Em Pernambuco, Busca Ativa resgata 19 mil jovens à escola, mas 43 mil ainda seguem fora
A Busca Ativa Escolar também avaliou os desafios para ampliar o acesso à Educação Infantil - em Pernambuco 69% das crianças estão fora da creche

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Em Pernambuco, entre 2017 e 2025, 19.191 crianças e adolescentes que estavam fora da escola ou em risco de evasão foram identificados e retornaram às salas de aula graças à Busca Ativa Escolar (BAE), uma estratégia desenvolvida pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) e pela União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime) para apoiar estados e municípios no enfrentamento da exclusão escolar.
Esse número é considerado um avanço importante, pois demonstra que, quando as ações são coordenadas entre governos, escolas, famílias e comunidades, elas podem ser bem-sucedidas.
No entanto, é necessário um olhar atento para as mais de 43 mil crianças e adolescentes que ainda estão fora escola no estado, segundo dados da Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílio Contínua (PNAD Contínua) 2024, realizada pelo IBGE, e que estão tendo seu desenvolvimento educacional e social prejudicado.
De acordo com o mapeamento feito pela Unicef e disponível no site da Busca Ativa Escolar, o grupo de 15 a 17 anos concentra o maior índice de exclusão escolar, sendo essa etapa de matrícula obrigatória por lei. Em Pernambuco, 22.267 adolescentes estão fora da escola.
“Muitas vezes, o coração desse desafio reside na ideia de que são meninos e meninas que acumulam sucessivas reprovações, portanto, vêm de uma experiência de fracasso, e o próximo capítulo seria abandonar a escola”, afirmou Verônica Bezerra, especialista em Educação do Unicef no Brasil, em entrevista à coluna Enem e Educação.
No entanto, existem outros diversos fenômenos a serem observados que levam o arrastamento desses jovens para fora da sala de aula. A busca por trabalho, por exemplo, é uma realidade para muitos desses adolescentes, que se tornam parte da fonte de renda de suas famílias, quando não se veem como a único responsável por ela.
Nesse ponto, a escola também pode assumir o papel de potencializar as capacidades dos adolescentes para o mundo do trabalho desde que seja uma transição positiva.
“A educação em tempo integral é importantíssima por ser uma política que visa a preparação plena de cada um e cada uma, mas isso não pode estar em confronto ou desconsiderar essa outra banda da necessidade social, que empurra muitos jovens para fora da escola pela sobrevivência”, destacou Verônica.
Segundo ela, o diálogo que tem sido feito tanto em nível federal quanto estadual é no sentido de buscar uma melhor equação para essas demandas. “Seja fazendo uma transição para que haja a oportunidade de trabalho, mas que ele seja protegido e amparado concomitantemente ao que é feito na escola. Seja por meio de apoio, com o que a Unicef chama, por exemplo, de 'Um Milhão de Oportunidades (1MiO)', que é justamente essa ponte entre a escola efetiva e o mundo do trabalho decente”, destacou a especialista em Educação.
Outros recortes sobre a não frequência escolar em Pernambuco
O mapeamento feito pelo Busca Ativa Escolar mostra outros dados relevantes: em Pernambuco, 52% dos que estão fora da escola são meninos e 48% são meninas. Em relação à raça/cor, 72% das pessoas fora da escola em Pernambuco são pretas, pardas ou indígenas. A exclusão também está fortemente ligada à renda das famílias, com 23.492 crianças e adolescentes de 4 a 17 anos pertencentes às 20% mais pobres do estado.
Quanto ao território, 9.469 crianças e adolescentes fora da escola vivem na zona rural, enquanto 33.989 estão na zona urbana, o que mostra que, mesmo em áreas com maior concentração de escolas, ainda existem barreiras que dificultam o acesso e a permanência na educação.
“Por trás dos números, está a naturalização da exclusão escolar, que acaba por excluir sempre os estudantes em situação de maior vulnerabilidade, que já sofrem outras violações de direitos dentro e fora da escola. Meninos tendem a se afastar da escola, muitas vezes, por motivos como trabalho precoce, reprovações acumuladas ou falta de vínculo com a aprendizagem", disse Mônica Dias Pinto, Chefe de Educação do Unicef no Brasil.
