Crianças e adolescentes terão novas regras de segurança digital com PL da Adultização
Projeto busca proteger crianças e adolescentes, prevenindo abusos e exploração, garantindo autonomia progressiva e evitando a exploração comercial

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Após ser aprovado pela Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei 2628/2022, conhecido como PL da Adultização, ganhou ainda mais destaque após a repercussão nacional das denúncias de exploração sexual infantil trazidas pelo youtuber Felca, que resultaram na prisão do influenciador Hytalo Santos. Agora, o texto retorna ao Senado para nova análise e votação.
A proposta cria regras para ampliar a proteção de crianças e adolescentes em ambientes digitais, estabelecendo exigências para fornecedores de aplicativos e plataformas. No entanto, deixa para um regulamento posterior a definição de critérios objetivos que irão medir o grau de interferência dessas empresas sobre os conteúdos publicados por usuários.
As normas valerão para aplicativos, jogos, redes sociais e softwares acessados por crianças e adolescentes. O projeto tem como objetivos garantir a proteção integral, prevenir abusos, exploração e violência, respeitar a autonomia progressiva dos menores e evitar a exploração comercial desse público.
Em entrevista à coluna Enem e Educação, a advogada Débora Almeida, especialista em Direito Digital e Novas Tecnologias, encarregada de proteção de dados e membro da Comissão de Direito Digital da OAB-Caruaru, avalia que o projeto representa um avanço em relação a pontos já previstos na Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).
“A LGPD, em seu artigo 14, determina que a coleta e o uso de dados pessoais de crianças menores de 12 anos dependem do consentimento específico de pelo menos um dos pais ou responsável legal. No caso dos adolescentes entre 12 e 18 anos, aplica-se o regime geral da lei, mas com reforço do princípio do melhor interesse do menor”, explica a especialista.
“Além disso, a legislação prevê que a coleta de dados deve se limitar ao estritamente necessário, proibindo excessos”, completa.
Limites para coleta de dados e conteúdos impróprios
A regulamentação não poderá impor mecanismos de vigilância massiva nem práticas que comprometam direitos fundamentais, como a liberdade de expressão, a privacidade e a proteção integral de crianças e adolescentes.
Além disso, o PL da Adultização define que medidas contra conteúdos prejudiciais — como pornografia, estímulo ao suicídio, bullying ou jogos de azar — deverão ser aplicadas de forma proporcional à capacidade de cada fornecedor de intervir na circulação desses materiais.
Será dever dos fornecedores bloquear o acesso a produtos e conteúdos impróprios, limitar a coleta e o uso de dados pessoais de menores, restringir o uso de caixas de recompensas (loot boxes) em jogos e disponibilizar ferramentas de controle parental.
No caso das redes sociais, será necessário vincular as contas de crianças às de seus responsáveis, emitir alertas sobre os riscos do uso por menores, restringir conteúdos voltados a atrair esse público e aprimorar os mecanismos de verificação de idade.
Segundo a advogada Débora Almeida, os aplicativos que lidam com dados de menores precisam adotar um padrão elevado de proteção.
“Essas plataformas devem implementar salvaguardas técnicas e administrativas, como criptografia e anonimização, sempre que possível. Também é fundamental evitar a coleta de dados sensíveis, como informações de saúde e localização, salvo quando estritamente indispensável", afirma a especialista Direito Digital e Novas Tecnologias.
"Outro ponto é manter políticas de privacidade claras e acessíveis aos pais e responsáveis, além de oferecer ferramentas para o exercício dos direitos previstos na LGPD, como acesso, correção e exclusão de dados. É necessário ainda reforçar os mecanismos de segurança e de controle parental, garantindo informações compatíveis com a faixa etária de cada usuário”, explica.
A necessidade dessas medidas fica evidente diante de dados recentes. No fim de 2024, o ChildFund lançou o estudo Mapeamento dos Fatores de Vulnerabilidade de Adolescentes Brasileiros na Internet, que revelou números preocupantes: 54% dos adolescentes brasileiros já sofreram algum tipo de violência sexual on-line, cerca de 9,2 milhões de jovens; apenas 35% recebem supervisão parental; e 94% não sabem como agir em casos de violência virtual.
O levantamento também mostra que, quanto maior a idade, maior o risco: jovens de 17 e 18 anos têm até 1,3 vezes mais chances de sofrer violência on-line do que adolescentes de 15 anos.
Tecnologia a favor da proteção infantil
A tecnologia pode ser uma ser uma aliada importante na proteção de crianças e adolescentes. “Estudos apontam que é possível integrar a classificação indicativa com inteligência artificial, permitindo que conteúdos inapropriados sejam filtrados em tempo real e que pais ou responsáveis recebam alertas sobre riscos, como interações suspeitas em chats ou exposição a materiais violentos ou sexualmente explícitos”, destaca a advogada.
Sobre como avaliar a eficácia dessas medidas, Débora ressalta que há diferentes caminhos. “Auditorias independentes realizadas pela ANPD, indicadores de desempenho das plataformas, relatórios de transparência, estudos comparativos entre redes sociais, jogos e aplicativos educacionais, além do feedback de pais, educadores e organizações da sociedade civil podem mostrar se as políticas de proteção estão realmente funcionando”, explica.
A especialista reforça que, embora a LGPD e o ECA já ofereçam instrumentos importantes, é necessário avançar. “O Brasil pode evoluir em mecanismos como auditorias independentes e incentivo a um design ético das plataformas, seguindo exemplos internacionais. A proteção digital da infância não é apenas um dever legal: é também um compromisso ético da sociedade com o futuro das novas gerações”, conclui.
Pernambuco aprova lei contra erotização e adultização infantil
A Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe) aprovou, nessa última terça-feira (19), o Projeto de Lei 3162/2025, que proíbe e penaliza a produção, divulgação ou realização de qualquer conteúdo ou evento que promova erotização infantil, adultização de crianças ou estímulo sexual envolvendo menores de idade. A lei já está publicada e entra em vigor imediatamente.
De acordo com o texto, de autoria do deputado estadual Coronel Alberto Feitosa (PL), fica proibida a produção, exibição, divulgação, disponibilização, promoção ou patrocínio de conteúdos que explorem sexualmente crianças e adolescentes, seja de forma direta, indireta ou simbólica. Também são vetadas festas, eventos, apresentações artísticas, desfiles, concursos ou qualquer atividade que tenha como objetivo ou efeito o estímulo sexual de menores.
A lei define erotização infantil como qualquer representação, imagem, vídeo, áudio, texto ou atividade que sugira comportamento sexual de crianças; e adultização de crianças como o estímulo para que adotem comportamentos, vestimentas ou atitudes sexualizadas típicas de adultos. .
O descumprimento da lei prevê multas de 5 a 10 salários mínimos, cassação de alvará e licença de funcionamento de pessoas jurídicas e comunicação imediata ao Ministério Público para apuração de crimes previstos no Código Penal e no ECA. O Governo de Pernambuco terá 60 dias para regulamentar a norma.
*Com inforamações da Agência Câmara de Notícias