Trump ameaça a Venezuela
Por maiores que sejam os problemas na ditadura venezuelana – e são muitos – tudo que não precisamos é de um conflito bélico na América do Sul

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O deslocamento de tropas e armamentos, os discursos em tom de intimidação e as respostas cautelosas do lado ameaçado, geram a expectativa do avanço das Forças Armadas dos Estados Unidos sobre os domínios de Nicolás Maduro. Antes de completar o primeiro ano do segundo mandato, depois de desarrumar o comércio global, desestruturar as ações humanitárias da ONU e impor o medo, dentro de seu próprio país, sobretudo nas universidades e entre os imigrantes, Donald Trump passou os últimos dias disseminando a informação de que está a um passo de atacar ou invadir a Venezuela.
Há pelo menos 30 anos não se via uma mobilização de tantos soldados e armas dos EUA na América Latina. Se o propósito é assustar, o objetivo vem sendo alcançado, e não somente entre os venezuelanos. Por maiores que sejam os abusos e equívocos na ditadura de Maduro, que castiga o povo há mais de uma década no poder, a América do Sul já possui problemas demais para se ver às voltas com um conflito sangrento no continente. O ditador planeja ficar no mínimo 17 anos no cargo, com mais 6 anos a cumprir, após uma eleição contestada e denunciada como fraudulenta pela oposição.
O clima é de alerta máximo na diplomacia da região e mundial, chegando à Organização das Nações Unidas. Se lançar algo semelhante a uma intervenção na Venezuela, para retirar Maduro do poder ou buscar obter, pela força, seja lá qual objetivo, Trump não se preocupa com a desestabilização dos países vizinhos da Venezuela, e do continente inteiro – bem como dos países que mantém relações econômicas e de qualquer ordem com os sul-americanos. Apesar da pose de guardião planetário que deseja o Prêmio Nobel da Paz, Donald Trump vai se revelando um governante que prima pelo gosto à instabilidade ao redor.
O narcotráfico é a bola da vez na retórica política beligerante que se alinha, do lado de fora, com outras campanhas que privilegiam a violência de Estado em detrimento da diplomacia e do respeito à soberania das nações e aos direitos individuais dos cidadãos. Não que o narcotráfico nas Américas não deva ser combatido. Deve, mas não a partir de iniciativa unilateral de um país que se aprofunda, por determinação de seu presidente, em atos antidemocráticos contestados dentro e fora dos Estados Unidos. Se Maduro merece deixar o poder que retira dignidade, empobrece e causa sofrimento aos venezuelanos, não vai ser transformando Caracas em uma espécie de Faixa de Gaza que isso deve acontecer. Mesmo que não chegue a tanto, o princípio da invasão, da ocupação e da aniquilação de um inimigo é o mesmo, com semelhantes efeitos colaterais sobre uma população indefesa.
O fato de Trump contar com o apoio de parcela considerável dos governos da América Latina para enfrentar Maduro na Venezuela, lança ainda mais potencial de instabilidade nos próximos movimentos da Casa Branca. Sem apoio da Rússia e da China, Maduro pode temer a antecipação abrupta do fim de sua tirania.