"Entre meninas, há situações específicas, como a gravidez na adolescência e responsabilidades familiares. Além disso, para meninos e meninas, o racismo é um fator que contribui significativamente para a evasão escolar. Esses dados reforçam a importância de políticas públicas com abordagem sensível a gênero e território, capazes de responder às diferentes causas da exclusão”, completou.
Motivos identificados durante a Busca Ativa
A Busca Ativa não apenas localiza os estudantes fora da escola, mas também investiga as causas dessa não frequência. Em Pernambuco, somando os dados de desinteresse pela escola (4.608 casos), desinteresse declarado (4.209) e desinteresse pelos estudos (8.098), são mais de 16 mil registros relacionados a essa causa.
Diante desse cenário, surge a pergunta: a partir de que ponto a escola precisa se tornar mais atrativa? Em entrevista à coluna Enem e Educação, Verônica Bezerra explicou que a Busca Ativa também pode ser vista como uma escola, a partir do momento em que todos os atores envolvidos aprendem a observar mais de perto esse sujeito de direito de forma integral.
Isso significa que, quando há uma manifestação de desinteresse, a Busca Ativa ajuda a traduzir o que isso realmente significa.
"O desinteresse pelos estudos, como causa principal, dá um grito gigante. E, quando vamos visitar esse sujeito e fazer uma investigação mais profunda sobre o que está por trás dessa alegação, descobrimos que o desinteresse pode ser fruto de um desencontro entre o projeto de vida do adolescente e o que a escola oferece. Então, é importante comunicar as diferentes formas de aprender e potencializar o que faz sentido para esse público, com a oferta também do apoio socioemocional nesse processo", afirmou a especialista.
Ainda segundo Verônica, o desinteresse pode estar ligado a causas subjacentes e completamente invisíveis. "Eu me refiro às tensões familiares, às questões de violência. Por exemplo, às vezes o adolescente se desinteressa, e quando vamos à família, ele tem outros irmãos em casa que estão sem matrícula. Então, encontramos uma família que não fez a opção preferencial pela escola ou que contingenciou em função de causas sociais, e que não chegou à escola porque faltou a vaga, faltou o transporte escolar, o fardamento, etc.", explicou.
A carência de vagas (1.542 casos), transporte escolar (409 casos) e estrutura das escolas (173 casos) também estão entre as causas que levam crianças e adolescentes a não estarem exercendo ao direito de terem acesso à educação Em áreas remotas ou periféricas, a escola simplesmente não está ao alcance físico de muitos estudantes.
Desafios e avanços no acesso à Educação Infantil em Pernambuco
Embora a matrícula em creches não seja obrigatória, o acesso à educação infantil para crianças de 0 a 3 anos é um direito garantido por lei e essencial para o desenvolvimento integral. Atualmente, quase 7 milhões de crianças nessa faixa etária estão fora da creche (60% do total), representando o maior grupo dentro da análise nacional da PNAD Contínua. Em Pernambuco, esse número ultrapassa 362 mil (69%).
O acesso à creche é ainda mais limitado entre as crianças de famílias de baixa renda. De acordo com o estudo, 36% dos bebês e crianças que não frequentam a creche (2,4 milhões) vivem nas famílias que pertencem aos 20% mais pobres do país. Em Pernambuco, são 212 mil (59%).
Esses dados destacam a necessidade urgente de ampliar a oferta de educação infantil, especialmente em comunidades vulneráveis.
A adesão à Busca Ativa Escolar é gratuita e pode ser feita por meio do site buscaativaescolar.org.br, que oferece apoio técnico, materiais formativos e uma plataforma digital para ajudar gestores públicos a enfrentar a exclusão escolar de forma estruturada e intersetorial.
Para a Busca Ativa Escolar, o Unicef conta com a parceria estratégica da EDP e do Instituto BRK, com o apoio do Instituto Solea, B3 Social e Fundação Bracell – esta última com foco em Educação Infantil. Além disso, o Unicef conta com a parceria da Fundação Itaú para ações educacionais e com a parceria estratégica do Grupo Profarma para sua atuação no país.