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Operação mais letal no Rio tem 64 mortos e mais de 80 presos em dia de 'guerra'

Deflagrada após mais de um ano de investigação e 60 dias de planejamento, a operação cumpriu centenas de mandados de prisão e de busca e apreensão

Por JC Publicado em 29/10/2025 às 0:14

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*Com agências

O Governo do Estado do Rio de Janeiro deu início, nesta terça-feira (28), à maior ação integrada das forças de segurança dos últimos 15 anos. A Operação Contenção mobilizou policiais civis e militares nos complexos do Alemão e da Penha, na Zona Norte da capital fluminense. O objetivo era capturar lideranças criminosas e conter a expansão territorial do Comando Vermelho. Considerada a operação mais letal já realizada no Rio, a ação deixou, até então, 64 mortos e 81 presos.

Deflagrada após mais de um ano de investigação e 60 dias de planejamento, a operação cumpriu centenas de mandados de prisão e de busca e apreensão expedidos pela Justiça a partir de inquéritos da Delegacia de Repressão a Entorpecentes (DRE). A ação contou com o apoio do Ministério Público Estadual e cumpre todas as medidas determinadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no âmbito da ADPF 635, como o uso de câmeras operacionais corporais e apoio de ambulâncias na região, segundo o governo estadual.

Na operação desta terça, cerca de 2,5 mil policiais civis e militares participaram da ofensiva. No Alemão e na Penha, pelo menos 87 escolas tiveram as atividades afetadas - 48 nem chegaram a abrir. O total de alunos impactados foi de 29 mil. O Comando Vermelho reagiu e lançou bombas por meio de drones, o que transformou a região em um cenário de guerra, com reflexos em importantes vias da cidade, como a Avenida Brasil e a Linha Amarela.

Além de atingir o CV e o narcotráfico, a operação também visou a apreensão de armamento usado pela facção criminosa e, até a última atualização anunciada pelo governador Cláudio Castro (PL), 93 fuzis haviam sido apreendidos pelas forças policiais.

DIVULGAÇÃO PMERJ
Apreensão de fuzis pela Polícia Militar do Rio de Janeiro - DIVULGAÇÃO PMERJ

Segundo disse o governador Cláudio Castro no início da noite, a ação não tinha hora para terminar. Por volta das 18h30, novo intenso tiroteio foi registrado na região. Porém, por volta das 22h, a secretaria de Segurança afirmou que os policiais estavam desmobilizando a operação nos complexos da Penha e Alemão, após cerca de 17 horas.

Enquanto relatava a situação no Complexo do Alemão, o líder comunitário Raull Santiago contou ouvir diversas trocas de tiros e ver caveirões pela rua. "Quem está na ponta está vendo os 60 corpos, as crianças estão vendo os 60 corpos", disse. "Fora a quantidade de pessoas baleadas, fora a quantidade de áreas destruídas, fora saber que você não está tendo aula, que não conseguiu trabalhar, que não conseguiu dar um passo digno de direito por conta de todo esse processo que está rolando", completou.

Mais de 110 mil pessoas moram nas regiões dos complexos do Alemão e da Penha, alvos da megaoperação policial contra o Comando Vermelho.

De acordo com dados da Prefeitura, com base no Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 54 mil pessoas vivem no conjunto de favelas que formam o Complexo do Alemão. Já na Penha, são 58.516 moradores (esse número é referente a todo o bairro, e não apenas ao complexo de favelas).

A geografia acidentada do Complexo do Alemão facilitou a concentração de criminosos do Comando Vermelho no local e, ao longo das últimas décadas, a polícia já fez várias incursões na área. Em 2002, por exemplo, a morte do jornalista Tim Lopes levou à prisão e à caça do traficante Elias Maluco. Em 2007, o Alemão recebeu uma operação policial que mobilizou 1.350 agentes e deixou 19 mortos.

Três anos depois, 2,6 mil agentes, entre policiais militares, civis, federais e homens das Forças Armadas, participaram da invasão ao Alemão após uma onda de violência no Rio em uma reação às Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs).

