Moraes aponta violações e ordena prisão domiciliar de Bolsonaro
Moraes determinou a proibição de visitas, salvo dos advogados do ex-presidente e com procuração nos autos, além de outras pessoas autorizadas

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O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou nesta segunda-feira (4) a prisão domiciliar do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) por violação de medidas cautelares inicialmente previstas pela Corte. Além disso, Moraes determinou a apreensão dos celulares de posse do ex-presidente, que é réu em ação penal acusado de liderar um plano de golpe de Estado no País após a eleição de 2022. O ministro apontou descumprimento deliberado por Bolsonaro das medidas restritivas, a última vez durante os atos por anistia realizados no domingo passado (3).
Conforme mostrou o Estadão, durante a manifestação realizada em Copacabana, o ex-presidente discursou por meio de um contato pelo telefone com seu filho, o deputado federal Flávio Bolsonaro (PL-RJ), que publicou um vídeo da declaração em suas redes sociais. No ato em São Paulo, o deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) mostrou Bolsonaro em uma videochamada. Moraes havia determinado que Bolsonaro não poderia usar as redes, mesmo por meio de terceiros.
Na decisão o ministro afirmou que "agindo ilicitamente, o réu Jair Messias Bolsonaro se dirigiu aos manifestantes reunidos em Copacabana, no Rio de Janeiro, produzindo dolosa e conscientemente material pré-fabricado para seus partidários continuarem a tentar coagir o Supremo Tribunal Federal e obstruir a Justiça, tanto que, o telefonema com seu filho, Flávio Nantes Bolsonaro, foi publicado na plataforma Instagram"
O ministro também disse que "o réu Jair Messias Bolsonaro realizou ligação telefônica, por chamada de vídeo, com seu apoiador político e deputado federal Nikolas Ferreira, demonstrando o desrespeito a decisão proferida por esta Suprema Corte, em razão do claro objetivo de endossar o tema da manifestação de ataques ao STF", escreveu Moraes.
Para o ministro, houve uma "atuação coordenada dos filhos de Jair Messias Bolsonaro a partir de mensagens de ataques ao Supremo Tribunal Federal, com o evidente intuito de interferir no julgamento da AP 2.668/DF (ação penal do golpe)".
A decisão destaca que "réu que descumpre deliberadamente as medidas cautelares - pela segunda vez - deve sofrer as consequências legais".
GARAGEM E CELULAR APREENDIDO
A Polícia Federal foi enviada à casa de Bolsonaro, em Brasília, e confirmou que foram cumpridos os mandados de prisão domiciliar e busca e apreensão. O Estadão apurou que um telefone do ex-presidente foi apreendido.
A equipe da Polícia Federal não precisou entrar na casa de Bolsonaro para cumprir os mandados. Os policiais abordaram o ex-presidente quando ele estava chegando na garagem de sua casa, dentro do condomínio. Na ação, a PF comunicou a ordem de prisão domiciliar e informou a necessidade de apreensão do aparelho celular de Bolsonaro. De acordo com os investigadores, o ex-presidente entregou o telefone ainda na rua, em frente à garagem de sua casa.
Moraes determinou a proibição de visitas a Bolsonaro, salvo dos advogados do ex-presidente e com procuração nos autos, além de outras pessoas previamente autorizadas pelo Supremo. E também vetou o uso de celular, diretamente ou por meio de terceiros.
Além disso, ficam mantidas a proibição de manter contatos com embaixadores ou quaisquer autoridades estrangeiras, bem como com os demais réus e investigados nas diversas ações penais relacionadas aos processos do golpe e à investigação sobre obstrução de Justiça e a utilização de redes sociais, inclusive por meio de terceiros.
As medidas restritivas contra Bolsonaro - entre elas o uso de tornozeleira eletrônica - foram decretadas em 18 de julho, nove dias após o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, citar o que chamou de "caça às bruxas" contra Bolsonaro na justificativa para a imposição de uma tarifa de 50% aos produtos exportados pelo Brasil. Na ocasião, a decisão representou uma reação da Corte máxima do País, acusada por Trump de perseguir Bolsonaro na ação penal na qual ele é réu por tentativa de golpe de Estado A decisão de Moraes foi ratificada logo depois pela maioria do STF.
