Cena Política | Análise

O poder da caneta e o desafio da entrega em Pernambuco

Raquel Lyra (PSD) entra em 2026 com dinheiro e estrutura, mas precisa transformar promessas em realizações para evitar o erro de Paulo Câmara.

Por Igor Maciel Publicado em 11/10/2025 às 20:00

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A diferença entre o que as pesquisas mostram e o que a política enxerga é uma velha conhecida de quem acompanha campanhas antecipadas demais. Em Pernambuco, o cenário atual coloca João Campos (PSB) como "favorito absoluto", aparecendo em levantamentos com até o dobro da intenção de voto da governadora Raquel Lyra (PSD).

No entanto, dentro dos bastidores, a leitura é menos definitiva. Mesmo em desvantagem numérica, há um sentimento forte entre políticos e analistas de que Raquel ainda é a candidata a ser batida em 2026 e não João. Pode parecer estranho para quem lê as pesquisas de hoje, mas o tempo, as regras do TSE e o Orçamento do Estado em 2026 deixam dúvidas sobre o cenário.

O tempo como aliado

A eleição para o Governo de Pernambuco acontecerá apenas em outubro de 2026. Falta um ano inteiro, e em política esse intervalo é suficiente para inverter favoritismos.

Raquel Lyra tem diante de si um calendário que pode jogar a seu favor. O governo estadual aprovou um plano de investimentos robusto para 2026, e grande parte desses recursos será liberada justamente nos próximos meses, quando a população começa a prestar mais atenção às entregas e obras que afetam o cotidiano.

O relógio eleitoral ainda corre devagar, e é no compasso desse tempo que a governadora aposta para reverter a maré. Nos primeiros meses do ano que vem, o volume de investimentos deve ser quase 30% maior do que já foi antes. Não é algo que se ignore.

Candidato em espera

Do outro lado da disputa, João Campos ainda não é oficialmente candidato. O prefeito do Recife tem agido como quem planeja um movimento maior, visitando cidades do interior e falando sobre Pernambuco em tom estadual, mas sem admitir de forma direta a intenção de disputar o governo.

Mas a lei eleitoral impõe um marco e ele precisa deixar o cargo até abril de 2026 se for concorrer. Até lá, qualquer movimento será apenas ensaio.

Essa espera cria um vácuo que Raquel pode ocupar com ações concretas de governo e com a vitrine do cargo que já ocupa. Enquanto João não se desincompatibiliza, a governadora pode exibir entregas, carimbar obras e consolidar presença institucional em todo o Estado.

O poder do orçamento

O maior trunfo da governadora é o orçamento de 2026, que prevê aumento de 27% nos recursos destinados a investimento em relação a 2025. São R$ 60,4 bilhões no total, com cerca de R$ 7 bilhões livres para aplicação direta.

É um número que impõe respeito e desperta atenção no meio político. Num ano eleitoral, cada real aplicado vira ação de visibilidade. O governo já destinou nessa conta ao menos R$ 3,2 bilhões para infraestrutura e R$ 3,7 bilhões para programas sociais.

A estratégia é espalhar obras e programas que alcancem todas as regiões, movimentem a economia e reforcem o discurso de gestão eficiente.

Obras e efeito imediato

Os números do planejamento chamam atenção pelo impacto prático. Apenas em obras de mobilidade, rodovias e acesso a polos produtivos do Agreste, a previsão é de gerar mais de 40 mil empregos diretos. O efeito indireto ultrapassa R$ 1 bilhão em serviços e compras públicas.

Na ponta, isso significa renda circulando e percepção de melhora na economia local. Paralelamente, o governo ampliará programas de habitação, enfrentamento à fome e políticas voltadas às mulheres.

Em termos eleitorais, trata-se de um pacote de visibilidade intensa, com obras que serão entregues antes de julho, quando a legislação eleitoral impõe restrições. É a chance de transformar o volume de recursos em resultado político.

Entre promessa e execução

Mas existe um dado da realidade que não pode ser ignorado também: ninguém come dinheiro no cofre. Ele precisa ser transformado em "comida". A governadora precisa demonstrar capacidade de execução num ritmo que ainda não conseguiu mostrar e comunicar isso à população com uma efetividade que ainda não foi alcançada.

As dezenas de creches, que foram prometidas em 2022 e começaram a ser cobradas pela oposição agora, estão aí como exemplo.

O histórico recente de Pernambuco é um alerta. Paulo Câmara terminou o mandato de governador com cofres abastecidos e uma rejeição recorde. Tinha caixa, mas não teve tempo nem articulação para transformar orçamento em obra, promessa em resultado.

O PSB acabou fora do segundo turno e amargando o quarto lugar na eleição estadual da época. Se a governadora não conseguir tirar o investimento do papel, o poder da caneta não significará vantagem alguma.

É verdade que muita coisa ainda vai acontecer daqui para a eleição de 2026 e tudo pode acontecer dentro de quase infinitas possibilidades. Tudo, inclusive nada. Por isso é preciso acelerar as coisas. Para ontem.

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