Trump ameaça exportações do Brasil e centro evita confronto com Lula
Medo do impacto econômico das taxas impõe cautela a opositores e o presidente brasileiro se fortalece como "defensor da soberania nacional".

Clique aqui e escute a matéria
Quais são os dados da realidade política dentro das ameaças de taxação de Donald Trump ao Brasil? O fenômeno “rally round the flag” está em curso e deve favorecer o presidente brasileiro. Lula se beneficia de uma “união para proteger o país do inimigo externo”.
Tanto a narrativa de “pobres x ricos” quanto as ameaças de Donald Trump são fatores que fortalecem o governo petista e os integrantes do centro não ignoram isso. Tanto que, na prática, já pouco se fala na instalação da CPMI do INSS.
A ordem é não arriscar fazer nada contra Lula sob risco de ficar do lado errado da opinião pública se a economia do país vier a sofrer com as taxações dos EUA. Ao menos enquanto o efeito das ameaças durar.
Acordos em pausa
Outro dado prático da realidade é que partidos como Republicanos, União Brasil e Progressistas já haviam conversado com integrantes do PT sobre entregar seus ministérios e sair do governo. O desembarque estava marcado para agosto, há um ano das convenções partidárias do ano que vem, quando lançariam alternativas à reeleição de Lula e ficariam na oposição.
Tudo isso foi suspenso e o que se viu, desde a carta de Trump, foi um movimento de reaproximação. Mesmo que o projeto de candidatura própria desse grupo seja mantido, deve demorar mais para colocar a cara na rua.
Efeitos das taxas
Tudo vai depender dos efeitos das taxas. Acontece que Ronaldo Caiado (União), por exemplo, que é um dos possíveis candidatos à presidência, vem de um estado onde o agro é muito forte. Se a sua base em Goiás estiver sendo prejudicada pela taxação, originalmente baseada em apelos bolsonaristas por uma intervenção trumpista, vai ser difícil pedir votos tanto dos bolsonaristas quanto dos integrantes do setor ao mesmo tempo.
Caiado foi um dos governadores que agiu por impulso e depois precisou ajustar as falas sobre a carta dos EUA. Primeiro atacou Lula e depois passou a defender um diálogo com a participação de uma comissão do Congresso brasileiro.
Recuo de Zema
Outro acontecimento que mostra essa dificuldade dos bolsonaristas, foi o recuo rápido de Romeu Zema (Novo), também possível candidato contra Lula. No primeiro momento ele apoiou o presidente americano e fez uma postagem culpando o petista, o STF e até a primeira-dama, Janja, pelas taxas.
Logo depois, pressionado por empresários mineiros, que serão prejudicados, e por parlamentares da bancada de MG, fez um vídeo mudando o tom. "A taxação imposta pelo presidente Trump a produtos brasileiros é uma medida errada e injusta… Defender a liberdade não pode significar atacar quem trabalha e produz no Brasil", ajustou-se Zema.
Pressão sobre Tarcísio
Mas ninguém sofre mais pressão do que Tarcísio de Freitas (Republicanos). O governador de São Paulo é o principal nome entre os possíveis candidatos que podem enfrentar Lula pela direita. Ter posado para fotos, recentemente, com um boné em homenagem a Trump, é seu maior pesadelo nos últimos dias. Hoje, o estado que ele governa é o maior exportador brasileiro para os EUA, com quase US$ 6,5 bilhões em vendas.
Boa parte da produtividade da indústria paulista depende dessas exportações, que serão radicalmente prejudicadas com as taxas provocadas pela família Bolsonaro.
Tarcísio cometeu um erro a mais: quando a carta chegou, foi a um encontro com o ex-presidente para conversar sobre o tema e acabou se vinculando ainda mais ao problema, em vez de ser relacionado à solução.
Análise de especialista
Em entrevista ao programa Passando a Limpo, na Rádio Jornal, o cientista político Adriano Oliveira foi além.
“Tarcísio de Freitas, na semana passada, defendeu o presidente Bolsonaro e, no outro dia, recuou. Ou seja, ele está deixando muito claro que não tem condições mínimas de ser presidente da República, porque não tem autoridade, não tem opinião própria. É isso que ele está mostrando para o centrão. Ele poderia ser uma candidatura alternativa ao presidente Lula se caminhasse pelo centro, mas, no momento em que mostra que não tem opinião, que não tem autonomia e que é um devedor eterno dos favores de Bolsonaro, ele não tem a menor condição de ser presidente”, explicou Adriano.