Intervalo Bíblico: Simpere afirma que projeto ameaça princípio constitucional do Estado laico; Seduc avaliará aplicação da proposta no Recife
Com o projeto, os estudantes da rede municipal do Recife vão poder orar, ler textos religiosos, cantar ou meditar, durante o recreio

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O Sindicato Municipal de Professores e Professoras do Recife (SIMPERE) se posicionou contra a aprovação do Projeto de Lei nº 205/2024, que institui a prática conhecida como “intervalo bíblico”, e espera que o prefeito do Recife, João Campos, vete a proposta.
O PL, aprovado na Câmara Municipal do Recife na última terça-feira (2), garante que “os alunos poderão se reunir e professar sua fé no horário de intervalo escolar, sem prejuízo na grade curricular”, conforme o artigo 3º da proposta. Isso significa que, durante o recreio, os estudantes poderão orar, ler textos religiosos, cantar ou meditar — assim como outros colegas jogam bola ou frequentam a biblioteca.
De acordo com representantes da categoria, a proposta "abre brechas para o privilégio de determinadas crenças em espaços públicos, colocando em risco o princípio constitucional do Estado laico". Em nota, o SIMPERE defende que a escola pública deve ser um espaço plural, democrático e acolhedor, onde a diversidade cultural, étnica e religiosa seja respeitada, sem a imposição de uma fé específica.
Ações de caráter transversal
Outro ponto criticado pela entidade diz respeito ao artigo 2º, que obriga escolas públicas e privadas a desenvolverem atividades extracurriculares relacionadas à diversidade religiosa e cultural.
Os temas previstos incluem: liberdade de crença e culto; combate ao racismo; importância histórica dos povos indígenas; tradição judaico-cristã; laicidade do Estado; consequências da intolerância religiosa; e crenças de comunidades tradicionais.
No entanto, o texto não menciona, por exemplo, as religiões de matriz africana. "Ao permitir manifestações religiosas durante o recreio e prever ações pedagógicas sobre diversidade religiosa sem uma garantia real de equidade, o projeto reforça um cenário de proselitismo, contrariando o caráter laico do Estado brasileiro, estabelecido há mais de 130 anos", criticou o SIMPERE.
"A laicidade é uma proteção fundamental para a liberdade religiosa de todas as pessoas: ela garante que ninguém seja discriminado ou excluído por sua fé, e que o espaço público pertença a todos", conclui a nota.
Secretaria de Educação irá analisar a melhor maneira de garantir o que foi proposto
A coluna Enem e Educação entrou em contato com a Secretaria de Educação do Recife para questionar o posicionamento da pasta em relação aos "intervalos bíblicos" e à ausência, no texto do projeto, de menções a outras religiões — como as de matriz africana — nas ações extracurriculares ou complementares.
Em resposta, enviada nesta quarta-feira (4), a Seduc informou, por meio de nota, que reafirma seu compromisso com uma educação pública de qualidade, inclusiva e pautada no respeito à diversidade cultural e religiosa, conforme previsto na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/1996).
"A Secretaria entende que a escola deve ser um espaço seguro, plural e acolhedor, reforçando o compromisso com a liberdade religiosa, a laicidade do ensino público e a formação cidadã como pilares fundamentais para uma educação democrática e inclusiva. Após a sanção do Projeto de Lei nº 205/2024, a Secretaria de Educação irá analisar a melhor maneira de garantir o que foi proposto", concluiu a nota.