Cena Política | Análise

Governadores perdem peso e viram coadjuvantes na eleição de 2026

A lógica mudou: quem distribui emendas é que pesa mais no jogo político. Governadores precisam agora provar que entregam votos e bancadas.

Por Igor Maciel Publicado em 04/08/2025 às 20:00

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A eleição dos governadores em 2026 será prioridade para quem? A pergunta pode parecer estranha, mas é baseada numa série de entrevistas das últimas semanas em que lideranças nacionais têm se dividido entre atribuir suas prioridades ao Senado ou à Câmara dos Deputados e, quase sempre, colocando a eleição ao governo como algo acessório.

Lula (PT) já disse isso, quando reforçou que fazer maioria no Senado é o que há de mais importante para ele.

Humberto Costa, que presidia o PT até semana passada, repetiu, colocando as eleições para governador como "prioridade número quatro" numa lista. A primeira é Lula, depois os senadores, depois uma bancada de deputados federais e só então alguém vai pensar nos governadores.

Prioridade PSD

Nos últimos dias, em análises sobre os planos do PSD, isso voltou a chamar atenção. O partido de Gilberto Kassab está finalizando seu planejamento para 2026. E a prioridade é fazer uma grande bancada de deputados federais, depois, senadores e, no fim do pódio de urgências, os governadores.

Até Bolsonaro, mesmo inelegível em 2026, já se manifestou sobre o assunto, dizendo em um discurso que precisava fazer 50% dos deputados na Câmara para "mudar o Brasil".

Fluxo político

A síntese de uma explicação sobre isso é que a maneira como o fluxo da política e do poder se modificou nos últimos anos está enfraquecendo a importância dos gestores executivos nos estados. E isso é um risco para o desenvolvimento.

Os governadores sempre funcionaram como líderes políticos locais que ajudavam a organizar o desenvolvimento de suas regiões através das bancadas parlamentares. Não se chega a lugar algum sem planejamento e concentração de esforços.

A lógica dessa liderança dos governadores era criar projetos estruturantes que pudessem ser irrigados com verbas federais carreadas pelos parlamentares. E assim se induz crescimento, emprego e robustez econômica. Era assim que funcionava.

Emendas livres

O que aconteceu nos últimos cinco anos foi que a liberação das emendas parlamentares ganhou tal autonomia ao ponto de fazer com que os deputados não tenham interesse de trabalhar em conjunto com ninguém além de seus próprios parceiros locais, que podem lhes entregar vantagens eleitorais ou financeiras (quando a relação é não republicana), ignorando a figura do governador e dos projetos que ele pode ter.

Por que destinar emendas para a construção de um hospital, para dividir o palanque da inauguração com o governador e com outros deputados, seus concorrentes eleitorais, quando pode usar o dinheiro para uma ONG ou um prefeito específico que pode lhe fazer um tipo de "rei" local?

Não faz muito tempo, na eleição para a mesa diretora da Câmara Federal, falava-se que era mais importante ser presidente da Câmara do que ser governador na maioria dos estados brasileiros. Não é à toa.

Poder financeiro

Em 2025, cada deputado federal terá direito a manejar impressionantes R$ 38 milhões em emendas parlamentares. Isso mesmo: R$ 38 milhões por cabeça. A cifra é tão robusta que transforma qualquer parlamentar num verdadeiro operador de recursos, com capacidade de interferência direta nos municípios, ONGs e entidades parceiras.

Ser deputado, mais do que formular leis, virou uma espécie de gerente de orçamento paralelo, com poderes que antes estavam muito mais concentrados nos executivos. É dinheiro suficiente para construir estradas, financiar eventos, bancar instituições e ainda se tornar indispensável na política local. E tudo isso sem depender do governador.

Cada deputado também rende milhões aos partidos: em fundo partidário e eleitoral, o bônus por parlamentar ultrapassa os R$ 8 milhões, somando as duas rubricas.

É por isso que Kassab e tantos outros dirigentes estão obcecados em montar grandes bancadas. Antes de sonhar com governadores, eles querem garantir verba, voto e vitrine.

Estratégia Lula

E Lula, por que não está preocupado com governadores e sim com uma grande bancada de senadores? Tem a ver com a governabilidade e com otimização de recursos. O presidente sabe que não será fácil brigar com os partidos do centrão pela bancada de deputados.

O PT, historicamente, consegue eleger muitos parlamentares na Casa, mas não tem condição financeira de lutar contra partidos que estão bem estruturados com emendas e grande capilaridade, como o MDB, o PSD e mesmo o União Brasil e o Progressistas.

Eleger mais de 100 deputados só para começar a competir com os outros é muito mais caro do que eleger uma maioria entre 54 cadeiras do Senado, que é o que vai estar em jogo em 2026.

Papel Senado

Lula se apoia no fato de que o Senado é uma casa revisora que pode travar completamente quase todas as decisões não apoiadas pelo governo que forem tomadas na Câmara. Coisa que os governadores, por não terem mais a influência local sobre suas bancadas, não conseguem garantir. Lula está tentando um atalho para o problema de governabilidade que se criou durante a pandemia, com as emendas que, no orçamento de 2025, chegam a R$ 50 bilhões.

Aviso aos governadores

Governadores e candidatos ao governo que quiserem ter atenção de Lula e dos seus partidos em 2026 precisarão entender algo que muitos ainda não entenderam: o valor deles está nas bancadas que eles podem ajudar a oferecer e nos votos que podem entregar aos senadores de suas chapas.

Quem não eleger parlamentares, vai servir pouco ao ambiente político do ano que vem.

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