Essa decisão foi tomada no âmbito de um novo inquérito instaurado na esteira do tarifaço de Trump. A Petição 14129 foi protocolada no STF no dia 11 julho, dois dias após Trump anunciar a taxação, que deve entrar em vigor nos próximos dias. O inquérito foi distribuído por prevenção a Moraes por ter conexão com outros processos sob relatoria do ministro.
"O flagrante desrespeito às medidas cautelares foi tão óbvio que, repita-se, o próprio filho do réu, o senador Flávio Nantes Bolsonaro, decidiu remover a postagem realizada em seu perfil, na rede social Instagram, com a finalidade de omitir a transgressão legal", afirmou o ministro no despacho de ontem.
Segundo a assessoria do STF, esse tipo de decisão cabe ao relator do processo e não precisa ser confirmada pelos colegas da Corte.
Surpresa
A defesa do ex-presidente afirmou, em nota, que foi surpreendida com a decretação de prisão domiciliar, "tendo em vista que o ex-presidente Jair Bolsonaro não descumpriu qualquer medida"
A manifestação é assinada pelos advogados Celso Vilardi, Paulo Amador da Cunha Bueno, Daniel Tesser. O trio sustenta que Bolsonaro "seguiu rigorosamente" a determinação proferida por Moraes em despacho sobre as medidas cautelares. Os advogados destacaram que o despacho registrou que "em momento algum Jair Messias Bolsonaro foi proibido de conceder entrevistas ou proferir discursos em eventos públicos".
"A frase 'Boa tarde, Copacabana. Boa tarde meu Brasil. Um abraço a todos. É pela nossa liberdade. Estamos juntos' não pode ser compreendida como descumprimento de medida cautelar, nem como ato criminoso", sustentaram os advogados.
A decretação da prisão domiciliar gerou reação indignada de aliados do ex-presidente. No Congresso, parlamentares bolsonaristas reafirmaram a disposição de pressionar o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), para que ele paute o projeto de anistia aos implicados pelo 8 de Janeiro e o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), para colocar em discussão pedidos de impeachment de Moraes.
O presidente nacional do PL, Valdemar Costa Neto, afirmou à Coluna do Estadão que está "inconformado" com a prisão domiciliar o ex-presidente. A ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro (PL) reagiu à prisão domiciliar do marido citando uma passagem bíblica. "E os céus anunciarão a sua justiça; pois Deus mesmo é o Juiz", escreveu Michelle, em uma publicação temporária no Instagram.
Bolão
Pouco antes de ter a prisão domiciliar decretada, Bolsonaro passou a tarde na sede do PL em Brasília. No local, reuniu-se com aliados, organizou um bolão da Mega-Sena com assessores do partido e acompanhou, pela televisão, a repercussão das manifestações do último domingo.
O Estadão conversou com o deputado estadual Lucas Bove (PL-SP), que esteve com o ex-presidente minutos antes da decisão de Moraes. Segundo o parlamentar, Bolsonaro estava mais sério do que o habitual, mas ainda de bom humor, e não demonstrou sinais de que esperava ser preso. Pelo contrário: estava preocupado em chegar em casa antes das 19h, horário em que começava o recolhimento determinado pelo STF.
Por volta das 17h, o ex-presidente deixou a sede do PL às pressas, relatou o deputado. "Ele falou que não podia vacilar, que precisava sair antes para fazer um caminho diferente e não passar perto de embaixadas."
Minutos depois, veio a decisão de Moraes decretando a prisão domiciliar. Quando Bolsonaro chegava em casa, foi abordado por policiais federais ainda na garagem. Eles o comunicaram da ordem de prisão e apreenderam o celular antes que o ex-presidente entrasse na residência.