Cena Política | Análise

O PSB corre para valorizar Alckmin antes que outro partido o carregue

Lula resgatou Alckmin de um programa de TV e o colocou na vitrine do poder; agora, PSB tenta mantê-lo como ativo político em meio à cobiça de rivais.

Por Igor Maciel Publicado em 26/07/2025 às 20:00

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Até o mês de junho, ninguém queria saber muito de Geraldo Alckmin (PSB). O vice-presidente cumpria seu papel muito bem, sendo comparado a Marco Maciel (que foi vice de FHC e famoso por auxiliar o titular sem causar qualquer problema por oito anos). Margeava também as desconfianças petistas de sempre por ter sido adversário de Lula (PT) no passado e, quase como se fosse crime, um tucano de longas penas. 

Tudo mudou quando Donald Trump começou a ameaçar o país com taxas de 50% sobre produtos brasileiros. Como ministro da Indústria e Comércio, Alckmin foi designado para ficar à frente das negociações. E aí entrou em campo uma habilidade há muito conhecida e rara hoje em dia na política: a cordialidade, a lealdade e a destreza para articular e desenvolver relações.

Sala de situação

Desde então, Alckmin coordena incansavelmente um Comitê Interministerial que passou a funcionar como uma espécie de sala de situação permanente diante da crise aberta pelas tarifas americanas. Foram mais de 20 reuniões com setores produtivos, em um curto intervalo, colocando frente a frente empresários, representantes de cadeias produtivas, técnicos do governo e diplomatas.

Voz unificada

O vice-presidente usou sua experiência política para transformar os encontros em pontes efetivas com o setor privado. Ao todo, o governo já se conectou com mais de 100 entidades empresariais, abrindo espaço para escuta e alinhamento de demandas. O esforço é, acima de tudo, para que o Brasil fale com uma só voz lá fora, algo raro, mas necessário, e consiga articular soluções que evitem o colapso das exportações.

Visita simbólica

Em certo momento na última semana, Alckmin abriu sua agenda para receber, junto a Lula, o presidente nacional do PSB, seu partido, João Campos. A visita de Campos, que também é prefeito do Recife, tem um motivo: demarcar território.

O PSB que nem ligava muito para Alckmin e costumava reclamar do pouco espaço na gestão lulista, argumentando que o vice estava lá apenas por pedido do presidente e não pela cota partidária, agora está correndo para alçá-lo ao posto de santo, líder e referência socialista.

Se o risco de perdê-lo para outro partido aumentar, é capaz de começarem a compará-lo com Miguel Arraes, dizendo que estão no mesmo patamar de importância para a sigla. É que o PSD e o MDB andaram fazendo propostas pela vice de Lula nos bastidores. E a ideia é, inclusive, filiar Alckmin para que ele siga onde está.

Força partidária

Não é uma briga muito justa caso o critério seja o da força política. PSD e MDB estão em primeiro e em segundo lugar na lista de siglas com o maior número de prefeitos do Brasil. Juntos eles têm mais de um terço de todas as mais de 5,5 mil prefeituras do país.

Os socialistas, atualmente, comandam cerca de 300 prefeituras. No Congresso Nacional, a diferença é ainda mais expressiva. Enquanto o PSB tem 14 deputados e 4 senadores, o PSD e o MDB têm 42 parlamentares cada um. No Senado, o PSD tem 15 representantes e o MDB tem 10.

Se depender de estrutura partidária, o PSB já perdeu Alckmin. Mas é aí que entra algo muito importante e que já foi falado aqui neste texto: a lealdade.

Resgate improvável

O vice-presidente é um tipo cada vez mais raro na política, dos que não esquecem os gestos e não abandonam aliados pelo caminho. Antes de ser alçado ao cargo atual, mesmo depois de ter sido governador de São Paulo por quatro mandatos, a maneira mais fácil de encontrar Alckmin era ligando a TV na Band pela manhã para assistir o programa "Aqui na Band", onde ele dava dicas como médico especialista em acupuntura.

Lá, era chamado de "Dr. Geraldo" e a audiência mal passava de dois pontos no Ibope. Quem foi resgatá-lo foi Lula, que precisava convencer o eleitorado de uma união entre rivais para derrotar Bolsonaro, "pelo bem do Brasil".

A escolha do PSB

Quando Lula não encontrou um partido no qual colocar o vice, pediu ao PSB. Os socialistas resistiram, pediram contrapartidas do PT (retirar candidatura em Pernambuco), mas aceitaram. O gesto de Lula é algo que ele não esquece. O do PSB ele sabe que foi de mau humor, mas também reconhece positivamente.

No fim, o que diferencia Alckmin e o fazia ser chamado de "picolé de chuchu", por ser bonzinho e leal demais, é o que pode salvar o PSB.

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