Aposta em Fux "legalista" é último recurso da defesa contra condenação
Conhecido pelo rigor técnico, o ministro é visto como chance de anulação por causa do volume de provas e limitações de prazos processuais.

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O julgamento de Jair Bolsonaro (PL) e de generais próximos a ele ganhou contornos que vão além do mérito das acusações. O que se viu na 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal foi uma batalha sobre os limites do devido processo legal, com advogados mais preocupados em mostrar a inviabilidade da defesa do que em sustentar teses de inocência.
A estratégia é criar um ambiente de desconfiança sobre a efetividade do direito de defesa dentro do julgamento, ao mesmo tempo em que se tenta sensibilizar ministros mais técnicos para eventuais nulidades.
O alvo principal das reclamações técnicas é alcançar Luís Fux, conhecido como um legalista na corte e que já demonstrou contrariedade com alguns aspectos da ação penal. Como último recurso, os defensores tentam conquistá-lo.
Defesa em xeque
Na tribuna, os advogados repetiram que a defesa foi colocada em situação impossível de ser cumprida. O ponto central foi a quantidade de provas encaminhadas pela Polícia Federal.
Matheus Milanez, responsável pela defesa do general Augusto Heleno, mostrou pastas digitais, descreveu a dificuldade de análise e insistiu que seria humanamente inviável revisar o material no prazo concedido. Daí o pedido de anulação do processo.
“Um e-mail nos foi enviado com o link de um SharePoint da Polícia Federal. Dentro das pastas, encontramos arquivos com nomes incompreensíveis. Um dos laudos, por exemplo, veio em um arquivo de 128 gigabytes. No total, são mais de 20 terabytes compactados, que podem chegar a 80 terabytes descompactados. Como é possível analisar esse material no curto espaço de tempo que tivemos?”, afirmou o defensor.
O argumento foi reforçado pelos demais, inclusive pelo representante de Jair Bolsonaro, que também apontou a sobrecarga documental como uma violação ao direito constitucional de defesa.
O espectro do Lawfare
Esse discurso não surgiu do nada. Ele se apoia no conceito de Lawfare, que significa o uso das leis como arma de guerra política. A expressão ganhou força no Brasil com a atuação de Cristiano Zanin na Lava Jato, quando sustentava que Lula (PT) havia sido impedido de disputar a eleição de 2018 por uma ação judicial direcionada.
Agora, a retórica é apropriada por bolsonaristas, que veem no julgamento uma tentativa de inviabilizar o ex-presidente em 2026. A ironia é evidente: Zanin, que construiu sua reputação denunciando Lawfare, hoje preside a 1ª Turma do STF e ouve os mesmos argumentos em favor de seu antigo adversário político.
O livro de Zanin
O próprio ministro escreveu um livro sobre o tema, descrevendo três frentes estratégicas semelhantes a uma guerra: Geografia, Armas e Externalidades.
Geografia, quando se escolhe o juiz ou tribunal a dedo; armas, quando se cria sobrecarga documental que inviabiliza a defesa; e externalidades, quando a mídia pressiona e cria ambiente hostil.
Ao alegarem que as provas em excesso inviabilizam qualquer defesa consistente, os advogados de Bolsonaro praticamente citaram a cartilha escrita por Zanin, mesmo sem citar o ministro em momento algum.
O embate com Moraes
Se Zanin aparece como peça-chave do enredo e Fux como tábua de salvação dos afogados, Alexandre de Moraes é o alvo preferido dos advogados. Em determinado momento, um deles (Milanês) chegou a chamá-lo de "juiz inquisidor", o que aumentou a tensão na sala.
As defesas criticam a postura firme e centralizadora do ministro, que "conduz investigações, autoriza diligências e participa do julgamento". É o mesmo ponto que já foi usado em outras ações para levantar dúvidas sobre sua imparcialidade.
Mas Moraes tem sustentado que age dentro da legalidade e do regimento do STF. E fim.
Fux
Diante desse cenário, Luís Fux aparece como o ministro que pode desequilibrar a balança. Conhecido pelo perfil legalista e pela atenção a detalhes técnicos, ele é visto pelos advogados como alguém sensível às falhas processuais.
O excesso de provas, a limitação de prazo e a dificuldade prática de análise são elementos que poderiam convencê-lo a votar pela anulação ou até pela absolvição.
É uma expectativa que mostra como a estratégia da defesa não mira apenas no discurso público, mas em possíveis brechas jurídicas capazes de alterar o rumo do julgamento.
Apesar das reclamações, o Supremo não dá sinais de que vá aceitar a tese de nulidade. O julgamento deve avançar até o dia 12 de setembro, em meio ao ambiente de polarização já conhecido.