Cena Política | Análise

Tarifaço de Trump e inflação aliviam cenário para Lula

O tarifaço de Trump e a percepção de queda na inflação dos alimentos impulsionaram Lula, que reduziu a distância da rejeição. Vai se sustentar?

Por Igor Maciel Publicado em 20/08/2025 às 20:00

Clique aqui e escute a matéria

O governo Lula conseguiu manter a tendência de alta na aprovação popular. Desta vez, o movimento não pode ser explicado apenas pela mudança de tom na comunicação oficial ou pelo esforço retórico do Planalto. Há fatores que escapam ao controle tanto do governo quanto da oposição e que, mesmo involuntariamente, ajudam a construir uma percepção mais positiva sobre o presidente.

O exemplo mais claro é o tarifaço anunciado por Donald Trump, que elevou impostos sobre produtos brasileiros e acabou reorientando o olhar de parte do eleitorado sobre Lula. Essa leitura, que em outras circunstâncias poderia ampliar a rejeição, funcionou de forma inversa em segmentos específicos da população e abriu espaço para que a curva da popularidade passasse a se estreitar em relação à desaprovação.

Sudeste reage primeiro

Os números da pesquisa Genial Quaest confirmam esse movimento. No plano nacional, a desaprovação do governo caiu de 57% em maio para 51% agora em agosto, enquanto a aprovação subiu de 40% para 46%.

Essa inversão tem um ponto inicial bem definido: o Sudeste. Região mais populosa e onde o acesso à informação se dissemina com maior rapidez, foi ali que primeiro se verificou uma redução expressiva da rejeição. Até maio, 64% dos eleitores da região desaprovavam Lula. Hoje esse número está em 55%. No mesmo período, a aprovação subiu de 32% para 42%.

O chamado efeito jacaré fechando a boca, quando as linhas de aprovação e desaprovação se aproximam, começou justamente nesse eixo, influenciado pelo impacto direto das medidas anunciadas por Trump e pela reação imediata da opinião pública.

Nordeste absorve os efeitos

Se o Sudeste foi a primeira região a responder, o Nordeste absorveu os efeitos na sequência. A pesquisa de julho ainda mostrava estabilidade, com Lula registrando 53% de aprovação e 44% de desaprovação. Já em agosto, o salto foi claro: a aprovação subiu para 60%, enquanto a rejeição caiu para 37%.

O movimento confirma a defasagem entre o momento em que a informação chega e o tempo necessário para que ela repercuta nas camadas mais amplas do eleitorado. O fenômeno não anula a força histórica de Lula no Nordeste, mas evidencia como até mesmo em regiões já favoráveis há espaço para crescimento quando fatores externos reconfiguram a percepção popular.

A força da economia

A pesquisa também aponta que o tarifaço de Trump não é o único elemento explicativo para a melhora nos números do governo. A queda no percentual de pessoas que percebem alta no preço dos alimentos tem peso determinante.

Em julho, 76% dos entrevistados afirmavam que os preços nos supermercados haviam subido no mês anterior. Agora, esse índice caiu para 60%. Ao mesmo tempo, aumentou de 8% para 18% o número dos que dizem que os preços caíram e de 12% para 20% os que acreditam que permaneceram estáveis.

A mudança, ainda que modesta, alivia a sensação de aperto no bolso e reforça a ideia de que a economia pode estar dando sinais de melhora. Em política, muitas vezes a percepção importa mais do que os números frios da inflação, e é isso que está refletido nos índices.

Impacto entre os mais pobres

A influência desse alívio econômico é nítida quando se observa o recorte por faixa de renda. Entre os que ganham até dois salários mínimos, a aprovação ao governo subiu de 46% em julho para 55% em agosto. No mesmo grupo, a desaprovação caiu de 49% para 40%.

Trata-se de um crescimento de nove pontos em apenas um mês, revelando como a percepção de estabilidade nos preços dos alimentos tem efeito direto no humor dos mais pobres. Já entre as faixas de renda mais altas, o avanço é mais discreto, mas ainda assim significativo. Entre os que ganham acima de cinco salários mínimos, a aprovação saltou de 34% para 39%.

Esses números reforçam a avaliação de que Lula volta a consolidar sua base social mais tradicional ao mesmo tempo em que reduz resistências em setores historicamente mais críticos.

O que vem pela frente

O dado central da pesquisa é que Lula se aproxima de um ponto de inflexão: a possibilidade de ter mais aprovação do que rejeição já nas próximas rodadas.

A equação combina fatores externos, como o impacto da política norte-americana, com variáveis internas, como a percepção de controle sobre a inflação dos alimentos. Esse conjunto cria um ambiente mais favorável ao governo e, inevitavelmente, fortalece o presidente no jogo de 2026.

A próxima fotografia será divulgada nesta quinta-feira, quando a Quaest apresentará números sobre um cenário eleitoral direto entre Lula e potenciais adversários da oposição. É nesse terreno que a aprovação conquistada nas últimas semanas será testada, revelando se a tendência de crescimento se consolidará também quando o presidente for confrontado nominalmente com seus rivais.

Compartilhe

Tags