A desertificação do bolsonarismo com o avanço da Justiça
Com recursos esgotados, o cumprimento da pena empurra a direita para um vazio estratégico e aprofunda a desertificação do bolsonarismo.
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Alexandre de Moraes tem a prerrogativa, a partir de agora, de determinar que Jair Bolsonaro comece a cumprir a pena de 27 anos e 3 meses a que foi condenado. Esse ponto marca uma virada no processo porque não se trata mais de discutir o mérito nem de apostar em manobras para adiar o inevitável.
O prazo para novos embargos de declaração acabou sem que a defesa apresentasse o recurso. A engrenagem jurídica chegou ao seu limite.
O caso entrou numa fase em que o fator decisivo deixa de ser o debate técnico e passa a ser a administração política de um fato que tende a redefinir o ambiente da direita brasileira.
Etapa final
Os embargos de declaração são o primeiro instrumento da defesa nesses julgamentos no Supremo. Eles servem para corrigir omissões, esclarecer dúvidas ou ajustar pontos não contemplados na decisão. No caso de Bolsonaro, esses embargos foram apresentados e rejeitados. A defesa ainda tinha o direito de oferecer novos embargos, mas não o fez dentro do prazo. Essa ausência funciona, na prática, como desistência da tentativa de reabrir a discussão.
Recurso limitado
Restaria o pedido de embargos infringentes, um recurso que só prospera se houver pelo menos 40% de votos pela absolvição no julgamento. Bolsonaro não alcançou esse patamar. Ele não teve dois dos cinco votos que permitissem a abertura dessa porta. A posição de Luiz Fux, pela absolvição, não é suficiente para garantir essa ferramenta.
O recurso ainda pode ser tentado, tecnicamente, mas o entendimento consolidado no Supremo leva a crer que Moraes deve considerá-lo protelatório assim que chegar, se chegar. E descartá-lo.
Trânsito próximo
Se o ministro classificá-lo dessa forma, o trânsito em julgado é declarado. Como a defesa não apresentou novos embargos de declaração, Moraes já pode determinar o início do cumprimento da pena. A tendência é que haja um intervalo curto para que a formalidade dos infringentes seja analisada, caso venham, mas o desfecho é previsível. Nem serão recebidos.
Cenário de referência
O caso resgata lembranças recentes. A estratégia utilizada por advogados para atrasar o início do cumprimento da pena no caso de Fernando Collor funcionou por pouco tempo e logo foi considerado protelatório. Collor ficou em prisão domiciliar, por causa dos problemas de saúde que tem.
A expectativa é que Alexandre de Moraes busque evitar a repetição de um episódio marcado pela sucessão de petições com efeito apenas de empurrar o calendário. Com Bolsonaro também deve ser diferente em relação ao local.
Local possível
A partir da decisão, a questão passa a ser o local onde Bolsonaro ficará. Ele pode permanecer na sede da Polícia Federal, ser levado para a Papuda numa área mais isolada ou, menos provavelmente, voltar ao regime domiciliar.
A domiciliar perdeu força porque ele violou regras recentes ao tentar abrir a tornozeleira. Além disso, a permanência em casa exigiria uma estrutura policial fixa, cara e complexa para o Estado. O cenário mais factível é que fique na PF ou na Papuda realmente.
Normalização
A direita ainda não reagiu com intensidade à possibilidade de início imediato da pena. Não houve sinal de mobilização nem expectativa de atos nas ruas. O silêncio é a marca por enquanto.
A prisão preventiva, depois convertida em domiciliar, já havia sido absorvida pelos grupos bolsonaristas. A tendência é que o início do cumprimento da pena produza menos ruído do que se imaginava meses atrás. E isso mostra um isolamento popular significativo, que terá impactos na formação das chapas para 2026.
Efeito futuro
A ausência de reação revela um ponto mais profundo: o processo de "desertificação" do bolsonarismo. Quanto mais avança o rito jurídico, mais se reduz a disposição das lideranças da direita para confrontar o Supremo ou para apostar na figura de Bolsonaro como eixo de mobilização.
O início do cumprimento da pena pode transformar essa fase em definitivo ponto de encerramento de um ciclo e abrir espaço para novas reordenações internas na direita brasileira.
Finalmente se vira uma página pesada da história. O que virá depois?