PGR pede condenação de Bolsonaro por tentativa de golpe de Estado
Segundo a manifestação da PGR apresentada ao STF, Jair Bolsonaro não apenas tinha conhecimento do plano golpista, como liderou suas articulações

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A Procuradoria-Geral da República (PGR) pediu nesta segunda-feira (14) a condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), de seus ex-ministros e militares que, segundo a acusação, integraram o “núcleo crucial” de um plano de golpe de Estado.
A manifestação, apresentada ao Supremo Tribunal Federal (STF) em 517 páginas, foi assinada pelo procurador Paulo Gonet.
Bolsonaro e a Liderança da Trama Golpista
Segundo a PGR, Jair Bolsonaro não apenas tinha conhecimento do plano golpista, como liderou suas articulações. O grupo, liderado por ele e composto por figuras-chave do governo, das Forças Armadas e de órgãos de inteligência, desenvolveu e implementou um plano progressivo e sistemático de ataque às instituições democráticas.
O objetivo era "prejudicar a alternância legítima de poder nas eleições de 2022 e minar o livre exercício dos demais poderes constitucionais, especialmente do Poder Judiciário".
O ex-presidente é apontado como o líder da organização criminosa, o principal articulador, maior beneficiário e autor dos atos executórios mais graves para a ruptura do Estado Democrático de Direito. Bolsonaro teria instrumentalizado a máquina pública e recursos estatais para disseminar dúvidas e deslegitimar o sistema eleitoral.
A recusa em realizar a cerimônia de transmissão da faixa presidencial é vista como um indicativo de seu desinteresse em respeitar as normas democráticas.
Crimes Imputados
Os acusados enfrentam denúncias por crimes como:
- Organização Criminosa Armada (Art. 2º, caput, §§2º e 4º, II, da Lei n. 12.850/2013).
- Tentativa de Abolição Violenta do Estado Democrático de Direito (Art. 359-L do CP).
- Tentativa de Golpe de Estado (Art. 359-M do CP).
- Dano Qualificado pela violência e grave ameaça, contra o patrimônio da União, e com considerável prejuízo para a vítima (Art. 163, parágrafo único, I, III e IV, do CP).
- Deterioração de Patrimônio Tombado (Art. 62, I, da Lei n. 9.605/1998).
A Rede de Conspiração e a "ABIN Paralela"
As investigações revelam que a denúncia não se baseou em conjecturas, pois a organização criminosa se preocupou em documentar quase todas as fases de sua empreitada. Dentre os acusados estão nomes como:
- Alexandre Ramagem (ex-diretor da Abin)
- Almir Garnier (ex-comandante da Marinha)
- Anderson Torres (ex-ministro da Justiça)
- Augusto Heleno (ex-ministro do GSI)
- Mauro Cid (ex-ajudante de ordens da Presidência)
- Paulo Sérgio Nogueira (ex-ministro da Defesa)
- Walter Souza Braga Netto (ex-ministro da Casa Civil de Bolsonaro)
Nomes como Ailton Gonçalves Moraes Barros, Marcelo Mormevet, Mário Fernandes, Márcio Nunes de Resende Júnior, que têm ligação com os já citados, também estão entre os acusados.
Um dos pontos centrais da acusação é a atuação da ABIN (Agência Brasileira de Inteligência) durante o governo Bolsonaro, que teria sido utilizada de forma atípica, com o então Diretor-Geral, Alexandre Ramagem, despachando em uma sala própria no Palácio do Planalto, muitas vezes sem o conhecimento do Gabinete de Segurança Institucional (GSI).
Ramagem teria comandado uma "ABIN Paralela" para coletar informações sobre opositores do presidente e interferir em investigações sensíveis, como as que envolviam os filhos de Bolsonaro. Documentos com anotações de Ramagem e Augusto Heleno mostram a preparação de narrativas para desacreditar o sistema eleitoral e atacar autoridades.
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Planos e documentos golpistas
Ainda segundo a manifestação da PGR, o plano de golpe foi "incessantemente testado pela cúpula de Poder".
Documentos como a "Minuta do Golpe" apreendida na residência de Anderson Torres, ex-ministro da Justiça, detalhavam medidas excepcionais como a decretação de Estado de Sítio e a deflagração de uma Operação de Garantia da Lei e da Ordem (GLO), além de prever a anulação das eleições, prorrogação de mandatos e a substituição do TSE.
Houve diversas reuniões para discutir tais medidas, com a participação de Bolsonaro e comandantes militares. O Brigadeiro Baptista Júnior, comandante da Aeronáutica à época, confirmou em depoimento judicial a intenção de prisão do Ministro Alexandre de Moraes para a efetivação do plano. A minuta golpista, inclusive, previa a prisão de autoridades públicas.
O ex-ministro da Defesa, general Paulo Sérgio Nogueira, apesar de uma equipe técnica não ter encontrado fraudes nas urnas, publicou uma nota insinuando a possibilidade de irregularidades. Ele também apresentou a minuta golpista aos comandantes das Forças Armadas.
A pressão e a culminação em 8 de Janeiro
O documento também descreve a pressão exercida sobre militares que resistiam ao golpe, como o General Freire Gomes (Exército) e o Brigadeiro Baptista Júnior (Aeronáutica).
Walter Braga Netto, ex-ministro da Defesa e ex-candidato a vice-presidente, teria coordenado ataques a esses militares, incitando a disseminação de notícias falsas para atingir a reputação deles, chamando-os de "traidores da pátria".
O Almirante Almir Garnier Santos, da Marinha, por outro lado, teria demonstrado adesão ao plano, colocando suas "tropas à disposição".
Segundo a PGR, os atos de 8 de janeiro de 2023 em Brasília não foram um "mero improvisado, desconexo e amador levante popular espontâneo". Eles foram o desfecho dramático de uma trama delitiva densa, com atos executórios iniciados ainda em 2021.
As omissões de Anderson Torres, Fernando de Sousa Oliveria (Ex-secretário de segurança do DF) e a delegada Marília Ferreira de Alencar no Distrito Federal, apesar de alertas claros sobre as intenções violentas dos manifestantes, evidenciam a "continuidade da contribuição dos denunciados ao projeto antidemocrático".
A viagem de Anderson Torres para os EUA pouco antes dos atos é considerada uma "estratégia deliberada de afastamento e conivência com as ações violentas que se aproximavam".
A Colaboração Premiada de Mauro Cid
Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, firmou um acordo de colaboração premiada, considerado útil ao esclarecimento global dos fatos. Ele confirmou a ciência de Bolsonaro sobre a ação golpista, o monitoramento do Ministro Alexandre de Moraes e a busca por recursos financeiros para as manifestações antidemocráticas.
No entanto, a PGR aponta indícios de condutas incompatíveis com o dever de boa-fé objetiva, como omissões e resistência em reconhecer sua efetiva participação. Por isso, o Ministério Público sugere uma redução mínima da pena, de 1/3, em vez de perdão judicial ou substituição por penas restritivas de direitos.