Editorial JC: Educação incompleta
Maioria esmagadora dos adolescentes não termina o ensino médio na idade adequada, nem com o aprendizado esperado, no país da desigualdade
 
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De tantas demandas sociais amassando o presente, esfumaçando o futuro da sociedade brasileira – como o direito a serviços dignos de saúde e a uma moradia em segurança e com espaço para viver bem – talvez que proporciona o maior obstáculo ao desenvolvimento da nação seja o déficit educacional.
Crianças e adolescentes fora da escola, em ambientes sujeitos ao domínio de bandidos, no vácuo do poder instituído de governos que deveriam estar presentes, são indivíduos expostos à vulnerabilidade de um círculo vicioso. E quando estão dentro das unidades de ensino, infelizmente, a qualidade do que é oferecido, em geral, não supre as necessidades de assimilação, aprendizado e amadurecimento da infância e da primeira juventude.
O resultado é uma prolongada tragédia nacional que se estende em diversas consequências. Entre as quais, a perpetuação da desigualdade, o aprofundamento do fosso entre ricos e pobres, o sequestro de comunidades pelo crime organizado e as dificuldades estruturais para a formação técnica, universitária e científica que constitui a base do crescimento coletivo. Sem educação, não há rota alternativa, e o atraso do país liga as gerações.
A organização Metas Sociais e o Instituto Natura criaram o Índice de Inclusão Educacional (IEE) para oferecer mais um retrato desse atraso. Com dados do Sistema de Avaliação da Educação Básica, do Censo Escolar e da Pnad Contínua, a avaliação a que se chega não é surpresa, mas não deixa de ser inquietante.
Pela análise, nada além de 15,5% dos jovens brasileiros finalizam o ensino médio na idade considerada adequada, entre 17 e 18 anos, e com aprendizado mínimo esperado nas disciplinas elementares de português e matemática. Ou seja, 84,5% da população em idade escolar nessa faixa etária entrou e saiu do sistema educacional sem a conquista do conhecimento primordial à cidadania. São cidadãos incompletos, vítimas de uma educação incompleta.
No melhor desempenho entre os estados, o Paraná tem apenas um quinto dos estudantes com aprendizado suficiente. No pior, o Amapá exibe 5% dos jovens nessa qualificação. O estudo mostrou ainda que boa parte do que se obteve em melhoria de inclusão e aprendizagem se perdeu com a suspensão das aulas durante a pandemia de Covid.
E de lá para cá, sem uma aceleração na educação, os gestores, no máximo, administram o prejuízo. Os últimos indicadores disponíveis são de 2023, trazendo o IEE para 15,5%, depois de chegar a 18,9% em 2019. Mesmo assim, o máximo a que se chegou era bem pouco, diante do desafio estabelecido da educação no país.
A degradação do que se tinha é sintomática da fragilidade dos avanços até antes do fechamento de escolas no período pandêmico. "A recomposição da aprendizagem perdida na pandemia, principalmente no ensino médio, ajudaria a melhorar esse cenário.
Mas, claramente, é algo que o país não tem conseguido fazer", disse à reportagem da Folha de S. Paulo o diretor-presidente do Instituto Natura, David Saad. Perdemos muito mais do que aprendizagem, quando não priorizamos a educação como deveríamos. O Brasil está incompleto, faz tempo. 
 
                         
                                                                                    
                                            