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Defesa de Bolsonaro espera redução de pena através de princípio jurídico da absorção, avalia especialista

Para o criminalista Victor Pontes, penas acima de 30 anos seriam desproporcionais e a defesa deve apostar no princípio da consunção

Por Eduardo Scofi Publicado em 08/09/2025 às 10:34 | Atualizado em 08/09/2025 às 10:39

O julgamento do núcleo considerado mentor da trama golpista começou na semana passada e será retomado nesta terça-feira (9), quando a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal iniciará a votação que pode levar à condenação de Jair Bolsonaro e outros sete aliados.

A denúncia envolve a elaboração da “minuta do golpe”, a suposta conspiração para sequestrar autoridades e a ligação com os atos golpistas de 8 de janeiro.

Segundo o advogado criminalista e mestre em Direito, Victor Pontes, uma das linhas possíveis de argumentação por parte das defesas é a aplicação do princípio da consunção, também chamado de absorção, que ocorre quando um crime é englobado por outro mais grave.

Isso faz com que o réu seja responsabilizado apenas pelo crime mais abrangente e severo, resultando em uma pena única e proporcional.

“Esse princípio é aplicado em situações de conflito aparente de normas, quando um crime é meio para a prática de outro crime fim. Se um indivíduo falsifica um cheque para cometer estelionato, por exemplo, ele responde apenas pelo estelionato. A lógica seria semelhante neste julgamento: um crime poderia absorver o outro”, explicou o advogado em entrevista ao programa Passando a Limpo, da Rádio Jornal, nessa segunda (8).

Reprodução/Redes Sociais Victor Pontes
Victor Pontes - Reprodução/Redes Sociais Victor Pontes

Apesar disso, ele destaca que a tese dificilmente será aceita em sua totalidade.

“Essas teses de mérito acabam funcionando como subsidiárias, isto é, pedidas quando as principais não são acolhidas pelo tribunal. Mas é natural que os advogados levantem todas as possibilidades para tentar reduzir o impacto da condenação”, disse.

Ouça a entrevista na íntegra

As penas dos réus

As penas também estão no centro do debate. Réus já julgados receberam entre 15 e 17 anos de prisão, mas a tendência é que os acusados apontados como mentores da trama recebam sanções mais altas. Ainda assim, a discussão sobre proporcionalidade não deve ser ignorada.

“Há um padrão nas condenações de réus já julgados, entre 15 e 17 anos. Esse primeiro núcleo, por ser o grupo considerado mentor, deve receber penas mais altas. Mas considero desproporcional falar em 30 anos. Para se ter uma ideia, um homicídio qualificado, que é um dos crimes mais graves do ordenamento, tem pena de 12 a 13 anos. É importante manter a proporcionalidade”, ponderou Pontes.

Do ponto de vista técnico, diferentes tipificações penais podem impactar diretamente na pena final. A defesa busca enquadramentos menos severos, mas acusações como organização criminosa e dano ao patrimônio público seguem no processo.

“Do ponto de vista da defesa, o mais favorável seria a manutenção da acusação de tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito, que tem pena menor. Já a imputação de crimes como organização criminosa, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado eleva a pena para patamares que podem chegar a 30 anos. Isso não deve impedir a condenação, mas pode alterar significativamente o tempo final”, concluiu.

Ministro Luiz Fux

O voto do ministro Luiz Fux também desperta atenção. Ele é visto como uma voz mais imparcial dentro da Corte, em comparação com outros ministros que já se posicionaram de maneira mais firme, na visão do advogado.

“O Ministro Luiz Fux até pode ter essa divergência, até pode votar pela absolvição de Jair Bolsonaro, mas não seria suficiente para formar uma maioria”, avaliou Pontes.

Já sobre a delação do tenente-coronel Mauro Cid, outro ponto central do processo, apesar das críticas quanto à sua forma, que não teria transmitido total espontaneidade, a tendência é de que ela seja aproveitada pelo tribunal. “A forma como essa delação foi feita levanta dúvidas, pois não pareceu algo totalmente espontâneo ou voluntário. Ainda assim, não acredito que os ministros irão anulá-la", afirma. 

Há ainda a possibilidade de algum ministro apresentar pedido de vista, mecanismo que suspende temporariamente o julgamento para análise mais detalhada. Esse recurso, embora esperado por aliados do ex-presidente, dificilmente se prolongará ao limite de 90 dias.

“É possível que isso ocorra, até porque existe essa expectativa entre os apoiadores do ex-presidente. Mas dificilmente um pedido de vista se estenderia pelos 90 dias previstos, porque o ministro ficaria pressionado, tanto pela imprensa, quanto internacionalmente. Se houver, deve ser por um período mais curto”, explicou.

STF / AFP
O ministro Luiz Fux - STF / AFP

O julgamento

A Primeira Turma do STF retoma nesta semana o julgamento do núcleo 1 da trama golpista, formado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro e sete aliados, em um processo que pode resultar em penas superiores a 30 anos de prisão.

Os réus são acusados de planejar a chamada “minuta do golpe” e o plano “Punhal Verde e Amarelo”, com ações voltadas ao sequestro e assassinato de autoridades, tentativa de reverter o resultado das eleições de 2022 e ligação com os atos golpistas de 8 de janeiro de 2023.

Quem são os réus:

  • Jair Bolsonaro – ex-presidente da República
  • Alexandre Ramagem – ex-diretor da Abin
  • Almir Garnier – ex-comandante da Marinha
  • Anderson Torres – ex-ministro da Justiça e ex-secretário de segurança do DF
  • Augusto Heleno – ex-ministro do GSI
  • Paulo Sérgio Nogueira – ex-ministro da Defesa
  • Walter Braga Netto – ex-ministro de Bolsonaro e candidato à vice em 2022
  • Mauro Cid – ex-ajudante de ordens de Bolsonaro

O relator, ministro Alexandre de Moraes, iniciará a análise pelas questões preliminares, como pedidos de nulidade da delação de Mauro Cid e alegações de cerceamento de defesa, antes de votar sobre o mérito do processo.

A votação será feita pelos cinco integrantes da turma, e a maioria de três votos definirá condenação ou absolvição. Em caso de sentença condenatória, a prisão não será automática, e os réus ainda poderão apresentar recursos, como embargos de declaração, antes da efetivação da pena.

Com informações da Agência Brasil.

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