Vias interditadas

A ação desta terça-feira repetiu cenas de guerras e expôs o poder crescente do crime organizado no País e as dificuldades do poder público de reprimir o narcotráfico, com efeitos violentos para os moradores das comunidades pobres.

A Prefeitura do Rio anunciou que a cidade entrou em Estágio 2, devido a ocorrências policiais que interditam de forma intermitente ruas da zona norte, oeste e sudoeste da capital fluminense.

Esse estágio de risco é acionado, dentro dos estágios operacionais da cidade, quando há ocorrências "de alto impacto" por conta "de um evento previsto ou a partir da análise de dados provenientes de especialistas"; são ocorrências descritas com "elevado potencial de agravamento".

BALANÇO DA OPERAÇÃO

  • 60 suspeitos mortos em confronto. Dois eram da Bahia; outro, do Espírito Santo.
  • 2 policiais civis e 2 policiais militares foram mortos. Outros 15 policiais ficaram feridos.
  • 3 inocentes foram feridos: um homem em situação de rua; uma mulher que estava em uma academia, e um homem que estava num ferro-velho.
  • 81 pessoas foram presas.
  • Policiais apreenderam 93 fuzis, 2 pistolas e 9 motos.

Entre os mais de 80 presos, foram revelados os nomes de Thiago do Nascimento Mendes, o Belão do Quitungo, um dos chefes do Comando Vermelho da região. Outro capturado foi Nicolas Fernandes Soares, que é apontado pela polícia como operador financeiro de um dos altos chefes do CV, Edgar Alves de Andrade, o Doca ou Urso.

MORTES DE POLICIAIS

A megaoperação deflagrada pelas policias Civil e Militar do Estado do Rio de Janeiro nos complexos do Alemão e da Penha deixou ainda entre os mortos quatro policiais.

Integrantes do Batalhão de Operações Policiais (Bope), os sargentos Cleiton Serafim Gonçalves, de 42 anos, e Heber Carvalho da Fonseca, 39, faleceram durante confronto com criminosos. Os dois foram encaminhados ao Hospital Getúlio Vargas, mas não resistiram.

Segundo o Bope, Serafim foi baleado na região do abdômen. Ele ingressou na Corporação em 2008. "O Sargento Serafim dedicou sua vida ao serviço público, honrando a farda com coragem, lealdade e compromisso inabalável com a segurança da sociedade. Seu sacrifício representa a mais nobre expressão do dever policial: proteger e servir, mesmo diante do maior dos riscos. Que seu exemplo de bravura e dedicação permaneça vivo na memória de todos nós", afirmou o batalhão em comunicado nas redes sociais. Ele deixa esposa e uma filha.

A instituição também lamentou a morte de Fonseca, que ingressou na corporação em 2011. "Sargento Heber dedicou sua vida ao cumprimento do dever e deixa um legado de coragem, lealdade e compromisso com a missão policial militar. Sua ausência será sentida por todos que tiveram a honra de conhecê-lo", diz o texto. Ele deixa esposa, dois filhos e um enteado.

Ainda não há confirmação sobre o horário e o local do sepultamento dos militares.

Outros dois policiais civis também morreram durante a operação. Marcos Vinicius Cardoso Carvalho, de 51 anos, conhecido como Máskara, foi baleado e encaminhado ao Hospital Getúlio Vargas, mas não resistiu aos ferimentos. Carvalho chefiava o setor de investigações do 53ª DP (Mesquita).

O policial Rodrigo Velloso Cabral, 34, lotado no 39ª DP (Pavuna) também morreu logo após chegar ao hospital. A delegacia da Pavuna fica localizada numa das áreas mais violentas da capital. Ele estava há apenas dois meses na instituição.

"A Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro lamenta profundamente a perda de nossos heróis, que deram suas vidas em defesa da sociedade durante a Megaoperação Contenção, na Zona Norte do Rio", afirmou a corporação em nota.

Ao todo, oito agentes foram feridos durante a operação, segundo levantamento do Instituto Fogo Cruzado.

 
 

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