Brasil corre para fechar pacotes da COP30 até quarta e sexta e destravar acordo climático
Com a participação do vice-presidente Geraldo Alckmin, a presidência da COP30 expôs a linha de atuação do Brasil para avançar nas negociações
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Belém - Na semana decisiva da COP30, em Belém, o Brasil reforçou publicamente seu papel de articulador de um grande acordo político para destravar as negociações climáticas. Em entrevista coletiva, o vice-presidente da República, Geraldo Alckmin, o presidente da conferência, André Corrêa do Lago, a CEO da COP30, Ana Toni, a ministra do Meio Ambiente e Mudanças Climáticas, Marina Silva, e o secretário de Clima, Energia e Meio Ambiente do Itamaraty, embaixador Mauricio Lyrio, detalharam a estratégia brasileira para fechar um “pacote” de decisões até o fim da cúpula e reforçaram que o governo brasileiro espera realizar, em Belém, a COP da implementação.
Pacote será negociado em duas etapas
André Corrêa do Lago explicou que a presidência da COP30 está organizando as negociações em torno de um pacote que reúna parte dos temas em consulta e os principais pontos políticos da conferência, entre eles a atualização de compromissos e a transição justa.
Na prática, a presidência está conduzindo as negociações finais em dois grandes blocos. O primeiro, previsto para ser fechado até a metade da semana, reúne os quatro temas com mandato formal desta COP — financiamento via Banco Mundial e instituições multilaterais, medidas unilaterais e comércio, atualização das NDCs e regras de transparência. Esse conjunto funciona como a base técnica obrigatória da conferência.
O segundo pacote, previsto para sexta-feira (21), concentra o resultado político da COP30, como diretrizes para implementar o balanço global (GST), transição justa, financiamento climático ampliado, metas de mitigação e energias renováveis, além de temas transversais como gênero e tecnologia. Em resumo: o pacote 1 fecha o essencial técnico; o pacote 2 define o acordo político que sairá de Belém.
“Nós vamos procurar antecipar ao máximo os resultados da COP em dois pacotes. Um pacote que vamos buscar fechar até a metade da semana e um segundo pacote que vamos tentar fechar na sexta-feira”, afirmou.
O presidente da COP30 relatou ainda que os negociadores deram apoio à proposta de organizar os trabalhos dessa forma, o que exigirá estender reuniões para o período noturno e ajustar a rotina das delegações.
Ana Toni detalhou como ministros de diferentes países foram designados para atuar como facilitadores em temas-chave das negociações. Na adaptação, por exemplo, o trabalho será acompanhado por representantes da Alemanha e da Gâmbia; em finanças, por ministros do Reino Unido e do Quênia. Outros grupos foram montados para transição justa, tecnologia, gênero e para o GST (Global Stocktake), o balanço global da implementação do Acordo de Paris.
Sair da dependência dos fósseis
O embaixador Mauricio Lyrio aproveitou a coletiva para contextualizar o “mapa do caminho” citado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em seus discursos na COP30. A expressão está diretamente relacionada à decisão adotada na COP de Dubai, quando o balanço global de implementação do Acordo de Paris reconheceu a necessidade de uma transição para longe dos combustíveis fósseis.
“O mapa do caminho, nas palavras do presidente Lula, se refere a sair da dependência de fósseis. Isso se relaciona a uma decisão tomada na COP de Dubai, que traz iniciativas na área de energia com vistas ao combate à mudança do clima”, explicou Lyrio.
Ele ressaltou que o processo será necessariamente coletivo, envolvendo todos os países, e que ainda está em fase inicial de negociação. O ritmo, segundo o diplomata, será determinado pela construção de consenso entre as 198 partes da Convenção do Clima.
“É um processo complexo, que toca em dificuldades de vários países, tanto pelo lado da produção quanto do consumo. Não dá para antecipar o resultado. O mais importante é a direção apontada, com fortalecimento do multilateralismo”, disse.
Marina Silva destacou o caráter "potente" da proposta brasileira, que, segundo ela, dialoga com a decisão de Dubai e pode marcar uma nova etapa das conferências climáticas ao atacar a raiz do problema, que é a queima de combustíveis fósseis. Para ela, o mapa do caminho abre a possibilidade de uma construção comum de uma transição justa.
“Talvez seja a chance de fortalecimento e revitalização do multilateralismo em torno dessa ideia potente que o presidente Lula colocou”, afirmou. Numa metáfora, Marina comparou o esforço coletivo à construção de uma “arca do caminho”. “Eu gosto das metáforas. É como uma espécie de arca de Noé, para que a gente possa olhar para nós mesmos e dizer: cada um de nós construiu esse processo. Só que agora não é uma arca, é um mapa do caminho para onde ela pode se direcionar.”
Pressão por resultados na reta final
Marina também chamou atenção para o peso da fase em que a COP30 entrou, com a entrada no jogo do segmento de alto nível ministerial. Depois da etapa de cúpula de chefes de Estado, quando foram dadas as grandes mensagens políticas, cabe agora aos ministros e negociadores transformar esse sinal em textos concretos.
“Entramos, com certeza, numa fase de operação dos vários temas que estão sobre a mesa. Buscamos viabilizar os melhores resultados das diferentes agendas”, avaliou, reconhecendo que o processo gera tensões e exige mais esforço de diálogo.
Descarbonização da indústria
Na coletiva, o vice-presidente listou iniciativas que o governo brasileiro está levando à COP30, especialmente na área de transição ecológica da indústria e da economia real. Ele citou o lançamento da Estratégia Nacional de Descarbonização da Indústria (ENDI), cuja consulta pública foi aberta nesta segunda-feira e seguirá até 17 de janeiro. A proposta reúne um conjunto de regras e protocolos para reduzir as emissões industriais no país.
Alckmin também mencionou programas de reciclagem, com foco na rastreabilidade de produtos e no aumento da reutilização de materiais como o alumínio, ressaltando que o metal pode ser reciclado infinitas vezes sem perda de qualidade. Outra frente destacada foi o programa “Coopera Mais Amazônia”, que prevê recursos do Fundo Amazônia e do Sebrae para fortalecer a bioeconomia na região, com apoio à produção e agregação de valor a itens como açaí, cupuaçu e castanhas, beneficiando milhares de famílias extrativistas.
Na área automotiva, o vice-presidente destacou medidas para incentivar veículos mais limpos, como o IPI zero para os “carros sustentáveis” — com limite de emissões e alto índice de reciclabilidade — e o IPI verde, que reduz imposto para veículos elétricos e flex menos poluentes. “O Brasil quer ser protagonista na transição energética, nos biocombustíveis e no SAF para aviação”, afirmou.