A "demissão silenciosa" de Haddad que sobrou para Gleisi Hoffmann
Gleisi está vivendo um dia na pele do colega para entender o que ele passa quando é pressionado por saídas e, ao sair, recebe pauladas de todos.

Parlamentares no Congresso Nacional derrubaram vetos de Lula (PT) e o resultado deve ser um aumento nas contas de luz dos consumidores. Agora, quer adivinhar de onde vieram boa parte dos votos que contrariaram as decisões do presidente e provocaram isso? Do próprio PT. É importante entender um contexto que tem a ver com a saída de Haddad, em férias, num momento crítico da relação entre Executivo e Legislativo.
O ministro da Fazenda vinha fazendo um duplo papel em que organizava toda a parte técnica e depois ia discutir os detalhes com o Congresso. Essa atuação, técnica e política, gerava ciúmes entre os petistas que, preocupados em evitar sua ascensão como sucessor de Lula, trabalhavam contra. Gleisi Hoffmann, quando ainda era presidente nacional do PT, era quem mais agia nesse sentido.
Quiet quitting
Depois de muito apanhar, o ministro começou a fazer algo que os jovens da Geração Z chamam de “quiet quitting” ou “demissão silenciosa” numa tradução aproximada do inglês. Na prática, é fazer apenas o estritamente acordado em contrato de trabalho, sem qualquer esforço além do que está registrado como obrigação. É o mínimo necessário para não ter que pedir demissão e nem ser demitido por justa causa.
Só o necessário
Haddad simplesmente cumpriu suas obrigações com os números e saiu de férias. Deixou a política com a equipe política. Inclusive com Gleisi, que hoje cuida da articulação entre Executivo e Legislativo. Foi na esteira dessas negociações que o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos), desengavetou os vetos para serem derrubados e fez um acordo com Gleisi. A derrubada dos vetos favorece o lobby do setor elétrico e agrada os parlamentares que se beneficiam desse apoio na Casa.
Ao mesmo tempo, Gleisi acertou a liberação de emendas num valor bilionário para o Legislativo, tudo para amaciar a decisão dos deputados sobre o corte de gastos e sobre o aumento de impostos que a Fazenda preparou.
Gleisi
Por causa disso, a responsável pelas Relações Institucionais está sendo criticada dentro do próprio partido e pelos colegas de Palácio do Planalto. Militantes petistas a acusam de ter feito um acordo que pode anular a capitalização política do benefício que Lula anunciou há pouco tempo, de zerar a conta de luz para consumidores de baixa renda.
Também está sendo acusada de ajudar a pressionar ainda mais a classe média, que é um dos alvos do governo numa tentativa de melhorar a popularidade. Por causa do acordo, lideranças petistas como Jaques Wagner (PT), Randolfe Rodrigues (PT) e José Guimarães (PT) votaram para encarecer a conta de luz junto com o centrão e o bolsonarismo.
Na pele
Gleisi Hoffmann está vivendo um dia na pele de Fernando Haddad para entender o que ele passa quando é pressionado a encontrar saídas e, ao sair, recebe pauladas por todos os lados. Em sua última ida ao Congresso, foi atacado com fervor pela oposição e não recebeu apoio dos colegas de governo, repetindo o que já havia acontecido com Marina Silva (Rede) dias atrás. Gleisi, a essa altura, já deve ter visto que não é uma vida fácil, enquanto o colega de governo e de partido, sorrindo, assiste a tudo de algum hotel.
Ele volta ao trabalho amanhã. Agora é saber se vai se empenhar ou seguir copiando a Geração Z.