Julgamento de Bolsonaro acirra crise e Lula e Trump devem evitar encontro na ONU
Professora de Relações Internacionais afirmou que tensão entre países é tão grande que a ONU organizou bastidores para que delegações não se encontrem

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A condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro por tentativa de golpe de estado no Supremo Tribunal Federal (STF) elevou a preocupação sobre os efeitos da decisão nas relações entre Brasil e Estados Unidos, especialmente diante da ameaça de novas sanções comerciais.
Como se sabe, a tarifação de 50% nas exportações brasileiras ao país, em vigor desde o início de agosto, tem como plano de fundo, segundo o presidente Donald Trump, o interesse americano na defesa do ex-presidente.
Para a professora de Relações Internacionais do Instituto Mauá de Tecnologia (IMT), Flávia Loss, existe atualmente uma "anormalidade diplomática" entre Brasil e Estados Unidos, marcada pelo fechamento dos canais tradicionais de negociação entre os dois governos.
Em entrevista ao programa Passando a Limpo, da Rádio Jornal, nesta segunda-feira (15), ela afirmou que os canais diplomáticos tradicionais estão fechados, o que dificulta as negociações e amplia as incertezas sobre o futuro das relações bilaterais.
"Anos atrás seria impensável essa situação, pois os canais estão fechados. Quais canais? Os diplomáticos, os tradicionais, aqueles que os países sempre usaram para decidir, por exemplo, sobre tarifas. O Brasil está tentando o tempo todo negociar por esses canais, mas isso não tem funcionado", destacou.
A professorada lembrou que, nos Estados Unidos o presidente possui maior poder para tratar da política comercial sem tanta interferência do Congresso, o que concentra as decisões em Donald Trump.
“Se ele fecha os canais de negociação, a gente fica na situação em que estamos. O que precisamos mesmo é de uma conversa direta entre os presidentes”, acrescentou.
Sem encontro na ONU
Flávia Loss também afirmou que a tensão entre os dois países é tão grande que a ONU organizou os bastidores para que as delegações brasileira e norte-americana não se encontrem nos corredores.
"O encontro entre eles ou entre as delegações ou entre os presidentes nesse momento, pode ser muito tenso, né? Geralmente esse tipo de encontro é muito planejado pelos diplomatas anteriormente, mesmo encontro nos corredores", apontou.
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Ela também destacou a relevância do discurso que o presidente Lula fará na abertura da Assembleia Geral da ONU. "Vai ser um discurso muito importante, é interessante que todo mundo acompanhe. A ideia do presidente Lula é defender a soberania brasileira, falar sobre tarifas e reforçar o multilateralismo, que é tradicional na política externa brasileira”, explicou.
A professorada ressaltou que a atenção estará voltada para eventuais gestos de aproximação com os Estados Unidos. “O que vamos observar é se Lula fará um aceno de proximidade, de tentativa de negociação. Não quer dizer que Donald Trump vá reagir a esse aceno”, afirmou.
Possíveis novos alvos de sanções
Ao projetar os próximos passos dos EUA após a condenação de Bolsonaro, Flávia Loss acredita que novas sanções devem atingir não apenas o governo, mas também políticos brasileiros.
“Parece que o governo dos Estados Unidos vai reagir com sanções nos políticos brasileiros. A aposta é essa: de novo, a questão dos vistos, passaportes, tentando atingir o Congresso. Ao contrário do que foi feito até agora, que focou no STF, a ideia é pressionar o Legislativo para não aprovar medidas de Lula ou até apoiar de outras formas o próprio Bolsonaro”, analisou.
Eduardo Bolsonaro e a influência sobre Trump
Ao ser questionada sobre a atuação do deputado federal Eduardo Bolsonaro, que afirmou que os Estados Unidos poderiam até intervir militarmente no Brasil, Flávia Loss considerou improvável qualquer ação nesse sentido.
“É inegável que ele tem uma proximidade muito grande com o gabinete que cerca Trump, mas isso não necessariamente envolve pessoas ligadas à diplomacia. Todos os países têm dificuldade de negociar com Trump. Até a União Europeia saiu muito prejudicada”, avaliou.
Sobre a hipótese de intervenção militar, a professora rejeitou o cenário: “Na minha análise isso é muito difícil de acontecer. Uma ação militar não é simples, mobiliza tropas, exige muito dinheiro. Não vejo essa ameaça em relação ao Brasil, nem de longe. Parece fantasioso”, concluiu.