroamento do programa de subsídio uma vez que a geração solar entrou oficialmente nos leilões em 2014, e desde então tem ganhado destaque pela sua competitividade e queda nos custos.

O problema cresceu quando em 2012 a Resolução Normativa 482 da ANEEL, permitiu que consumidores gerassem sua própria energia e compensassem o consumo com créditos, inaugurando a geração distribuída no país. Foi quando nasceu a Micro e Minigeração Distribuída (MMGD).

Incentivos financeiros e fiscais com linhas de financiamento com juros reduzidos: BNDES, Banco do Brasil, Caixa e cooperativas de crédito oferecem mais de 100 linhas ativas para residências, empresas e produtores rurais.

Para Reive Barros a isenção de impostos em muitos estados com isenção de ICMS para equipamentos solares; o governo federal zera IPI, PIS/Cofins e Imposto de Importação para painéis solares até 2026 potencializou a crise.

Ele tem razão. Através do Crédito rural e Plano Safra: Produtores rurais passaram a ter acesso facilitado a financiamento para energia solar, com apoio do Banco do Nordeste (FNE Sol), Banco da Amazônia (FNO) e outros. E se consolidou em 2018, quando foi definida a Política Nacional de Energia Solar Fotovoltaica, com foco em ampliar o uso da fonte por meio de linhas de crédito e incentivos fiscais.

Segundo dados do ONS, hoje o Sistema Integrados Nacional tem um parque de energias renováveis (Solar, Eólica e MMGD) de 93.924,7 MW que corresponde a 38,7% do total. E nesse número a MMGD foi a que mais cresceu, chegando a 17,6% do total.

Isso aconteceu em menos de uma década. Segundo o ONS a pena das MMGD tem previsão de chegar a 65.138 MW (24,2%) em 2029 devendo superar a eólica e solar em parques de geração cuja previsão é de 36.128 MV.

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Parques eólicos sem geração garantida - Divulgação

Toda essa energia precisa ser transmitida e a pressão para que o governo faça mais investimentos em linhas de transmissão cresceu com os mais diversos argumentos da geração de hidrogênio ao suporte a Data Centers que o Brasil deseja se tornar um player global até 2030.

Para Reive Barros a ampliação do sistema de transmissão é muito importante para atender ao crescimento vegetativo das cargas e a implantação de novos projetos de geração. Mas não pode ser considerado a causa principal dos cortes de geração, esse é o único produto que mesmo sem cliente existe uma grande pressão para o aumento da oferta.

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