Cena Política | Análise

No embate entre Executivo e Legislativo, Pernambuco é o galho frágil

Um governo técnico sem articulação política é um plano sem pernas. Em Pernambuco, a falta de equilíbrio trava a gestão e fortalece o impasse.

Por Igor Maciel Publicado em 09/07/2025 às 20:00

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Dois tigres estão em cima de um galho em uma árvore e começam a brigar. Quem certamente vai sair perdendo? A árvore. Porque, muito provavelmente, os dois vão quebrar o galho e vão cair. Ambos escolheram brigar, então quem sair machucado assumiu o risco e é adulto para ir lamber suas feridas no fim da confusão.

O prejuízo fica mesmo é com a árvore, que estava quieta no lugar dela, foi dar plataforma aos dois brigões, não ganhou nada e ainda perdeu parte de sua estrutura.

Essa é a imagem que vem à cabeça ao observar a briga entre o Palácio do Campo das Princesas e a Assembleia Legislativa em Pernambuco. Ao fim e ao cabo, os integrantes dos poderes Executivo e Legislativo vão lamber suas feridas em suas tocas, mas os pernambucanos podem sair com grande prejuízo estrutural.

Governo técnico

Desde 2023, Raquel Lyra (PSDB) se propôs a fazer um governo técnico, deixando a política em segundo plano. É a escolha legítima de alguém que pretende reduzir as interferências dos interesses não republicanos e privilegiar os resultados. Se fosse em outro momento, estaria dando muito certo para Pernambuco e para a governadora. Há, porém, um fator que impede esse resultado: a inflação das emendas parlamentares.

Isso poderia ter sido detectado desde o início para que ajustes fossem feitos no governo. Mas a forma como se escolheu lidar com a situação foi a pior possível. Ao invés de contornar, o Palácio dobrou a aposta afastando os políticos e apostando nos técnicos para fazer entregas.

Técnicos e os muros

Há um mito sobre quadros técnicos serem muito eficientes operando dentro de estruturas cuja base é predominantemente política. Não são. Os seres humanos em cargos de poder são vaidosos por natureza, mas o político é obrigado, por ofício e sobrevivência eleitoral, a fingir que não é vaidoso. Isso o força a dialogar e construir pontes. A cooperação é uma das chaves da evolução humana.

Já o quadro técnico, com poucas exceções, quando num cargo de poder, fica encastelado em seu próprio conhecimento e constrói muros. Como a gestão pública é uma atividade social em essência, a chance de ele apresentar resultados bem comprometidos com o prazo de um mandato acaba sendo menor, embora ele entenda muito do trabalho.

Exceção existe

Você pode estar se perguntando se um governo com muitos quadros técnicos necessariamente vai dar errado. A resposta é que não. Ele pode dar muito certo como ocorreu com Jarbas Vasconcelos. Há secretários técnicos daquela época, de mais de 20 anos atrás, que são referências em Pernambuco até os dias de hoje, porque tiveram muito sucesso na gestão pública.

A fórmula de Jarbas deu certo porque ele delegava sem desconfiar e fiscalizava sem amedrontar. Mas deu certo, principalmente, porque em paralelo ao time de técnicos havia um quadro de políticos no governo, formado por representantes de várias regiões e grupos diferentes, com liberdade para negociar politicamente e sendo responsabilizados pelos resultados, para o bem ou para o mal.

A política se afastou

Raquel Lyra foi eleita com o apoio de quase todos os grupos políticos regionais de Pernambuco. Mas a escolha por quadros técnicos e a forte centralização da gestão acabaram expulsando eles de seu entorno. Hoje, ao menos por enquanto, a maioria está na oposição. Se estivessem dentro do governo, com liberdade para trabalhar a política, os técnicos em posições essenciais estariam trabalhando com muita tranquilidade e os atritos com o Legislativo seriam menores.

Momento exige políticos

Esse formato, mais político e menos técnico, seria ainda mais necessário no contexto atual, inédito, do empoderamento que o Legislativo alcançou pelas emendas parlamentares. A regra é clara: quanto mais salgada for a comida, mais cara será a água. A relação entre os dois poderes nunca foi tão salgada. A solução para ter alguma harmonia nunca foi tão cara.

E só é possível amenizar esse custo construindo pontes ao invés de muros, negociando para aproximar em detrimento de qualquer imposição. Coisa que os políticos conseguem fazer e os técnicos não.

Falta pouco tempo

Na véspera da festa, a roupa é mais cara. Tudo é mais difícil de resolver quando se vê que faltam menos de 18 meses para a eleição. Mas ainda é possível adaptar o governo para ter um perfil mais político e menos centralizado.

Para desarmar a Alepe e destravar a pauta de interesse do governo, e de Pernambuco, o que não funciona é acirrar o embate e escalar a briga como tem sido feito.

A verdade é que, até agora, a equipe política do Palácio não conseguiu conduzir essa conversa e, é um fato, ao menos por enquanto perdeu as condições de recuperar a relação. Novos interlocutores, políticos e com liberdade para agir, precisam ser designados.

Do outro lado, a Alepe precisa provar que está disposta ao diálogo e não trabalha apenas para atrapalhar.

Estarão todos dispostos a entender que preservar a árvore é a única coisa que importa nessa briga?

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