Igor Maciel: A CPI da publicidade na Alepe: espuma de um lado, tijolo do outro
Ao ampliar escopo, aliados de Raquel podem se reposicionar e atrair a atenção para contratos de gestões passadas. Mas precisa ter apoio para isso.

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A pandemia foi uma tragédia para o mundo, mas passado o cume dos malefícios reforçou a ideia de que toda crise traz, como bagagem, a abertura de oportunidades.
Por causa da pandemia houve aceleração tecnológica, ampliação da cultura de dados, transformação digital, fortalecimento da Saúde Pública no Brasil e surgiram novas formas de pensar os gargalos do país.
Numa única olhada pode parecer, por exemplo, que a CPI contra o Governo Raquel Lyra na Assembleia Legislativa é uma tragédia para o grupo que hoje ocupa o Palácio do Campo das Princesas. Mas é também uma grande oportunidade, que pode ser aproveitada ou não, de reforço político num governo que escorrega na estratégia política desde que teve início.
Gargalo é político
O Brasil não avançou na transformação digital, na telemedicina e na logística durante a pandemia porque planejou fazer isso, mas porque tinha deficiência nos setores e foi obrigado, por sobrevivência, a tomar uma atitude e mudar seus padrões.
O maior gargalo do Governo Raquel é a política. Por estar com muito dinheiro em caixa e ter uma estratégia mais voltada para o municipalismo, quase abandonando as articulações com partidos e suas bancadas, o Palácio tem sofrido uma ampla variedade de contratempos, alguns são espuma artificial e outros são mais sólidos.
A CPI protocolada na Assembleia esta semana, direcionada à publicidade do governo, é um caso curioso: juridicamente é mais espuma, politicamente é um tijolo.
Por causa disso, a capenga e mambembe articulação política do governo será obrigada a se fortalecer e atuar de forma mais profissional, com os partidos. Agora é questão de necessidade.
Se conseguir, transforma o limão em uma limonada, doce.
Risco de reviravolta
O problema das CPIs é que quando elas começam ninguém sabe como irão terminar. Vale lembrar: duas décadas atrás, uma CPI foi iniciada por partidos insatisfeitos com os espaços que tinham no primeiro governo Lula (PT). A ideia era investigar práticas não republicanas nos Correios para pressionar os petistas.
A CPI acabou se transformando no escândalo do Mensalão que arrastou quatro partidos para a lama, inclusive os que ajudaram a provocar a CPI original.
No caso da CPI estadual que foi protocolada na Alepe esta semana, basta que os deputados governistas proponham, ao invés de limitar, ampliar o escopo das investigações para que alcancem todos os contratos de publicidade das últimas décadas com o governo de Pernambuco.
Movimento estratégico
E não é algo difícil de acontecer. Quem já despontou como firme integrante dessa linha de atuação foi o deputado Renato Antunes (PL). Menos de 24h após a Comissão ter sido protocolada, o deputado enviou nota à imprensa.
"Se cada denúncia genérica virar CPI, então que venham as comissões para investigar cada contrato dos últimos 20 anos. Só espero que tragam café, porque o circo vai longe", afirmou o deputado Renato Antunes (PL), ao defender que a investigação não se restrinja à atual gestão e que atinja também governos anteriores.
É um provável ponto de partida para essa possível virada.
Hora de negociar
Mas a única maneira de essa estratégia ser possível é se o governo estiver disposto a negociar com os partidos e com as lideranças partidárias de uma forma completamente diferente do que foi feito até agora, mantendo bases republicanas imprescindíveis e inegociáveis, mas abrindo o leque de oportunidades para a participação legítima dos grupos políticos com força em Pernambuco.
Isso é algo que tem sido cobrado há quase três anos e o Palácio não quer ou não consegue fazer. Talvez a CPI seja o catalisador necessário para o enfrentamento a esse gargalo.
E, se for, que finalmente seja. Porque políticos que não fazem política são um atentado à lógica.